Num estudo inovador da Universidade da Califórnia, em Berkeley, cientistas conseguiram reconstruir “Another Brick in the Wall, Part 1” dos Pink Floyd, analisando as gravações neurais do córtex auditivo humano.
A investigação, que demonstra a profunda resposta do nosso cérebro à música, é vista como um avanço significativo na compreensão de como percebemos e interpretamos melodias e ritmos.
A música é universalmente reconhecida pelo seu impacto emocional.
Estudos anteriores revelaram os seus efeitos na redução da ansiedade e dor, e na melhoria do humor, qualidade do sono e memória.
Várias partes do cérebro, incluindo áreas relacionadas com emoções, regiões de memória e o sistema motor, são ativadas ao ouvir música.
O novo estudo usou tecnologia avançada de modelação computacional para analisar a reação do cérebro à icónica faixa dos Pink Floyd “Another Brick in the Wall, Part 1”.
“Conseguimos reconstruir com sucesso uma música a partir da atividade neural registada no córtex auditivo,” explicou à ZME Science o neurocientista francês Ludovic Bellier, investigador na UC Berkeley e primeiro autor do estudo.
No estudo, que foi publicado esta terça-feira na PLOS Biology, foi registada a atividade cerebral de 29 pacientes submetidos a eletroencefalografia intracraniana (iEEG) para tratamento de epilepsia, enquanto ouviam a conhecida canção da banda britânica.
Os investigadores usaram um método de reconstrução de estímulo, com um algoritmo de aprendizagem automática para fazer corresponder padrões neurais a vários elementos da canção, como melodia, ritmo e letras, para registar a música tal como transmitida pelo cérebro.
Abaixo, um excerto da música reconstruida com os 347 elétrodos usados nos 29 pacientes:
E neste segundo excerto, a música reconstruida com 61 elétrodos de um dos pacientes:
Embora a música registada no decorrer da experiência não seja uma correspondência exata com a música original dos Pink Floyd, capta os seus principais atributos, sugerindo que é possível ler música a partir das nossas mentes.
Contudo, a natureza invasiva da experiência, envolvendo eletrodos implantados, torna-a improvável para aplicações do dia-a-dia.
Dos numerosos eletrodos implantados nos cérebros dos pacientes, 347 detetaram atividade neural específica para música em três regiões principais: o Giro Temporal Superior (STG), Córtex Sensório-Motor (SMC) e o Giro Frontal Inferior (IFG).
Notavelmente, o hemisfério direito dominou no processamento musical, com uma região específica no STG identificada como crucial para decifrar o ritmo na música rock.
“Agora sabemos em detalhe as regiões cerebrais que suportam a descodificação musical”, considera Robert Thomas Knight, corresponding author do estudo.
Embora o potencial de recriar músicas inteiras a partir de pensamentos seja uma ideia fascinante, a principal contribuição do estudo reside no seu mapeamento detalhado do processamento musical no cérebro.
E, salienta Knight, deixa-nos um passo mais próximo de poder ajudar pessoas com limitações físicas graves, como Stephen Hawking, a recuperar a sua capacidade de comunicação.