Exploradores que foram ao Polo Sul mas erraram nas calorias, um navio de guerra e uma nave espacial que se perderam porque os construtores misturaram os pés, um míssil que falhou o alvo por uns bits… no que diz respeito à matemática, é preciso ter muito cuidadinho.
Sabem quando vocês cometem um pequeno erro e os danos são colossais? É precisamente disso que vou falar hoje: desastres que foram causados por erros matemáticos.
Eu rio-me de algumas dessas coisas, apesar de não ter piada nenhuma e ser algo triste. Mas há erros que são tão caricatos, são tão maus, que dá mesmo vontade de uma pessoa se rir.
Ok, comecemos pela primeira desventura.
Expedição sem calorias
Durante uma das primeiras expedições ao Polo Sul, entre 1910 e 1912, o líder do grupo, Robert Falcon Scott, calculou de forma errada a quantidade de calorias que as rações dos exploradores deviam conter.
Eles estavam a ingerir cerca de 4.400 kilocalorias por dia. No entanto, devido ao frio e aos esforços que tinham de fazer, gastavam cerca de 7.000 kilocalorias diariamente. Portanto, criaram um défice calórico.
Este erro de cálculo nos calorias levou a que, quando chegaram ao Polo Sul, os exploradores já tivessem perdido cerca de 25 kg de peso — e, na viagem de regresso, emagreceram tanto que acabaram por morrer à fome.
Trocar os pés… pelos metros
No segundo desastre matemático, em 1628, expressões de horror esboçavam-se na cara dos suecos enquanto viam o seu novo navio de guerra Vasa afundar-se a menos de uma milha da costa.
E qual foi o problema? O navio estava assimétrico, era mais espesso a bombordo do que a estibordo. E, provavelmente, isto deveu-se ao facto de os construtores terem trabalhado com diferentes sistemas de medida.
Os arqueólogos que exploraram o naufrágio encontraram quatro réguas que tinham sido utilizadas na construção do navio. Duas destas réguas estavam calibradas em pés suecos, que correspondiam a cerca de 30 centímetros. E as outras duas, em pés holandeses — cerca de 28 centímetros.
Um erro semelhante ocorreu alguns séculos mais tarde, quando a sonda espacial Mars Climate Orbiter, da NASA, que ia orbitar Marte, foi à vida.
A equipa de engenharia fez os cálculos com o sistema imperial britânico, ao passo que o pessoal do Jet Propulsion Lab usou o sistema métrico.
Deu porcaria.
Folha com erro de cálculo
Este não é bem um desastre, é mais um pormenor bizarro. Aparentemente, na versão de 2007 da folha de cálculo Microsoft Excel, multiplicar números cujo resultado era 65.535 resultava num erro.
Por exemplo, 850 x 77.1 supostamente dá 65.535, mas no Excel o resultado apresentado era de 100.000. E o mesmo acontecia com 10.2 x 6.425, ou seja, no cálculo de números cujo produto era 65.535, o Excel dizia que era outra coisa — os tais 100.000.
Mas o que é que este número 65.535 tem de especial? Será esse o verdadeiro número da besta? Bem, é nada mais nada menos do que o maior número que pode ser representado utilizando 16 bits, tendo em conta que é 216-1.
0,010111000011 segundos contam
Quarto desastre: em 1991, durante a Guerra do Golfo, um míssil norte-americano não foi capaz de intercetar um míssil iraquiano, o que resultou na morte de 28 soldados.
A causa foi um cálculo impreciso do tempo desde a inicialização do míssil, devido a erros aritméticos por parte do computador. Mais especificamente, o relógio interno do míssil media o tempo em décimos de segundo e os cálculos eram efetuados utilizando números com 24 bits.
O problema é que, no sistema binário, o número 1/10 (ou seja, 0,1), não admite uma representação finita e a sua expansão binária foi cortada após 24 bits.
Este erro de truncatura foi-se propagando ao longo de 100 horas, o que fez com que os erros se fossem acumulando, aumentando, e no final o erro acabou por ser de 0,34 segundos.
Ora, como o míssil iraquiano levava uma velocidade de cerca de 1.676 m/s, isto fez com que neste espaço de tempo, em 0,34 segundos, tivesse percorrido mais do que meio quilómetro: 569,84 metros. O míssil norte-americano não conseguiu prever este comportamento e já não tinha alcance para o intercetar.
Este é o que podemos chamar de típico erro de arredondamento…
As pontes oscilam. Com frequência!
Finalmente, o quinto e último desastre tem a ver com a queda da ponte de Tacoma, em Washington, no ano de 1940. Esta ponte era feita de aço e, por estranho que pareça, este material tem uma elevada elasticidade e, portanto, oscila com uma certa frequência natural.
Ora, no dia 7 de novembro de 1940, devido a ventos de cerca de 60 km/h, a força externa periódica a atuar sobre a ponte tinha uma frequência que coincidia com a frequência natural da ponte, e isso fez com que ocorresse um fenómeno chamado ressonância mecânica.
A ponte começou, então, a oscilar cada vez mais, porque estas frequências coincidiam precisamente, e o resultado acabou por ser completamente destrutivo.
Um fenómeno semelhante ocorreu em 1831, na ponte de Broughton, em Inglaterra, quando uma coluna de soldados a atravessou a marchar, porque, por obra de Satanás, a frequência da marcha dos soldados coincidiu com a frequência natural da ponte e, então, voltou a haver este fenómeno de ressonância.
A ponte começou a oscilar — e lá se foi.
Essa é a razão pela qual, se uma coluna militar atravessar a ponte de D. Luís I, no Porto, os soldados não podem ir a marchar. Em contrapartida, podemos estar descansados: na noite de S. João, quando milhares de pessoas atravessam a ponte, não há qualquer perigo — porque os seus passos estão dessincronizados.
E pronto, estes 5 casos mostram-nos que é preciso ter muito cuidadinho no que diz respeito à matemática; temos de fazer as coisas com bastante rigor, tentar prever o que é que pode acontecer de mal… e claro, fazer testes.
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