Imobiliárias chinesas estão a aceitar melancias, trigo ou alho, em troca de descontos para compradores, face à contração no mercado e ao limite imposto pelas autoridades na redução dos preços.
A Nanjing Seazen Holdings, empresa de construção do leste da China, oferece um desconto de 100 mil yuans (cerca de 14.300 euros) em troca de cinco mil quilos de melancias. Paga, assim, cinco vezes mais pelo quilo desse produto do que o preço atual no mercado de vendas por grosso, avançou o South China Morning Post.
Na cidade de Wuxi, no leste da China, outra construtora está a aceitar pêssegos em troca de descontos até 188.888 yuans (27 mil euros). Na província de Henan, uma imobiliária baixou os preços em até 160 mil yuans (23 mil euros) em troca de trigo ou alho, acumulando 430 mil quilos deste último com a venda de 30 apartamentos.
Ao jornal, Zhang Dawei, analista da agência imobiliária Centaline, explicou que as construtoras tentam encontrar formas criativas de fazer descontos para contornar o limite no corte dos preços dos imóveis, imposto pelos governos locais para evitar o colapso do mercado e uma crise no sistema bancário.
Em 2021, os reguladores chineses passaram a exigir às construtoras um teto de 70% na relação entre passivo e ativos e um limite de 100% da dívida líquida sobre o património, suscitando uma crise de liquidez no setor, agravada pela pandemia.
“Em algumas cidades, se a redução dos preços não for bastante significativa, não vai haver compradores. Em algumas áreas, as vendas não são satisfatórias, então os compradores estão com pouca liquidez”, disse Andy Lee, CEO da Centaline.
Várias construtoras chinesas entraram em incumprimento, nos últimos meses, suscitando a desconfiança dos potenciais compradores. De acordo com o South China Morning Post, entre janeiro e maio, as vendas conjuntas das cem maiores imobiliárias do país registaram uma queda homóloga de 50%.
No entanto, as autoridades de dezenas de cidades colocaram um “piso” nos preços dos imóveis, limitando os descontos que as construtoras podem fazer, para evitar uma “perturbação da ordem normal” do mercado imobiliário e do setor, cujo peso no PIB (Produto Interno Bruto) do país ronda os 30%, segundo alguns analistas.
O Presidente chinês, Xi Jinping, insistiu em várias ocasiões que as casas “devem servir para habitação e não especulação”, mas a crise no imobiliário tem fortes implicações para a classe média e para a economia do país. Face a um mercado de capitais exíguo, o setor imobiliário concentra uma enorme parcela da riqueza das famílias chinesas – cerca de 70%, segundo diferentes estimativas.
Em entrevista à agência Lusa, Michael Pettis, professor de teoria financeira na Faculdade de Gestão Guanghua, da Universidade de Pequim, vê na contração do setor imobiliário um sinal de que a China se está a afastar do modelo de crescimento assente no investimento em ativos não produtivos.
“Há muito crescimento fictício na China”, notou Pettis. “O excesso de investimento em todo o tipo de projetos de construção inflaciona o crescimento da economia chinesa há vários anos”, descreveu.