A Ilha da Queimada Grande, conhecida como a “Ilha da Serpente”, é um pedaço de rocha oceânica que mede cerca de 43 hectares. A maioria das pessoas consideram-na invulgarmente traiçoeira devido à sua grande população de cobras – é o lar de 4.000 serpentes.
A cabeça de lança dourada é uma cobra altamente venenosa. Num estudo realizado em 2008, concluiu-se que a Ilha da Queimada Grande era provavelmente o lar de entre 2.000 a 4.000 dessas serpentes.
Embora sejam relativamente abundantes na ilha, o facto de só existirem nesse local significa que são consideradas ameaçadas na Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da Natureza (UICN).
“As populações insulares tendem a ser menos diversificadas a nível genético porque são mais propensas a passar por” baixos números populacionais, “o que reduz a diversidade genética. A diversidade genética é importante”, explicou Robert Aldridge, professor de biologia da Universidade de Saint Louis, nos Estados Unidos (EUA).
Há cerca de 11.000 anos, durante um período conhecido como o Holocénico Primitivo, devido à decomposição das massas de gelo, o nível global do mar subiu cerca de 60 metros. Essa subida fez com que a Ilha da Queimada Grande se separasse do continente, com as serpentes a seguirem um caminho evolutivo diferente.
A cabeça de lança dourada é uma espécie insular, relacionada com a Bothrops jararaca, uma cobra que há no continente, explicou Stephen P. Mackessy, professor especializado em evolução, ecologia e toxicologia na Escola de Ciências Biológicas da Universidade do Norte do Colorado, nos EUA.
Segundo Mackessy, devido ao pequeno habitat da ilha e à abundância de aves – que são as presas – o tamanho, o veneno e o padrão de cor das cobras evoluíram de forma diferente. Caso fossem “transportadas para outras ilhas da região, provavelmente prosperariam, mas simplesmente não chegaram lá”, referiu.
Mackessy indicou que a cabeça de lança dourada é sem dúvida uma ameaça para as aves da ilha – mas e para os humanos?
“Nada que tenha visto sugere que a cabeça de lança dourada representa um risco maior para os humanos do que muitas outras espécies de Bothrops – muitas das quais são consideravelmente maiores. A ideia de que é excecionalmente mortal é, muito provavelmente, um mito”, notou o especialista.
Não há registo oficial de uma cabeça de lança dourada que tenha mordido um humano. Mas alguns especialistas acreditam que o seu veneno pode causar a degeneração de órgãos, ataque cardíaco, paralisia muscular ou, na pior das hipóteses, a morte.
Felipe Grazziotin, um investigador do Instituto Butantan, uma instalação de investigação biológica brasileira, pensa que o veneno da víbora pode ter o mesmo impacto sobre o corpo humano que o género Bothrops jararaca.
Mesmo que uma viagem à ilha não signifique necessariamente perigo, Mackessy considera que não há razões para os turistas o fazerem.
“Não creio que haja qualquer razão para que os turistas possam ir à ilha”, apontou Mackessy. O habitat não poria em perigo um herpetologista treinado, mas poderia haver acidentes para a população em geral, segundo Mackessy.
“Extraio veneno de muitas cobras e fi-lo durante mais de 35 anos sem incidentes, mas ainda é algo que eu evitaria se houvesse uma alternativa viável, porque envolve um nível de risco”, disse ainda.
E acrescentou: “uma forma inteligente de proteger estas ilhas seria envolver a população local, fomentando o turismo e o conhecimento adequado da espantosa biodiversidade que temos”.