Um físico português residente na Holanda pretende desenvolver em Portugal um projecto científico na área da física de filtragem de informação causada pelos raios cósmicos, visando compreender melhor a origem das trovoadas, investigação que envolverá alunos do secundário.
A iniciativa, que será a réplica do denominado projecto holandês “HisParc: bringing physics to your neighbourhood”, desenvolvido pelo centro de investigação nuclear da Holanda em parceria com 80 escolas secundárias e oito principais universidades holandesas, já funciona na Inglaterra, Dinamarca e Alemanha, pelo que Filipe Freire pretende desenvolver um núcleo também em Portugal.
Em entrevista à Lusa, o investigador do departamento de Física e Astronomia da University College, pertencente a Universidade holandesa de Utrecht, disse que a ideia “é desmistificar a Física, mostrar que é uma área de estudo mais acessível, introduzindo um conjunto de experiências que se possam estender a escolas secundárias e ao mesmo tempo envolver contactos com universidades onde os investigadores trabalham”.
Através de detectores, que são colocados nas escolas secundárias, a equipa de investigadores, que junta professores e alunos deste nível de ensino, tenta detectar partículas de alta energia que vêm do espaço, conhecidas por raios cósmicos, e que entram na atmosfera com muita frequência.
“Alguns deles são conhecidos como as partículas electrões que causam aurora boreais, mas há outros de muita energia e podem ser detectados nestes detectores que se colocam nas escolas e os estudantes ficam envolvidos na manutenção, análise e estabelecem contactos com investigadores nas universidades”, afirmou Filipe Freire, único português envolvido no projecto.
Na Holanda, onde existem núcleos mais antigos, nomeadamente nas cidades de Amesterdão e Niemega, “tem havido um grande envolvimento de estudantes que têm feito as suas teses de graduação – nas escolas secundárias holandesas os estudantes efectuam projectos de fim de curso – e tem havido um número substancial de alunos que escolhem fazer o projecto sobre o tema desta experiência”, garantiu Filipe Freire.
Aliás, desde o arranque do programa, a Holanda obteve resultados positivos no projecto que envolve docentes e estudantes de 16 e 17 anos dos dois últimos anos do secundário em testagem dos modelos tecnológicos.
“Um dos principais resultados nestes primeiros 10 anos foi o desenvolvimento de tecnologia necessária para implementar esta experiência, nomeadamente electrónica para aquisição e a memória para guardar os dados obtidos”, afirmou.
“Na realidade, o que estamos a tentar detectar são raios cósmicos. Um dos principais focos nestes primeiros anos tem sido filtrar a informação que na realidade é somente devida aos raios cósmicos e que não tem outra origem”, explicou o físico.
Futuramente, os 10 investigadores que trabalham no centro do projecto esperam que a iniciativa ajude “a compreender melhor a origem das trovoadas, que é um fenómeno comum mas que os físicos não sabem ainda qual é que é exactamente a causa”, disse Filipe Freire.
“Se um dia o projecto deste tipo permitir entender esta causa da origem dos relâmpagos poderá ter aplicações ao nível de segurança”, aliás, “será de interesse da sociedade, em geral, se nós soubermos protegermo-nos melhor sobre noites de trovoada”, frisou.
Recentemente, o físico esteve em Portugal, “onde não há ninguém envolvido” no projecto holandês para “tentar estimular o interesse nesta área” e convencer as universidades a adquirirem os detectores, e teve “uma reacção positiva” de alguns departamentos científicos de Física.
Para Filipe Freire, a aquisição dos detectores permitiria “o envolvimento dos alunos e professores na manutenção do material e estabelecimento de comunicações regulares entre escolas e os departamentos científicos”, o que pode contribuir para “a desmistificação da física: trazer maior contacto entre as escolas secundárias e os centros de investigações para as escolas puderem explicar melhor aos estudantes qual o seu futuro se decidirem estudar física. Por outro lado, podem tornar os projectos da Física mais visíveis para as pessoas em geral”.
/Lusa