Já imaginou um pacemaker sem bateria, que funciona com ouro e oxigénio?

Liu, X. et al / Chem

Dos pacemakers aos neuroestimuladores, são cada vez mais os dispositivos médicos implantáveis capazes de manter o coração a bater. No entanto, estes dispositivos funcionam com baterias, o que significa que eventualmente terão de ser substituídas por outra, assim que a bateria acabar.

Não há dúvidas de que a única desvantagem de ter um pacemaker é a necessidade de o trocar entre cada 5 a 15 anos, dependendo do seu nível de bateria.

Esta substituição é feita através de uma cirurgia invasiva onde o pacemaker é retirado e novamente implantado com uma nova bateria que, se tudo correr bem, irá durar mais uma década.

Para evitar esta necessidade, um grupo de investigadores da China desenvolveu uma bateria implantável que funciona a oxigénio.

O novo estudo, publicado na revista científica Chem, mostrou que este dispositivo é capaz de fornecer energia estável e compatível com sistemas biológicos.

“O oxigénio é a fonte de energia da nossa vida”, diz  Xizheng Liu, cientista especializado em materiais e dispositivos energéticos na Universidade de Tianjin e corresponding author do estudo.

“Se conseguirmos aproveitar o fornecimento contínuo de oxigénio no corpo, a vida útil da bateria deixa de estar limitada pelos materiais finitos das baterias convencionais”, acrescenta Liu.

Para construir esta bateria de uma forma segura e eficiente, os investigadores começaram por desenvolver um conjunto de elétrodos com uma liga à base de sódio e ouro nanoporoso, um material com milhares de pequenos poros, inferiores à largura de um fio de cabelo.

O ouro é conhecido por ser um elemento compatível com os sistemas vivos, ao passo que o sódio é essencial para a existência da vida.

O oxigénio presente no corpo é capaz de reagir com os elétrodos e produzir eletricidade. De forma a proteger esta bateria biológica, os investigadores optaram por envolvê-la numa película feita de um polímero poroso, macio e flexível.

A bateria foi, finalmente, implantada sob a pele das costas de ratos e a eletricidade produzida foi acompanhada. Duas semanas após a implantação, os resultados mostraram que esta nova bateria foi capaz de produzir tensões estáveis entre 1,3 e 1,4 V, com uma densidade de potência máxima de 2,6 µW/cm2.

Apesar de estes valores ainda serem insuficientes para alimentar dispositivos médicos complexo, o projeto mostra que é possível aproveitar o oxigénio do corpo para obter energia.

Os efeitos ao nível das reações inflamatórias, alterações metabólicas e regeneração dos tecidos em torno da bateria foram também avaliados.

Os resultados mostraram que os ratos não apresentaram inflamação aparente e que os subprodutos das reações químicas da bateria, onde se incluem iões de sódio, hidróxido e peróxido de hidrogénio, foram facilmente metabolizados pelos organismos, sem afetar os rins e o fígado.

Após a implantação, a cicatrização foi fácil e rápida e os pelos das costas estavam completamente crescidos após 4 semanas. Para surpresa dos investigadores, os vasos sanguíneos ao redor da bateria também se regeneraram rapidamente.

“Ficamos intrigados com a produção instável de eletricidade logo após a implantação”, afirma Liu.

“Tivemos de esperar que a ferida cicatrizasse e que os vasos sanguíneos se regenerassem para que o oxigénio começasse a ser fornecido em quantidades necessárias para produzir eletricidade estável. Esta descoberta é surpreendente, já que significa que as baterias podem também ser utilizadas para monitorizar a cicatrização de feridas”, explica o autor do estudo.

A equipa planeia agora aumentar o fornecimento de energia da bateria. Para tal, pretende explorar diferentes materiais para compor os elétrodos, de modo a otimizar a estrutura e o design da bateria.

Além disso, a escolha de matérias relativamente económicos pode reduzir ainda mais o preço da bateria e torná-lo mais acessível ao público.

“Uma vez que as células tumorais são sensíveis aos níveis de oxigénio, implantar este tipo de “bateria consumidora de oxigénio” em torno destas pode ajudar a combater o cancro, uma vez que lhes retira a sua principal fonte de energia. Além disso, também é possível converter a energia da bateria em calor para matar as células cancerígenas”, explica Liu.

Desde uma nova bateria para dispositivos médicos implantáveis, à sua potencial utilização como estratégia de tratamento em tumores, as perspetivas desta nova invenção são tão promissoras quanto animadoras.

Resta-nos aguardar e fazer figas para que a ciência jogue, uma vez mais, a nosso favor.

Patrícia Carvalho, ZAP //

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