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Uma habilidade mental mudou a história da humanidade

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Pxfuel

No início de 2020, na cidade alemã de Krefeld, uma mãe e as suas duas filhas escreveram desejos de Ano Novo em seis lanternas de papel e deixaram-nas voar.

A visão das lanternas a subir ao céu lentamente, iluminadas pelas velas no interior, seduziu as pessoas ao longo dos tempos. No entanto, quando esta família estava a imaginar o seu futuro, não previu o que aconteceria mais tarde naquela noite.

As lanternas afastaram-se e finalmente chegaram à jaula de macacos no zoológico de Krefeld. As chamas incendiaram o local, deixando dezenas de primatas mortos, incluindo dois gorilas, cinco orangotangos e um chimpanzé.

A capacidade humana de previsão nunca será 100%. Mas isso não significa que estamos condenados a repetir os erros de ontem. Não podemos prever onde as lanternas vão pousar e, portanto, é por um bom motivo que elas se tornaram ilegais em tantos países.

As nossas mentes também podem reconhecer que muitos supostos avanços da humanidade, motivados pelos nossos desejos de um futuro melhor, vêm com consequências nada inofensivas: florestas estão a arder, os glaciares estão a derreter e a biodiversidade está em declínio.

A atividade humana, impulsionada por tramas e planos, impactou o planeta de uma forma tão dramática que os cientistas declararam uma nova época geológica: o Antropoceno.

Recentemente, foi publicado um livro chamado The Invention of Tomorrow (“A invenção do amanhã”, em tradução livre), que fala sobre a notável habilidade de previsão dos seres humanos e todas as maneiras como esta transformou o mundo, para melhor e para pior.

Na mitologia grega, a humanidade ganhou seus distintos poderes quando a figura de Prometeu nos deu um presente: o fogo dos céus.

Não há dúvida de que sem a chama, a nossa espécie nunca teria prosperado — mas talvez o que seja menos conhecido nessa história é que o nome Prometeu tem um significado próximo a “previsão”.

Nas últimas duas décadas, pesquisas científicas trouxeram cada vez mais evidências sobre a base cognitiva da nossa capacidade de “viajar mentalmente no tempo“.

As crianças gradualmente adquirem a capacidade de dirigir as suas máquinas mentais do tempo para o passado e o futuro por volta da mesma idade e, no final da idade adulta, a memória e a previsão também tendem a declinar juntas.

Mas é claro que existem diferenças profundas entre o passado e o futuro, principalmente o facto de que o futuro é incerto. Uma das razões pelas quais a previsão humana é tão poderosa é que podemos pensar em várias versões de como o futuro pode ser, permitindo-nos comparar as nossas opções e tomar melhores decisões no presente.

A capacidade de pensar sobre o futuro pode ser rastreada até o Pleistoceno. Podemos ver pistas do desenvolvimento das capacidades de previsão dos nossos antepassados na forma das ferramentas de pedra cuidadosamente trabalhadas e restos de fogueiras.

Prevendo o que poderia estar por vir, eles montaram lanças com pedras, sabendo que mais tarde poderiam usá-las para matar à distância, e criaram objetos móveis que permitiriam transportar coisas para diferentes pontos no espaço e no tempo.

Muito mais tarde, a aplicação disciplinada da previsão, através do método científico, tornou-se a chave para inaugurar a era moderna.

O método científico envolve essencialmente três etapas: os dados devem ser recolhidos através da observação ou da experimentação; explicações para esses dados devem ser geradas; e, finalmente, hipóteses devem ser retiradas dessas explicações e colocadas à prova.

O método científico criou novos caminhos para se prever o futuro — como para saber o que ocorrerá com as marés ou com o clima. No século XVII, Robert Hooke vislumbrou como a ciência poderia ser usada para melhorar drasticamente a vida humana.

Hooke arriscou afirmar que, um dia, “podemos ser capazes de ver as mudanças no clima a alguma distância antes que elas se aproximem de nós e, assim, podemos ser capazes de prever e prevenir muitos perigos que podem ser evitados, e o bem da humanidade seria promovido”.

Para o bem ou para o mal, a previsão transformou o mundo. A população de Homo sapiens explodiu após a Revolução Industrial, saindo de cerca de mil milhões de pessoas há 200 anos para cerca de oito vezes esse número agora. Nós superamos em muito a população de todos os outros primatas combinados. Os mamíferos mais numerosos no planeta hoje são aqueles que cultivamos.

Muito do nosso progresso foi possível porque as pessoas previram um mundo melhor, comunicaram-se sobre isso e cooperaram para criá-lo. Pensar no futuro desempenhou um papel essencial no progresso humano e contribuiu para nos trazer muitas coisas pelas quais podemos ser gratos.

Prever, porém, é uma habilidade imperfeita.

A vida pública está repleta de figuras importantes que falharam em prever o que hoje parece óbvio.

Albert Einstein afirmou em 1932 que “não há a menor indicação de que a energia [nuclear] será obtida um dia”, enquanto o presidente da empresa de aspiradores Lewyt Corp previu em 1955 que “aspiradores movidos a energia nuclear provavelmente serão uma realidade em 10 anos“.

O diretor geral do Correio dos EUA declarou em 1959 que “antes que o homem chegue à Lua, a correspondência será entregue em poucas horas por mísseis guiados de Nova Iorque à Califórnia, à Grã-Bretanha, à Índia ou à Austrália”.

E quando o homem pousou na Lua pela primeira vez, muitas pessoas previram que haveria colónias lunares até o final do século, com Vénus e Marte prontos para novas ondas de colonização. Enquanto isso, pouca gente previu o que de facto iria transformar grande parte de nossas vidas: a internet e os smartphones.

A falha em prever também pode ter consequências traiçoeiras. Para facilitar o funcionamento dos motores dos carros, o inventor Thomas Midgley Jr. introduziu chumbo na gasolina, que ele não previu que produziria um dos piores poluentes do mundo. Ele também não previu que o CFC (clorofluorcarbono) que introduziu nos frigoríficos seria uma das principais causas da destruição da camada de ozono.

Também podemos aprender com os nossos erros. Afinal, as lanternas já não podem ser lançadas em vários países e a União Europeia finalmente proibiu os plásticos de uso único em 2021.

Todos os países do mundo pararam de usar combustível com chumbo, 100 anos depois de Midgley o introduzir.

Após a descoberta do buraco na camada de ozono, as pessoas em todo o mundo eliminaram gradualmente o uso dos produtos químicos manufaturados responsáveis por ele — incluindo aqueles no refrigerador de Midgley.

A proibição dos clorofluorcarbonetos foi ratificada por todos os países, e o consumo de substâncias que destroem a camada de ozono caiu para menos de 1% do que era na década de 1980.

Estes esforços globais foram conquistas extraordinárias que incluíram o reconhecimento dos nossos erros, o uso de ferramentas de previsão e a criação de saídas para os nossos problemas. Mas evitar futuras crises exigirá que nossos planos sejam executados.

A previsão humana é uma ferramenta incrivelmente poderosa. Aprendendo a dirigir melhor nossas máquinas mentais do tempo, podemos criar um futuro pelo qual vale a pena esperar.

ZAP // BBC

1 Comment

  1. Um texto assim é simplesmente um texto religioso afinal o futuro é simplesmente um conceito cultural ,mas com está ode ao Matrialismo fala do método é de Prometeus vemos bem como a religião do Matrialismo é cega a realidade.

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