Esqueceu-se de ficheiros secretos numa paragem de autocarro. Agora, vai ter cargo de topo na NATO

Angus Lapsley perdeu documentos sensíveis sobre as forças especiais britânicas em Cabul, no Afeganistão, entre os quais um que dizia: “só para os olhos do Reino Unido”. Mas “não se pode exagerar”, diz Durão Barroso.

Atrás de uma paragem de autocarro do condado de Kent, no sudeste da Inglaterra, perto de Londres, um peão encontrou uma resma de papéis molhados, mas estas 50 folhas não eram propriamente lixo: eram documentos militares secretos sobre as operações das forças especiais britânicas em Cabul, no Afeganistão.

Quem se esqueceu destes documentos enquanto corria para o trabalho — deixando os americanos “furiosos” sem querer — foi um diplomata britânico que, quatro anos mais tarde, deverá ser nomeado embaixador do Reino Unido na NATO.

Os documentos incluíam pormenores sobre a localização de tropas e potenciais reações russas a manobras militares. Eram considerados altamente sensíveis, mas, apesar da polémica, Angus Lapsley está agora na linha da frente para o prestigiado cargo na aliança, revelam fontes do The Times.

A carreira política de Lapsley sofreu após o seu esquecimento, que levou à suspensão temporária da sua autorização de segurança, lembra o jornal. Alguns dos ficheiros que o diplomata perdeu estavam marcados com as palavras “official sensitive” (“sensível oficial”) e pelo menos num dos documentos lia-se “Secret, UK Eyes Only” (em português, “secreto, apenas para os olhos do Reino Unido”). Dentro desse documento, estaria o número exato de soldados em locais espalhados pela capital afegã.

A ‘gafe’ deixou os norte-americanos “furiosos”, conta fonte da sede do governo britânico ao Times, uma vez que a fuga da informação contida naqueles ficheiros poderia colocar em perigo as vidas dos soldados dos EUA, destacados em posições iguais ou muito próximas dos soldados britânicos em Cabul.

Na sequência do episódio, Lapsley terá sido discretamente transferido do seu cargo no Ministério da Defesa para o Ministério das Relações Exteriores, Commonwealth e Desenvolvimento (FCDO). Apesar de tudo, o diplomata nunca foi acusado de nada ao abrigo da Lei dos Segredos Oficiais, o que contraria a tendência verificada em casos semelhantes de falhas de segurança. Foi, sim, transferido para a NATO, onde assumiu o cargo de Secretário-Geral Adjunto para a Política e Planeamento da Defesa e onde mais recentemente esteve envolvido na elaboração da revisão da estratégia de defesa do governo britânico.

Somos muito bons a recompensar o fracasso“, disparou a mesma fonte governamental, que garante que a nomeação deverá ser anunciada na próxima semana. Mas a decisão está a ser questionada por funcionários e por uma fonte sénior da defesa, que considera “profundamente preocupante que o FCDO e o Ministério da Defesa não levem a segurança a sério.”

Por outro lado, Lapsley continua a ser bem visto nos círculos diplomáticos. Tem o apoio, entre outros, do Presidente do Conselho da UE, Durão Barroso, que afirmou que “o Reino Unido está a cumprir a sua penitência e tem estado a liderar a revisão estratégica da defesa” e que “não se pode exagerar a importância” dos ficheiros secretos esquecidos naquela paragem de autocarro.

“Deveria haver uma preocupação real sobre a tomada de decisões por detrás deste processo. Não se pode exagerar a importância desta falha de segurança e o impacto que teve na altura”, sublinhou o ex-primeiro-ministro de Portugal.

Até à data, o Ministério dos Negócios Estrangeiros não emitiu uma declaração oficial sobre a sua nomeação, esperada na próxima semana.

Tomás Guimarães, ZAP //

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