Uma equipa de cientistas descobriu que o boto (golfinho) cor-de-rosa produz uma variedade surpreendente de sons, uma pista importante para a nossa compreensão de como e por que os golfinhos evoluíram a capacidade de comunicação.
Os golfinhos fluviais uruguaios, também conhecidos como botos, foram identificados pela primeira vez em 2014. Estes animais vivem exclusivamente nas bacias dos rios Amazonas, Orinoco e Tocantins, na América do Sul, onde usam seus longos bicos para caçar peixes.
Estes golfinhos são considerados por muitos como relíquias evolutivas, tendo divergido de outros cetáceos mais cedo do que outros golfinhos. Pelo facto de ocuparem uma posição única na árvore genealógica dos cetáceos, os cientistas entusiasmam-se a estudar estes animais para melhor entender os ancestrais dos golfinhos.
Ao contrário dos golfinhos marinhos, estes botos não fazem barulho quando vêm à tona. Segundo o Gizmodo, tendem a ser animais solitários que vivem em pequenos grupos sociais.
Não se sabe muito sobre a sua capacidade de criar sons ou de se comunicar, mas investigações anteriores sugerem que estes animais podem fazer sons como assobios.
Os cientistas acreditavam que os botos da região amazónica tinham um perfil marcadamente solitário, mas um estudo recente mostrou que os animais interagem bastante uns com os outros e têm, inclusivamente, um repertório diverso. Ao todo, foram identificados 237 sons diferentes.
“Foi uma grande surpresa quando descobrimos mais de 200 tipos de som. Os nossos resultados indicam que há mais para descobrir”, afirmou Gabriel Melo-Santos, principal autor do estudo da Universidade de St. Andrews, na Escócia. “Descobrimos que os sons mais comummente produzidos parecem desempenhar um papel importante na comunicação entre mãe e filho“.
Para esta investigação, os cientistas usaram câmaras e microfones subaquáticos. Com mais de 20 horas de gravação e mais de 200 sons identificados, os investigadores acreditam que ainda há muito por descobrir.
“Os sons emitidos pelos botos podem ajudar-nos a entender como se deu a evolução da comunicação sonora nos cetáceos. Além disso, precisamos de saber como acontece o sistema de comunicação dos botos para entender como podem ser afetados por atividades humanas (como o tráfego de embarcações, por exemplo)”, realça Melo-Santos.
A equipa descobriu que os sons emitidos pelos botos são diferentes dos assobios produzido pelos golfinhos. Além disso, os botos fazem assobios mais longos e menos frequentes. Há indícios de que, nesta espécie, os assobios são usados para afastar outros grupos, e não para a comunicação entre eles, como acontece nos golfinhos.
Os sons produzidos pelos botos encaixam-se numa frequência entre os sons de baixa frequência emitidos por baleias e os de alta frequência emitidos por golfinhos. Laura May Collado, bióloga da Universidade de Vermont, acredita que isso acontece por causa do habitat dos botos.
“Há muitos obstáculos, como florestas inundadas e vegetação. Este sinal pode ter evoluído para evitar ecos da vegetação e melhorar o alcance de comunicação entre as mães e os seus filhotes”, explica a investigadora, que também participou neste estudo.
O artigo científico, publicado recentemente na Peer J, indica que os sons usados para a comunicação entre cetáceos podem ter aparecido muito antes do que se pensava e para uma comunicação muito semelhante à dos mamíferos.
“Assim como a de algumas espécies de golfinhos marinhos (orcas, baleias piloto, entre outros), os botos emitem sons com voz dupla, por exemplo. Para orcas, baleias piloto e outras espécies, esses sons podem indicar a identidade de um grupo social. Fenómenos não-lineares, como a bifonação (voz dupla) e a presença de sub-harmónicos, estão presentes em várias espécies de mamíferos terrestres“, sustenta Melo-Santos.
Alguns destes sons estão, aliás, muito presentes no nosso quotidiano, como o choro de um bebé ou o latido de um cão. Em diferentes espécies, os sons podem indicar o estado emocional e a identidade individual.