Ciúmes doentios podem ser sinal de síndrome de Otelo

Christian Köhler / Wikimedia

"Otelo com a sua mulher adormecida", de Christian Köhler (1859)

“Otelo com a sua mulher adormecida”, de Christian Köhler (1859)

“A mulher mais ciumenta do mundo” foi notícia nos jornais britânicos na semana passada por submeter o marido a testes com um detetor de mentiras todas as vezes que chegava a casa.

Os ciúmes de Debbi Wood, de 31 anos, são patológicos, tendo sido diagnosticada com “síndrome de Otelo“.

O nome é inspirado na famosa obra de Shakespeare, “Otelo”, na qual o personagem principal, possuído por ciúmes doentios, mata a esposa, Desdémona.

As pessoas que têm síndrome de Otelo sofrem com o delírio de que os parceiros ou parceiras são infiéis.

“A pessoa fica obcecada com a ideia de traição e infidelidade e tenta fazer de tudo para encontrar provas que mostrem que está certa”, explicou à BBC o psiquiatra Walter Ghedin.

“Por exemplo, ela tenta coscuvilhar o computador ou o telemóvel do parceiro ou mostra-se violenta, humilhando o outro.”

Casos extremos

Em casos extremos, a pessoa que sofre com este transtorno pode chegar a matar o objeto dos seus ciúmes.

“Quando se chega ao homicídio é porque existe outro tipo de personalidade patológica, que se desenvolve a partir de uma paranóia ou um ciúme delirante”, diz o especialista.

Segundo Ghedin, há casos em que os ciúmes são reforçados pela influência de terceiros, lembrando desde logo a obra de Shakespeare, onde Iago ajuda a convencer Otelo de que Desdémona seria infiel.

“As pessoas ciumentas podem ser influenciadas pelas opiniões dos outros, ou até pelos meios de comunicação”, diz o psiquiatra.

Segundo o especialista, a melhor forma de tratar a síndrome de Otelo é procurar ajuda o quanto antes e perceber as causas do problema.

A psicoterapia seria uma grande ajuda e, nos casos extremos, recomenda-se medicação.

“Em alguns pacientes a ideia de infidelidade é tão forte, tão recorrente no pensamento, que altera as relações com outras pessoas. Nesses casos, a medicação pode atenuar a intensidade dessa ideia fixa”, diz Ghedin.

Tipos de ciúmes

Os ciúmes só são considerados um distúrbio psiquiátrico quando dominam as pessoas e alteram drasticamente as suas vidas.

Segundo Ghedin, há quatro tipos de ciúmes:

  • Reação emocional normal: trata-se de um sentimento transitório, que não condiciona a vida de quem o sente;
  • Reação emocional desmedida: afeta sobretudo as relações amorosas. Pode ou não ter sido precedida de situações de infidelidade;
  • Ciúme como traço distinto da personalidade: típico dos que têm personalidade desconfiada. Os ciúmes afetam todas as áreas da vida de uma pessoa: família, amor e relações de trabalho. Em geral é característico de pessoas calculistas, que veem ameaças onde elas não existem e estão convencidas de que seu ponto de vista é uma verdade indiscutível. Está ligado ao chamado Transtorno Paranóico de Personalidade;
  • Síndrome de Otelo: como dito anteriormente, um distúrbio caracterizado por pensamentos delirantes de ciúme. O delírio que alimenta os ciúmes pode ser parte de um transtorno crónico ou paranóia, mas também pode indicar um quadro de demência por deterioração do córtex cerebral ou de alcoolismo crónico.

Homens

A síndrome de Otelo é mais comum em homens do que em mulheres. Segundo Ghedin, isso acontece por razões psicológicas e culturais.

No homem, “o apego real e simbólico à figura da mãe” atuaria inconscientemente gerando sentimentos ambivalentes de amor e ódio com relação a outras mulheres.

No que diz respeito à influência da cultura, segundo o psiquiatra, o problema é que em muitas sociedades ainda é forte a ideia de poder e dominação dos homens sobre as mulheres.

Como resultado, alguns homens esperam que as suas companheiras se submetam às suas regras e qualquer conduta de autonomia é vista como suspeita.

ZAP / BBC

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