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Há quase 50 milhões de crianças deslocadas em todo o mundo

UNICEF

Crianças numa escola em Dara’a, na Síria

Quase 50 milhões de crianças em todo o mundo estão atualmente desenraizadas, longe do local de origem, 28 milhões das quais abandonaram as suas casas devido a conflitos, revela a UNICEF num relatório divulgado esta quarta-feira.

Segundo o documento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), intitulado “Uprooted: The growing crisis for refugee and migrant children (Desenraizadas: A crise que se agrava para crianças refugiadas e migrantes)”, além da guerra e da violência, também as alterações climáticas e a pobreza extrema contribuíram para afastar as crianças das suas origens, em busca de uma vida melhor e mais segura.

Lançado antes de duas cimeiras sobre Refugiados e Migrantes que decorrem a 19 e 20 de setembro em Nova Iorque – a primeira, no âmbito da Assembleia-Geral da ONU, que contará com a participação de altos representantes mundiais, e a segunda promovida pelo Governo norte-americano -, o relatório aponta também os perigos e obstáculos com que as crianças se deparam e as consequências desastrosas de todo esse processo de desenraizamento.

“Muitas vezes traumatizadas pelos conflitos e pela violência de que fogem, estas crianças enfrentam outros perigos pelo caminho, incluindo o risco de afogamento em travessias por mar, subnutrição e desidratação, tráfico, rapto, violação e mesmo assassínio. Nos países por onde passam ou nos de destino, são muitas vezes vítimas de xenofobia e discriminação”, lê-se no documento.

Por se tratar de dados novos que traçam um cenário desolador sobre a situação de tantos milhões de crianças e respetivas famílias, a UNICEF apela aos líderes mundiais para que coloquem este problema no centro do debate de ambas as cimeiras e inclui igualmente no relatório um conjunto de recomendações e medidas políticas a adotar.

“Imagens inesquecíveis de algumas crianças – o corpo inerte de Aylan Kurdi que morreu afogado e deu à costa numa praia, ou o rosto aturdido e ensanguentado de Omran Daqneesh quando é levado para uma ambulância depois de uma bomba ter arrasado a sua casa – chocaram o mundo, mas cada imagem, cada rapariga ou rapaz, representa muitos milhões de crianças em perigo, o que exige que a nossa compaixão pela criança cuja imagem chega até nós se traduza em ação em prol de todas”, defendeu o diretor executivo da UNICEF, Anthony Lake, citado no comunicado da organização.

O relatório indica, por exemplo, que “as crianças representam uma percentagem desproporcional e crescente das pessoas que procuraram refúgio fora dos seus países de origem – elas constituem cerca de um terço da população global, mas cerca de metade de todos os refugiados“.

Em 2015, “cerca de 45% de todas as crianças refugiadas sob proteção do Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) vieram da Síria e do Afeganistão“, precisa-se no documento.

Dos 28 milhões de crianças que abandonaram as respetivas casas devido à violência e a conflitos nos seus países e além-fronteiras, “10 milhões são crianças refugiadas, um milhão são requerentes de asilo cujo estatuto de refugiado ainda não foi determinado e cerca de 17 milhões encontram-se deslocadas dentro dos seus próprios países, precisando de ajuda humanitária de emergência e acesso a serviços básicos, frisam os relatores.

“São cada vez mais as crianças que atravessam fronteiras sozinhas. Em 2015, mais de 100 mil crianças (menores de 18 anos) não acompanhadas requereram asilo em 78 países – três vezes mais do que em 2014. As crianças não acompanhadas estão entre as que correm maior risco de exploração e abuso, incluindo por parte de passadores e traficantes”, alerta a agência especializada das Nações Unidas.

Os outros cerca de 20 milhões de crianças migrantes em diversas partes do mundo “deixaram as suas casas por razões de diversa ordem, entre as quais a pobreza extrema ou a violência de gangues”.

“Muitas estão particularmente em risco de abuso e detenção porque não têm documentos, porque têm um estatuto legal incerto e por falta de acompanhamento e monitorização sistemáticos do seu bem-estar – as crianças que escapam por entre as malhas do sistema”, observa a organização.

Segundo o relatório, a Turquia acolhe o maior número de refugiados recentes e, muito provavelmente, o maior número de crianças refugiadas do mundo, e o Líbano, proporcionalmente à sua população, é, de longe, o país que acolhe o maior número de refugiados: aproximadamente uma em cada cinco pessoas em território libanês é um refugiado.

Em contraste, no Reino Unido, há aproximadamente um refugiado por cada 530 pessoas, e um por cada 1.200 nos Estados Unidos. Contudo, se se considerar o nível de rendimento dos habitantes dos países de acolhimento, é na República Democrática do Congo, na Etiópia e no Paquistão que se regista a maior proporção de refugiados, refere o documento.

A UNICEF sustenta que “onde existem rotas seguras e legais, as migrações podem representar oportunidades tanto para as crianças que migram como para as comunidades que as acolhem”.

“Um estudo sobre o impacto das migrações em países de elevado rendimento concluiu que os migrantes contribuíram com mais impostos e contribuições para os sistemas sociais do que a ajuda que receberam; que preencheram lacunas de pessoal altamente qualificado e pouco qualificado no mercado de trabalho; e contribuíram para o crescimento económico e a inovação nos países de acolhimento”, sublinha a organização.

Por último, Anthony Lake alerta ainda para outro problema: o facto de as crianças desenraizadas perderem a oportunidade de ter uma educação nos países para onde se deslocam.

De acordo com o relatório, uma criança refugiada tem cinco vezes mais probabilidade de não frequentar a escola do que uma criança não refugiada. E quando têm a oportunidade de a frequentar, é na escola que as crianças migrantes e refugiadas são mais frequentemente vítimas de discriminação, nomeadamente de tratamento injusto e ‘bullying’.

“Que preço pagaremos se não proporcionarmos a estes jovens as oportunidades necessárias para terem uma educação e uma infância mais normal? Como poderão eles contribuir positivamente para as suas sociedades? Se não o puderem fazer, não serão apenas os seus futuros que ficarão comprometidos, mas também as suas sociedades ficarão fragilizadas”, advertiu o responsável.

/Lusa

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