“Cheguei a virar-me para o Adalberto Costa Júnior, a dizer-lhe para se preparar porque ia ser Presidente da República”, relata Justino Pinto de Andrade, do Bloco Democrático.
O deputado e dirigente do Bloco Democrático Justino Pinto de Andrade considerou hoje em Lisboa que as eleições em Angola não foram justas nem transparentes, criticando manipulações da Comissão Nacional de Eleições e do Tribunal Constitucional.
“Ninguém me pode dizer que o MPLA ganhou, é impossível, nós fomos recebidos em todo o lado por multidões, milhares e milhares de pessoas, com ambientes galvanizantes, de tal forma que cheguei a virar-me para o Adalberto [Costa Júnior, presidente da UNITA] a dizer-lhe para se preparar porque ia ser Presidente da República, tal era a convicção na vitória”, explicou.
“Foram eleições que não foram justas nem transparentes, mas foram livres porque as pessoas foram votar e não foram coagidas a votar ou não votar”, disse o deputado e membro da Frente Patriótica Unida, coligação que englobou o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e o Bloco Democrático, à margem da conferência “Pluralismo, Democratização e Eleições em Angola e Moçambique”, que decorre hoje em Lisboa.
Em declarações à Lusa e RDP África, o também professor universitário disse que mais importante que o processo eleitoral no dia da votação e seguintes, é o que acontece antes: “O que acontece antes é que é importante, há um processo de intoxicação, de manipulação, com o Estado a utilizar os meios ao seu dispor para condicionar o sentido de voto dos cidadãos, e sem ultrapassar isto os resultados eleitorais nunca serão justos”, afirmou.
Justino de Andrade foi um dos líderes da coligação que concorreu contra o MPLA nas eleições de agosto, que deu a vitória ao partido no poder, a mais magra desde a independência.
Em setembro, o Tribunal Constitucional angolano validou a vitória do MPLA nas eleições, negando provimento ao recurso interposto pela UNITA, que contestava os resultados do ato eleitoral de 24 de agosto.
Questionado sobre o que deve então mudar para as eleições serem justas, Justino de Andrade disse que é o funcionamento das instituições que tem de ser alterado para garantir imparcialidade.
“Toda a lógica de funcionamento do Estado tem de mudar, senão os resultados vão sempre favorecer o partido no poder; a comunicação social é horrível, tóxica, manipula e nota-se claramente que são pessoas que estão a prestar um serviço ao partido no poder; a CNE [Comissão Nacional de Eleições] não é de confiança, é do domínio exclusivo do partido do poder, e quem diz a CNE, diz o Tribunal Constitucional, que manipulam tudo, e por isso os resultados são sempre favoráveis a quem está no poder”, argumentou.
Repetindo as críticas feitas antes pelo ativista Luaty Beirão sobre o papel dos observadores internacionais, Justino de Andrade disse que muitos fazem apenas turismo eleitoral.
“e, vão, conversam com os partidos, com as pessoas, vão tomar banho à praia e depois pronto, vêm e dizem que as eleições foram livres, justas e transparentes”, lamentou.
Os eleitores votam, “mas depois o seu voto é desviado, é deturpado, e a lei não permite confrontar os dados obtidos pelos partidos com os dados apresentados pela CNE, o que é uma forma de evitar que se desmascare o processo de manipulação, por isso se diz que há deputados da CNE, e depois há os deputados do povo”, concluiu, numa referência aos deputados do MPLA e aos deputados da oposição.
As eleições gerais de Angola realizadas em agosto deste ano ficaram marcadas por contestações dos partidos concorrentes, que alegaram falta de transparência em todo o processo eleitoral, que reconduziu João Lourenço, líder do MPLA, a Presidente da República, num segundo mandato.
O Tribunal Constitucional proclamou o MPLA e o seu candidato, João Lourenço, como vencedores com 51,17% dos votos, seguido da UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) com 43,95%, tendo chumbado o recurso de contencioso eleitoral da UNITA.
Com estes resultados, o MPLA elegeu 124 deputados e a UNITA 90 deputados, quase o dobro das eleições de 2017.
ZAP // Lusa