Pandemia está numa fase de crescimento exponencial devido à prevalência da variante Delta no país. Atualmente, hospitais lutam para reforçar a sua capacidade de atendimento com camas e oxigénio — valência que tem estando em falta nas unidades hospitalares e que dissuade a procura de cuidados médicos por parte dos doentes.
A Indonésia parece posicionar-se como o “novo epicentro da pandemia a nível mundial” face ao número recorde de casos reportados ao longo dos últimos dias, que ultrapassam os registados pelo Brasil e pela Índia, dois dos países mais afetados pelo novo coronavírus desde o início da pandemia.
O número crescente de novas infeções também já se faz sentir nos internamentos e na falta de resposta hospitalar — que carece de camas e até de oxigénio para socorrer os doentes. As perspetivas para as próximas semanas não são animadoras, já que, segundo os cientistas, a ausência de medidas restritivas adequadas à gravidade da situação só a deverá agravar.
“Prevejo que o surto continuará a aumentar em julho, pois ainda não somos capazes de evitar a propagação das infeções”, afirmou esta semana Pandu Riono, epidemiologista da Universidade da Indonésia, em declarações à Associated Press e citado pelo Expresso. Como tal, o especialista defende medidas mais rigorosas.
“As restrições que estão neste momento em vigor não são as mais adequadas. É necessário aplicar o dobro das medidas, uma vez que continuamos a lidar com a variante Delta, que é duas vezes mais contagiosa”, alegou.
As medidas atualmente em vigor na Indonésia devem terminar na próxima terça-feira. Para já, o território de Javi e Bali estão em confinamento parcial, o que significa que locais de culto, escolas, centros comerciais e instalações desportivas se encontram encerrados.
Os restaurantes só estão autorizados a servir em regime take-away e o número de lugares disponíveis nos transportes públicos foram reduzidos. O teletrabalho é obrigatório para os funcionários dos setores considerados não essenciais e para 50% dos trabalhadores dos restantes setores.
No entanto, e tal como apontam os especialistas em saúde pública, as regras não são suficientes para conter o nível de contágio que atualmente se vive no país. E os números parecem prová-lo. Na quarta-feira, registaram-se 54 mil novos casos, o número mais alto de sempre no país, e 991 mortes.
No sábado, as novas infeções cifravam-se nas 51.952 e as mortes em 1.091 — segundo os dados da plataforma Worldmeter. Pelo terceiro dia consecutivo, a Indonésia registou números de casos superiores ao de Índia e Brasil, onde foram reportados 38.079 e 34.339 novas infeções, respetivamente.
Os números podem, ainda assim, estar aquém da real dimensão do problema, já que segundo relatam especialistas e organizações, o número de testes disponíveis no país é reduzido e limitado.
De acordo com o Our World Data, site da Universidade de Oxford, a Indonésia é dos países onde menos se testa, com 55.89 testes feitos por cada mil habitantes.
Esta discrepância levou Dicky Budiman, epidemiologista da Universidade Griffith, na Austrália, a cifrar os números da pandemia na Indonésia em três ou seis mais elevados do que os dados oficiais.
A situação na Indonésia começou a agravar-se quando a variante Delta se tornou dominante no território, durante o mês de junho, especialmente em ilhas densamente povoadas, como Java e Bali. Perante o aumento de casos e da afluência hospitalar, os profissionais de saúde deixaram de conseguir dar resposta à situação.
Os hospitais focam-se agora em aumentar a sua capacidade, não só no número de camas mas também no oxigénio disponível — fator que leva alguns doentes a nem procurar ajuda médica.
De acordo com a Lapor Covid, uma organização sem fins-lucrativos que monitoriza as mortes causadas pela covid-19, todos os dias morrem cerca de 40 pessoas doentes em casa, na Indonésia.
Na perspetiva do governo indonésio, a situação está “sob controlo”, mas no ar paira a ideia de que o pior pode ainda estar para vir.
“Se tivermos em conta que o pior cenário são 60 mil novos casos, ou um pouco mais, ainda estamos bem”, afirmou o ministro responsável pela gestão da pandemia no país, Luhut Pandjaitan. “Esperamos não chegar aos 100 mil, mas estamos já a preparar-nos para o caso de isso acontecer.”
Para além da variante Delta, outros fatores podem ajudar a explicar o atual estado da pandemia na Indonésia. À cabeça, o grande atraso no processo de vacinação, já que apenas 15% da população recebeu uma dose da vacina ao passo que apenas uns chocantes 6% estão inoculados com as duas doses — numa população total de 270 milhões de pessoas.
A juntar a estes números está ainda o facto de a maioria da população vacinada ter recebido a vacina produzida pela empresa chinesa Sinovac Biotech, que, acredita-se, tem uma baixa eficácia em comparação com as restantes.
De acordo com o The New York Times, 20 clínicos indonésios morreram após contraírem o vírus mesmo estando vacinados com esta vacina.
Perante o estado da pandemia, os Estados Unidos da América enviaram esta semana para o país asiático 4.5 milhões de doses da vacina da Moderna — as quais devem ser administradas aos profissionais de saúde.
Tal como pode ler-se num artigo assinado por Dicky Budiman, no site The Conversation, muitas falhas podem ser apontadas ao governo indonésio, que, por exemplo, resistiu à criação e implementação de um sistema de rastreamento de contactos de risco durante um período de 16 meses. Como tal, Budiman acusa as autoridades de priorizarem a economia em detrimento da saúde pública.
“Os riscos da pandemia foram subestimados desde o início, tanto em termos de estratégia como de comunicação. Houve pouca transparência e falta de comunicação”, apontou o especialista. Tal política, entende, deixou a Indonésia numa “posição de extrema vulnerabilidade”.