Investigadores descobriram que uma molécula produzida pelo cérebro constitui um mecanismo natural de defesa contra os efeitos nefastos da canábis, abrindo caminho a possíveis tratamentos contra a dependência desta droga, segundo um estudo hoje publicado na revista norte-americana Science.
Numa altura em que os dependentes de canábis são estimados em mais de 20 milhões de pessoas em todo o mundo, duas equipas de investigadores do Inserm (Instituto Nacional da Saúde e da Investigação Médica francês) interessaram-se pela pregnenolona, um precursor de todas as hormonas esteroides (progesterona, testosterona, etc.).
Enquanto se pensava geralmente que a pregnenolona não tinha um efeito biológico próprio, os investigadores mostraram que ela é, de facto, capaz de proteger o cérebro dos efeitos nefastos da canábis.
Entre os efeitos mais conhecidos, estão os défices cognitivos e, nomeadamente, problemas de memória, bem como uma perda geral da motivação.
Administrando doses fortes de canábis a ratos, os investigadores conseguiram aumentar a concentração cerebral da pregnenolona nos seus cérebros e bloquear os efeitos negativos do princípio ativo da canábis (o THC), que atua sobre recetores canabinoides (CB1) situados nos neurónios.
As doses ingeridas foram bastante superiores àquelas às quais são expostos os consumidores regulares de canábis: “Da ordem de três a 10 vezes mais”, precisou Pier Vincenzo Piazza, que conduziu o estudo, citado pela agência France-Presse.
Ao aumentar as doses, os investigadores descobriram um processo natural até agora desconhecido que protege o cérebro de uma sobreativação dos recetores CB1 e diminuindo os efeitos da canábis na memória.
Realizaram igualmente testes em laboratório sobre recetores CB1 humanos em que obtiveram os mesmos resultados.
Mas como a pregnenolona é uma hormona natural, mal absorvida e rapidamente metabolizada pelo organismo, os investigadores criaram derivados da pregnenolona “alterados de maneira a poderem ser absorvidos pelo organismo e a não evoluírem para hormonas esteroides”, precisou Piazza.
“Esperamos poder começar os ensaios clínicos em seres humanos dentro de um ano ou um ano e meio, no mínimo”, acrescentou, sublinhando que se a eficácia desses derivados da pregnenolona for confirmada, se tratará da “primeira terapia farmacológica da dependência da canábis”.
/Lusa