Crianças romenas são vendidas por 100 euros para mendigar. Como funciona a rede de tráfico?

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A rede opera em vários países europeus e consiste na compra de crianças para as forçarem a mendigar, explorar sexualmente ou a fazer trabalhos domésticos. Só Portugal e a Roménia têm inquéritos abertos.

Uma investigação policial revelou a existência de uma rede de tráfico de crianças que operava em Portugal e noutros países europeus, com os menores a ser vendidos para mendigarem e outras formas de escravidão. A descoberta ganhou novo fôlego após a localização de uma adolescente na Geórgia, que tinha desaparecido de Portugal há cinco anos.

As crianças, muitas de origem romena, eram vendidas pelos próprios familiares por valores irrisórios, chegando a apenas 100 euros. Uma vez nas mãos da rede criminosa, eram distribuídas por várias cidades da Europa, incluindo Portugal, onde eram forçadas a pedir esmola em locais estratégicos como hospitais, igrejas e zonas turísticas. Algumas das vítimas usavam placas falsas alegando serem surdas-mudas para sensibilizar os transeuntes.

Entre as vítimas estava uma jovem romena de 15 anos, encontrada em Viseu no mesmo ano. Grávida, foi levada para a Maternidade Júlio Dinis, mas foi retirada do hospital antes de dar à luz por duas mulheres ligadas à rede de tráfico. Seis anos depois, foi localizada na Geórgia, mas não se sabe onde está o bebé.

A coordenadora nacional das respostas de assistência a vítimas de tráfico da Associação para o Planeamento da Família (APF), Marta Pereira, explica que Portugal é simultaneamente um destino, um ponto de trânsito e também de origem de vítimas, incluindo menores portugueses levados para exploração no estrangeiro.

“Os casos que temos sinalizados de mendicidade são de crianças estrangeiras, mas temos crianças vítimas de tráfico para exploração laboral, sexual, servidão doméstica, situações de venda para aproveitamento de subsídios, bebés para adoções ilegais… Há de tudo”, explica ao Expresso.

As raparigas eram frequentemente vigiadas e tinham os documentos confiscados pelos seus exploradores. Em alguns casos, as violações resultavam em gravidezes precoces, cujos bebés poderiam ser vendidos para adoções ilegais.

As dificuldades de investigação aumentam devido à constante renovação das vítimas e à doutrinação que recebem. Muitas não sabem em que país estão e chegam a fornecer identidades falsas treinadas pelos traficantes.

O esquema era altamente lucrativo para os criminosos. A rede exibia ostentosamente os ganhos nas redes sociais e transferiu pelo menos meio milhão de euros para contas bancárias na Roménia.

A operação policial teve início em 2019, quando as autoridades perceberam que as mesmas crianças estavam sempre nos mesmos locais e eram recolhidas pelas mesmas pessoas ao fim do dia. A Polícia de Segurança Pública (PSP) identificou cerca de trinta adolescentes traficadas por esta rede criminosa.

Apesar da magnitude do problema, apenas dois inquéritos estão em curso: um em Portugal e outro na Roménia. A acusação será formalizada em breve, abrangendo nove arguidos, todos em liberdade e fora de Portugal. A sua extradição depende de mandados de detenção europeus.

ZAP //

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