Uma onda gigante de gravidade na atmosfera de Vénus, com mais de 10 mil quilómetros, pode ser a maior do seu género no nosso sistema solar.
Astrónomos dizem acreditar que a formação, observada desde uma nave espacial japonesa, terá sido gerada de modo “muito semelhante” às ondulações formadas quando a água flui sobre rochas num leito de riacho.
A onda é formada pelo fluxo da baixa atmosfera sobre as montanhas de Vénus, explicam os astrónomos em artigo publicado no Nature Geoscience Journal.
Logo depois de entrar na órbita de Vénus, em 2015, a nave espacial Akatsuki registou um fenómeno em forma de arco, na atmosfera superior do planeta, durante vários dias. Curiosamente, a estrutura brilhante – que se estende por 10 mil quilómetros – permaneceu fixa no topo das nuvens de Vénus.
O fenómeno surpreende porque, na espessa atmosfera superior do planeta Vénus, as núvens movimentam-se a 360 km/hora – ou seja, movem-se muito mais rapidamente do que a lenta rotação do planeta abaixo delas, onde um dia dura mais do que o tempo que o planeta leva para orbitar em torno do sol.
Makoto Taguchi, investigador da Universidade de Tóquio, Atsushi Yamazaki, da Agência de Exploração Aeroespacial do Japão (Jaxa), e outros cientistas mostraram que a zona luminosa ficou parada sobre uma região montanhosa na superfície do planeta, conhecida como Aphrodite Terra.
Também descobriram que essa zona era mais quente do que as partes circundantes da atmosfera.
Português ajuda a desvendar o mistério
A investigação em torno deste fenómeno misterioso conta com a participação do professor português Pedro Machado, investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, que está a colaborar com a Jaxa.
O especialista em Vénus explica, em declarações à TSF, que acredita que o mistério está relacionado com as ondas em Y de Vénus. Para ajudar a perceber melhor o fenómeno, Pedro Machado compara o caso a um rio percorrido por “um pato que está a nadar ao longo do ribeiro”.
O pato “vai criar uma onda em forma de Y e que, no fundo, é uma onda que se propaga quando temos um meio fluído que tem umas barreiras”, diz Pedro Machado.
“Neste caso são as margens de um rio e, no caso de Vénus, são as dunas dos vórtices solares, onde o ar é tão mais frio que tem uma circulação atmosférica tão diferente que funciona como uma barreira”, nota o cientista português.
“Esta diferença de densidades é como se fossem margens, onde, entre elas, nas latitudes médias, se descolasse a atmosfera de Vénus”, pelo que é como se um “pato gigante” propagasse estas “ondas em forma de Y deitado”, conclui Pedro Machado.
Fenómeno especial
Segundo os cientistas, o fenómeno é o resultado de uma onda de gravidade gerada à medida que a atmosfera mais baixa atravessa as montanhas e se espalha para cima, através da atmosfera espessa de Vénus.
As ondas de gravidade ocorrem quando um fluído – como um líquido, gás ou plasma – é deslocado de uma posição de equilíbrio.
“Se um ribeiro flui sobre uma rocha, as ondas de gravidade propagam-se para cima, através da água. Na superfície do ribeiro, seria possível perceber alterações na sua altura”, explica à BBC o cientista planetário Colin Wilson, da Universidade de Oxford, em Inglaterra.
“Mas o que acontece em Vénus é diferente, porque estamos a ver o fenómeno a acontecer a meio de temperaturas máximas nas nuvens. As partículas atmosféricas estão a movimentar-se para cima e para baixo, tal como as partículas da água”, acrescenta Wilson que não participou da pesquisa.
De acordo com os investigadores, o estudo “mostra uma evidência directa da existência de ondas de gravidade estacionárias (fixas), e também indica que tais ondas de gravidade estacionárias podem ter uma escala muito maior – talvez a maior já observada no Sistema Solar”.
“O que torna este fenómeno especial é que ele se estende de pólo a pólo, em Vénus”, destaca Wilson, frisando que não há uma formação semelhante em Júpiter “porque, como a rotação do planeta é muito mais rápida, a sua atmosfera é dividida em cinturões“.
“A rotação lenta de Vénus permite, por outro lado, uma formação desse tipo”, acrescenta o especialista.
Ainda não se sabe se as ondas de gravidade geradas pela topografia montanhosa de Vénus podem movimentar-se para as partes superiores das nuvens do planeta. Mas as observações indicam que a dinâmica atmosférica pode ser mais complexa do que os cientistas inicialmente previam.
Wilson participou da missão Venus Express, da Agência Espacial Europeia, que terminou em Dezembro de 2014. Perto do fim da expedição, a nave espacial detectou sinais da existência de actividade vulcânica no planeta vizinho da Terra.
“A nossa equipa só viu isso num local em Vénus. O facto de a Akatsuki estar lá há alguns anos e equipada com o tipo correcto de câmaras vai permitir, potencialmente, detectar mais desses eventos vulcânicos activos”, conclui Wilson.
ZAP // BBC
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