ZAP // Nuno Veiga, António Cotrim / Lusa

Um Rui Rocha cheio de pressa atacou a “irresponsabilidade” e “falhanços” fiscais e na Saúde. Um Montenegro calmo esteve à caça dos votantes do liberal.
Debate ameno, sem interrupções, tímido em propostas concretas e barrigudo nas promessas vagas esta segunda-feira, no frente-a-frente entre os líderes da AD – Coligação PSD/CDS e da Iniciativa Liberal, na RTP.
A conversa de tom respeitoso esteve também perto de um aperto de mão, com o próprio Luís Montenegro a tomar mais do que uma vez a iniciativa de “piscar o olho” a Rui Rocha, lembrando as aproximações entre os dois partidos.
Por um lado, vimos o líder liberal mais “agarrado” ao papel, a tentar reforçar a ideia que tem vindo a prometer de uma IL mais cautelosa e responsável nas suas propostas — e de uma AD “à la PS”; por outro, um Montenegro mais solto, calmo e à caça dos votantes da IL.
Rocha admite acordo, mas…
Rui Rocha abriu logo a acusar o primeiro-ministro da “irresponsabilidade” que nos trouxe em maio a eleições mais uma vez, e explicou que votou a favor da moção de confiança que deitou o Governo abaixo porque “o interesse dos portugueses não era ir a eleições”. Mas reforçou: há possibilidade de acordo pós-eleitoral — mas só se Luís Montenegro “estiver à altura da responsabilidade que a IL demonstrou”.
Já Montenegro, que confessou que a AD “tem boa convivência” com a IL “em várias matérias”, lembrou também: “não somos socialistas nem liberais”, porque “ao contrario do que a IL acha, o mercado não resolve tudo”. O governante disse ainda que tem “visto aproximação à moderação da AD por parte de todos os partidos” e que “quase todos os partidos acabam por concordar com a AD”.
Entre declarações vazias com nomes bonitos, sem muito conteúdo em concreto, Rocha também partiu para o ataque e passou a enumerar as falhas da AD.
AD “falhou” na Saúde; Montenegro esqueceu o ISP
A coligação que governou “decidiu encostar-se ao PS e não foi reformista nem assegurou estabilidade”, acusou Rui Rocha, que apontou as suas forças para as falhas na Saúde, aproveitando a “falta de plano” do Governo já na Páscoa que aí vem, com seis urgências fechadas no sábado e 10 no domingo — e não exatamente “15 urgências fechadas no fim de semana” como disse o líder liberal neste frente-a-frente.
“A AD falhou na saúde e no INEM, nos médicos de famílias, nas listas de espera. A promessa de medico de família para todos não vai concretizar-se. Continuamos com 1,5 milhões de pessoas sem médico de família”, acusa Rui Rocha.
“Para a AD, os cidadãos precisam de esperar que o SNS falhe para ir aos outros serviços”. Para os liberais, não devia ser assim — mas Rui Rocha também não conseguiu explicar como vai “evoluir” o sistema de saúde como promete.
Montenegro não se deixou ficar. “Era bom que um partido que se diz liberal pudesse ter votado o primeiro orçamento que não aumentou um único imposto“, devolveu, em referência ao orçamento proposto pela AD — embora pareça esquecer-se do ISP (Imposto sobre Produtos Petrolíferos), que aumentou em janeiro.
Ainda sobre a Saúde, o primeiro-ministro lembrou que “o ponto de partida era muito mau”, mas que “as coisas estão melhor que no ano passado, com “mais 152 mil portugueses com médico de família” e “mais médicos”. E sublinha: a AD “não abdica do SNS”.
Sobre a permanência da ministra da Saúde caso a AD ganhe as eleições de 18 de maio, Montenegro garante que Ana Paula Martins “será deputada”, mas não se compromete com um lugar guardado para a farmacêutica no governo.
AD “aumentou carga fiscal”; AD não antecipa recessão
O “falhanço” deste governo de Montenegro na Saúde estende-se aos impostos, na visão de Rui Rocha, que acusa a AD de se gabar de parte da descida dos impostos que já estava delineada por António Costa e de “aumentar a carga fiscal”, que subiu, de facto, em uma décima, face ao ano passado.
A IL virou-se rápido para os jovens, ou mais precisamente, para as “gerações dos entalados” que Rocha descreveu mais do que uma vez e que quer salvar.
Embora o tenha feito quase sempre sem números concretos, Rui Rocha enumerou o “desemprego inadmissível, salários baixos, dificuldade comprar casa para jovens” desta geração que passou por crises do subprime, covid, inflação e outras complicações. “Não podem continuar à espera anos a fio de uma velocidade baixa. E nós queremos acelerar Portugal”, disse, recorrendo ao slogan do partido mais do que uma vez.
“A governação da AD foi uma total ausência de soluções para a geração dos entalados”, sublinhou Rui Rocha.
Acusado de prometer tudo a todos nos últimos dias, um contido Montenegro nega. “O crédito da nossa proposta política e financeira é o nosso desempenho em 2024. São propostas moderadas, nomeadamente no IRC. Valorizamos pensionistas, valorizamos carreiras, como as dos professores e das forças de segurança”. E “não espera” que a recessão que possa estar a chegar obrigue a cortes, nem diz onde vai cortar.
Bola de volta a Rui Rocha, que sublinhou: a “prudência manda”, e Montenegro “está parecido com o PS”.
“A AD andou a passar cheques a grupos e a atirar dinheiro” para cima dos problemas, acusou Rui Rocha, que prometeu baixar o IVA na construção, descer impostos para as empresas, acusando a AD de ser ouco ambiciosa nesse aspeto.
Sobre o caso Spinumviva, Montenegro nega qualquer culpa, mas lembra: todos nós podemos “sempre fazer algo diferente”, olhando para trás. Mais tarde, após o debate, disse ser “à prova de bala”: está “pronto para o que der e vier”.
Rocha põe-se no fato do primeiro-ministro: “eu teria terminado o assunto muito mais cedo, foi uma irresponsabilidade” da parte de Luís Montenegro que “não deu as explicações atempadas”, acredita o liberal, que investiu mais uma vez na ideia de estabilidade e sentido de responsabilidade de governação. “Se Montenegro for eleito, vamos outra vez para moção de confiança?”, questionou: “está Luís Montenegro em condições de garantir a estabilidade?”
Nota-se nitidamente que Luís Montenegro é o político mais bem preparado em Portugal. Qualquer outro fica a léguas de distância.