A tensão no Kosovo, pequeno Estado dos Balcãs que não é reconhecido pela Sérvia, nem pela Rússia, tem aumentado de tom nos últimos dias. Mas “o problema não resolvido” existe desde 1999 e é um trunfo para Vladimir Putin.
Kosovo está a ferro e fogo depois das eleições municipais do último mês que foram marcadas por um boicote da comunidade sérvia que reside no país que tem cerca de 2 milhões de habitantes, dos quais a maioria é albanesa e muçulmana.
O acto eleitoral acabou por colocar no poder vários presidentes de Câmara albaneses depois de a população de origem sérvia ter recusado votar. Isso despoletou ainda mais revolta entre esta comunidade.
Os confrontos dos últimos dias agravaram a tensão latente há décadas no pequeno Estado que “nasceu” da antiga Jugoslávia, no seguimento de uma intervenção militar da NATO em 1999.
Um eventual novo conflito na Europa, caso os ânimos se agravem entre o Kosovo e a Sérvia, dá trunfos a Putin contra a NATO. Afinal, isso colocaria à vista de todos os erros da Aliança, na região dos Balcãs.
Alguns media internacionais têm reportado que o símbolo Z que tem representado a invasão russa da Ucrânia, foi desenhado em alguns veículos da NATO. E também que algumas das barricadas sérvias, durante os protestos, o incluíam como uma espécie de porta-estandarte.
A Rússia já manifestou o apoio à Sérvia nesta questão – até porque o presidente sérvio, Aleksandar Vucic, é visto como um aliado de Putin, e os dois países têm laços culturais, históricos e religiosos.
Vucic colocou as Forças Armadas da Sérvia em alerta máximo, deslocando-as para junto da fronteira com o Kosovo.
A NATO receia que uma eventual acção militar da Sérvia obtenha a ajuda directa da Rússia.
Entretanto, a NATO já anunciou que vai enviar mais 700 soldados para o Kosovo, para reforçar o contingente que já tem neste Estado.
Mas como é que chegamos aqui?
Apesar de a sua população ter sido sempre maioritariamente de origem albanesa, o Kosovo era uma região autónoma da Sérvia.
Mas o Exército de Libertação do Kosovo, um grupo armado de origem albanesa, iniciou um conflito com a Sérvia pela independência.
Em 1999, a NATO entrou em acção, com uma “intervenção humanitária” para proteger os albaneses contra os sérvios. A Sérvia acabou por se retirar e a NATO assumiu a administração do pequeno Estado.
Essa intervenção da NATO foi vista, na altura, como um ataque inédito a um Estado soberano – a então Jugoslávia que estava a caminho do desaparecimento como nação para dar origem a Sérvia, Croácia, Eslovénia, Bósnia-Herzegovina, Montenegro e Macedónia.
“Foi uma intervenção inesperada da NATO – a primeira e única sem ter a cobertura de uma resolução das Nações Unidas”, como nota o especialista em assuntos europeus Paulo Sande, em declarações à CNN Portugal.
Guerra no Kosovo levou Putin ao poder
Nessa altura, a Rússia apoiava a Sérvia, mas foi impotente para intervir.
“A guerra no Kosovo terminou depois de 78 dias de campanha aérea. O primeiro efeito deste conflito foi a ascenção ao poder de Putin, na sequência da humilhação no Kosovo”, analisa, também na CNN Portugal, o major-general Agostinho Costa.
“A guerra no Kosovo foi aquilo que serviu de pretexto a Putin para fazer a anexação da Crimeia“, considera ainda o major-general que esteve nos Balcãs, logo após o fim da guerra na ex-Jugoslávia.
Em 2008, o Kosovo declarou a sua independência da Sérvia, algo que este país não reconhece.
A Croácia, outro país do antigo território jugoslavo, reconhece essa independência, tal como Portugal e os EUA. Já a Rússia e a Espanha, bem como outros países com os seus próprios conflitos internos de separação e independência, não reconhecem o Kosovo como Estado.
“O que temos no Kosovo é uma bomba-relógio”
A NATO mantém um contingente de cerca de 4 mil soldados no Kosovo, para garantir a segurança e a paz.
“Aquilo é um protectorado, da NATO, da União Europeia, do mundo ocidental. Mas é um problema não resolvido“, considera Agostinho Costa à CNN Portugal.
“O que temos no Kosovo é um caldeirão, uma bomba-relógio a que temos que dar muita atenção”, analisa ainda o major-general, alertando que “estamos em risco de uma escalada nos Balcãs”.
“Há uma questão histórica, étnica e religiosa e ainda há um problema político. Há muitas feridas ainda por sarar“, acrescenta Paulo Sande.
Para a Sérvia, o Kosovo é o verdadeiro coração do seu Estado – como até se pode depreender das palavras do tenista Novak Dkojovic que fala do pequeno país como “o pilar do lar” dos sérvios.
Mas para os albaneses do Kosovo, os sérvios são os ocupantes.
De resto, o primeiro-ministro do Kosovo, Albin Kurti, que foi prisioneiro político na Sérvia, defende a unificação do Kosovo com a Albânia e é contra qualquer cedência aos sérvios.
Por outro lado, o presidente sérvio exige um estatuto diferenciado para a região norte do Kosovo, onde vive a maioria da comunidade sérvia, com direito a quotas na administração, por exemplo.
A União Europeia (UE) está a tentar mediar o conflito, no sentido de que seja alcançado um acordo que permita manter a paz – mesmo que seja a “paz podre” que se tem sentido na região nos últimos anos.
O facto de Kosovo e Sérvia desejarem aderir à UE pode ajudar. Contudo, há sempre a questão da independência do Kosovo, algo que a Sérvia de Vucic nunca reconhecerá “porque se o fizer no dia seguinte tem um levantamento“, considera Agostinho Costa.
Nesta quinta-feira, a presidente do Kosovo, Vjosa Osmani, esteve reunida com Vucic na Moldávia, juntamente com o presidente francês Emmanuel Macron, com o chanceler alemão Olaf Scholz e com o chefe da política externa da UE, Josep Borrell.
Osmani mostrou abertura para a realização de novas eleições locais na zona norte do Kosovo, onde está o epicentro da crise, mas desde que se sigam as vias legais.
A posição da presidente contrasta, contudo, com a posição do primeiro-ministro do Kosovo que definiu os protestantes da comunidade sérvia como uma “milícia fascista”, vincando que não está disposto a “entregar-lhes” o país.
“China bate palmas de contente”
Pelo meio, “a China bate palmas de contente porque é quem vai colher os frutos das árvores“, analisa o major-general na CNN Portugal.
“A China quer manter o eixo dos dois mares, entre o Báltico e o Mar Negro. E depois ainda há a Hungria. Os húngaros querem colher os frutos da relação privilegiada que têm com os chineses, querem ser o hub comercial da China na Europa, e também da relação que têm com a Sérvia”, constata Agostinho Costa.
A Rússia também está à espreita e tem todo o interesse em alimentar mais este potencial conflito na Europa – até para pôr a nu a incapacidade da NATO de resolver um problema que se arrasta há mais de 20 anos.
E quem está a meter lenha na fogueira são os EUA mais uma vez.
A Nato são os Estados Unidos a espevitar a fogueira na Europa …e a Europa ajoelhada sem força nem crédito dentro da própria casa…a união europeia de cócoras perante o mundo inteiro…
As Balcãs são o berço de grande numero de conflictos armados e guerras mundiais
“Grande número… de guerras mundiais”…esta frase partiu-me todo… Ó amigo…quantas guerras mundiais são essas, mais concretamente?