Este é o comovente som dos sonhos de um pássaro

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Bem-te-vi-de-coroa (Pitangus sulphuratus)

Os pássaros sonham. E ouvir os sons que emergem de uma ave que sonha com um confronto territorial com uma crista de penas levantada, um gesto que durante o dia está associado a um trinado usado em confrontos, é incrivelmente comovente.

Há mais de 20 anos que os investigadores sabem que as áreas do cérebro das aves dedicadas ao canto apresentam padrões neurais durante o sono semelhantes aos que utilizam quando estão acordadas e a cantar.

Uma vez que o “código” por detrás do processamento desta informação é desconhecido, não foi possível mapear um padrão de atividade nocturna para o canto, até agora.

Uma equipa de investigadores da Universidade de Buenos Aires apresentou agora um método para traduzir a atividade dos músculos vocais das aves durante o sono em canções sintéticas.

Os resultados do estudo foram apresentados num artigo publicado a semana passada na revista científica Chaos.

“Os sonhos são uma das partes mais íntimas e elusivas da nossa existência”, diz o professor de física Gabriel Mindlin, especialista nos mecanismos físicos do canto dos pássaros a autor principal do artigo.

“Saber que partilhamos isto com uma espécie tão distante é muito comovente. E a possibilidade de entrar na mente de uma ave sonhadora – ouvir como soa esse sonho – é uma tentação impossível de resistir“, acrescenta Mindlin, citado pelo Phys.org.

Há alguns anos, Mindlin e os colegas descobriram que estes padrões de atividade neuronal descem até aos músculos seringais, o aparelho vocal das aves, e que podiam captar os dados da atividade muscular das aves adormecidas através de eléctrodos de registo, chamados eletromiografia (EMG), e depois utilizar um modelo de sistemas dinâmicos para os traduzir em canções sintéticas.

“Durante os últimos 20 anos, trabalhei na física do canto das aves e na forma de traduzir a informação muscular em canto“, explica Mindlin. “Desta forma, podemos utilizar os padrões de atividade muscular como parâmetros dependentes do tempo de um modelo de produção do canto das aves e sintetizar o canto correspondente.”

Muitas espécies de aves têm uma musculatura complexa, pelo que traduzir a atividade seringa em canto é um desafio.

“Para este trabalho inicial, escolhemos o Bem-te-vi-de-coroa, um membro da família dos papa-moscas e uma espécie para a qual tínhamos descoberto recentemente os mecanismos físicos do canto, e fizemos algumas simplificações”, explica Mindlin. “Escolhemos uma espécie para a qual o primeiro passo deste programa era viável”.

O Bem-te-vi-de-coroa (Pitangus sulphuratus) é uma ave da família dos Tiranídeos, endémica da América Central e da América do Sul, que pode atingir cerca de 25 centímetros de comprimento.

Ouvir os sons que emergem dos dados de uma ave que sonha com um confronto territorial com uma crista de penas levantada, um gesto que durante o dia está associado a um trinado usado em confrontos, foi incrivelmente comovente para Mindlin.

Senti uma grande empatia ao imaginar aquele pássaro solitário a recriar uma disputa territorial no seu sonho”, disse. “Temos mais em comum com outras espécies do que normalmente reconhecemos”.

O investigador argentino partilhou aqui os dados e o som recolhido durante o estudo… e o ZAP não resistiu a recolher alguns deles, para montar um pequeno vídeo com o comovente som dos sonhos de um pássaro. Veja-o abaixo:

 

ZAP //

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1 Comment

  1. Quando se imagina que não há nada mais para se descobrir ou estudar… É só olhar em redor. Parece que o ser humano continua engatinhando em seu conhecimento. Ainda não sabemos praticamente nada sobre as infinitas coisas que nos cercam.

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