Corrupção na Madeira. Nem 13 envelopes com meio milhão em notas e palavras enigmáticas convenceram juiz

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Homem de Gouveia / Lusa

O presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado

Entre mais de meio milhão de euros em notas e dezenas de relógios de luxo apreendidos, o juiz de instrução do processo que investiga suspeitas de corrupção na Madeira, não encontrou nenhum sinal de crime. Porque, afinal, “estar na posse de dinheiro não é crime”.

O caso de corrupção na Madeira que implica o ex-presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, e que levou à demissão do presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, está num impasse.

O juiz de instrução concluiu que não existem indícios de corrupção, nem de “qualquer crime”, e determinou a libertação dos três suspeitos do caso – Pedro Calado e os empresários Avelino Farinha e Custódio Correia que estiveram detidos durante 21 dias.

O MP já anunciou que vai recorrer da decisão, mas já se questiona se a montanha pariu um rato.

Entre dúvidas e diversos posicionamentos, pergunta-se também como é que o juiz não viu indícios de crime quando foram apreendidos nas buscas realizadas envelopes com cerca de 679.500 euros em dinheiro vivo, segundo as contas do Público.

Só na casa de um empresário da noite madeirense, Emanuel Rebelo, que tem ligações a Pedro Calado através das competições de ralis, foram encontrados 13 envelopes com quase meio milhão de euros em notas num cofre embutido numa parede de um quarto da sua residência.

Estes 13 envelopes tinham o logotipo “Vespas” da equipa de ralis de Pedro Calado e palavras enigmáticas escritas à mão com os seguintes dizeres, conforme divulga o Observador:

  • Enjoy life [Aproveita a vida]
  • Bright envelope [Envelope brilhante]
  • Forever smile [Sorriso eterno]
  • Smile… Always smile [Sorri… Sorri sempre]
  • O generoso
  • O generoso B
  • What a smile [Que sorriso]
  • Keep smiling life is great [Continua a sorrir a vida é fantástica]
  • Shine on me [Brilha em mim]
  • Good. Very well thank you [Bom. Muito bem obrigado]
  • C’est la vie [É a vida]
  • Alo, ok to you” [Olá, ok para ti]
  • Let the sunshine in [Deixa o sol entrar].

O MP acredita que estas palavras se referem a um qualquer código e que indiciam eventuais “luvas” de Custódio Correia a Pedro Calado para obter benefícios em contratações públicas, através do patrocínio das despesas do ex-autarca na participação em provas de rali.

Contudo, o juiz não vê quaisquer indícios de crime. Até porque “estar na posse de dinheiro não é crime”, uma vez que “a origem pode não ser criminosa”, como nota um dos advogados dos suspeitos, Raul Soares da Veiga, citado pelo Público.

Um diamante, relógios de luxo, notas e cartão especial

As buscas realizadas também levaram à apreensão de um diamante de 50 mil euros no gabinete de Calado e de 15 relógios de luxo de marcas conhecidas como Cartier e Franck Muller, na sua casa, além de 42.440 euros em dinheiro vivo encontrados em envelopes.

Por outro lado, a investigação do MP assinala ainda a existência de depósitos bancários em numerário feitos pelo motorista de Pedro Calado nas contas do ex-autarca. Entre 2012 e 2023, terão sido depositados, em dinheiro vivo, cerca de 180 mil euros.

Trata-se de dinheiro que não terá sido declarado ao Fisco, o que, só por si, é já crime.

Além disso, o MP fala de um eventual favorecimento do grupo de construção AFA, do empresário Avelino Farinha, a Pedro Calado na celebração do seu casamento no Hotel Savoy Palace em 2021. O hotel pertence ao grupo AFA.

O ex-autarca tem um cartão de “acesso ilimitado às instalações”, mas o juiz entende que se trata de uma “mera cortesia” de Farinha para com o seu ex-funcionário – Calado geriu o grupo AFA antes de entrar para a Câmara do Funchal.

Nas buscas, também foi encontrado dinheiro vivo, na ordem dos 50 a 60 mil euros, nas buscas realizadas aos dois empresários.

Apesar de todos estes dados incluídos no processo, o juiz de instrução não viu indícios de qualquer crime.

A teoria do MP é que Pedro Calado e Miguel Albuquerque receberam dinheiro e outras ofertas dos grupos empresariais de Avelino Farinha e de Custódio Correia para serem beneficiados em concursos para obras públicas.

Erro do MP obriga a anulação de testemunho

O juiz de instrução também foi obrigado a anular a inquirição do secretário regional de Equipamentos e Infra-Estruturas, João Pedro Fino, devido a um erro do MP.

Por ser um elemento do Governo Regional, o MP tinha que ter pedido à Assembleia Regional para o inquirir, o que não aconteceu. Assim, o magistrado foi obrigado a “apagar” dos autos o seu testemunho, como nota o Público.

Foi João Pedro Fino quem assinou alguns dos contratos públicos que estão sob suspeita no inquérito. Mas terá recebido instruções superiores para isso e não foi constituído arguido.

Desde 2019, altura em que Fino assumiu o cargo, o Governo Regional adjudicou à empresa de construção Afavias do grupo de Farinha obras no valor de mais de 213 milhões de euros.

ZAP //

11 Comments

  1. Benditos testes psicotécnicos que validam a entrada para a magistratura destes Senhores Drs Juízes!
    Já agora, surgiu-me uma ideia:
    E que tal um exame à visão, que permitisse eliminar aqueles candidatos que, mesmo com óculos, não enxergam patavina de nada?!
    Fica a ideia…

  2. Ainda estou a digerir tudo isto.
    Aguardo mais alguns desenvolvimentos, para poder consolidar as bases do comentário.
    Assim sendo, aproveito os entretantos para desafiar a comprovada criatividade do IKEA, no sentido de nos brindar com mais um dos seus trabalhos “publicitários”.

  3. Abriram um precedente muito perigoso… Se nem assim se vêem motivos para se aprofundar a investigação sobre esta (pouca) vergonha que há anos acontece na Madeira (e não só, infelizmente), como esperam que se faça fé na justiça???

  4. 13 envelopes com meio milhão em notas e palavras enigmáticas convenceram juiz? Das duas uma, ou este senhor acredita no Pai Natal e é igual a eles, faz o mesmo.

  5. Com buscas em mais de 70 locais (empresas, habitações e entidades públicas), ainda acham essa quantia absurda!? Só faltava terem ido à casa do padeiro..
    Só numa habitação (de um empresário com ligações a restauração e bates noturnos) foram encontrados cerca de 500mil, agora façam as contas.
    Com a dimensão que deram ao caso, tinham de ser encontrados milhões, para se justificar.

  6. Este Juiz deve ser mais um Ivo Rosa, o tal que quando delibera em favor dos acusados…, ve a sua razao arrasada apos recurso do MP, vamos la a ver no que vai dar o recurso do MP…

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