Dilema na saúde em Portugal: Gasta-se muito ou o que se pode?

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Um novo estudo revelou que os portugueses são dos que gastam dinheiro mais em saúde. Por outro lado, só não gastam mais, porque não têm para gastar.

Portugal é o terceiro país da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) em que a despesa direta das famílias com saúde é mais elevado, com os idosos sujeitos a uma maior desproteção financeira nesse tipo de gastos.

A conclusão é de um relatório sobre o envelhecimento, divulgado esta sexta-feira, e elaborado pelos investigadores Pedro Pita Barros e Carolina Santos.

Segundo este estudo, a despesa direta em saúde em Portugal é de 5,2% dos gastos totais das famílias, acima da média de 3% do conjunto dos países da OCDE e apenas superada pela Suíça (5,5%) e pela Coreia (6,1%).

“Os pagamentos diretos em saúde podem constituir uma barreira financeira ao acesso a produtos e serviços de saúde, gerando necessidades não satisfeitas e criando dificuldades financeiras entre as pessoas que, apesar dos pagamentos diretos, conseguem aceder a serviços de saúde”, alerta o relatório.

De acordo com o estudo, a partir da faixa dos 45-49 anos, as despesas diretas em saúde aumentam de “forma bastante expressiva”, passando de 329,49 euros nesse grupo etário para os 784,04 euros no grupo entre 70-74 anos, o que corresponde a um aumento de 137,95%, realçam os investigadores.

A situação é “particularmente severa para idosos com mais de 70 anos, para os quais as despesas diretas em saúde ultrapassam 8% do rendimento líquido anual por pessoa do agregado familiar, atingindo 10,56% no conjunto de pessoas com 85 ou mais anos de idade”, salienta o relatório.

Idosos financeiramente desprotegidos

“A análise aqui apresentada revela que os idosos em Portugal apresentam uma grande desproteção financeira para despesas em saúde”, alerta o relatório.

As mulheres, os idosos que vivem sozinhos, e os idosos de menores rendimentos e nível de escolaridade são relativamente mais afetados pelas despesas diretas em saúde, já que alocam uma maior percentagem do seu rendimento líquido a estas despesas, acrescenta.

Os investigadores Pedro Pita Barros e Carolina Santos consideram também que a desproteção financeira dos idosos para acomodar essas despesas diretas implica que, perante estes gastos, se “regista um agravamento da situação de pobreza, bem como um aumento da pobreza e de risco de pobreza na população idosa”.

Deixam medicamentos por comprar

De acordo com o mesmo estudo, a probabilidade de um idoso não conseguir comprar todos os medicamentos de que precisa quase triplicou entre 2021 e 2023.

“Após uma diminuição da probabilidade de não aquisição de todos os medicamentos necessários entre 2017 e 2021, nos últimos anos registou-se um agravamento deste indicador de acesso a cuidados de saúde”, alerta o relatório.

Nos idosos, a probabilidade de não aquisição de todos os medicamentos necessários era de 3,93% em 2021, tendo passado para 9,01% em 2023, ou seja, quase triplicou nesse período.

“Tal sugere que, nos anos de 2022 e 2023, a inflação geral poderá ter agudizado as dificuldades financeiras da população, no que toca à sua capacidade de adquirir os medicamentos necessários ao tratamento de um episódio de doença”, lê-se.

Que mais fica por fazer?

O estudo refere ainda que as barreiras financeiras no acesso aos cuidados de saúde necessários podem influenciar, não apenas a decisão de comprar medicamentos, mas também decisões de deixar de ir à urgência ou a consultas.

Segundo o estudo, não é apenas a idade que determina as necessidades de saúde não satisfeitas, mas também as características socioeconómicas dos indivíduos.

No entanto, “uma vez que nos idosos a situação de escassez financeira é mais expressiva do que nos outros dois grupos etários analisados, as dificuldades de acesso a cuidados de saúde tendem a ser superiores entre os idosos”, refere o documento.

Em 2023, 14,20% dos idosos inquiridos reportaram não adquirir todos os medicamentos necessários ao tratamento do episódio de doença, percentagem que foi de 6,73% em adultos com idades entre os 15 e os 49 anos e 9,29% em adultos com idades entre os 50 e os 64 anos.

Mitigar a privação económica dos idosos

Os investigadores defendem que mitigar as necessidades de saúde não satisfeitas “exige que se atue no sentido de reduzir a pobreza entre os idosos e que se considerem medidas de apoio à aquisição de medicamentos mais abrangentes para este grupo populacional”.

O atual Complemento Solidário par Idosos já prevê que os idosos com direito a este apoio tenham gratuitidade nos medicamentos sujeitos a prescrição médica – mas apenas cerca de 5% da população idosa está a beneficiar.

Em 2001, a população com 60 e mais anos representava 21,67% da população residente em Portugal, mas em 2021 esse grupo etário correspondia já a 30,24%.

Em 2070, prevê-se que a população com pelo menos 60 anos totalize 39,21% da população residente em Portugal, de acordo com dados do Eurostat.

ZAP // Lusa

1 Comment

  1. Os Idosos com poucos ou nenhuns rendimentos , são considerados “Descartáveis” por os Governos . Apoios Domiciliários e acompanhamento Médico , são quasi inexistentes en maioria destes casos !

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