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Abusos sexuais, casamentos forçados e gravidez indesejada: o que piorou em África com a pandemia

Os efeitos da atual pandemia causada pelo covid-19 afetam a população de forma desigual e as pessoas que se encontram nas interseções de diferentes desigualdades (género, pobreza, etnia ou orientação sexual) são as mais afetadas.

Este fenómeno tem acontecido em tempos de crise ao longo da história. Agora crescem cada vez mais os casos de violência de género, a incidência de doenças sexualmente transmissíveis, a gravidez na adolescência e o casamento infantil, aumentando assim a discriminação de género.

De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas, durante os períodos de confinamento, a violência de género tem tendência para aumentar em todo o mundo numa média de 20%. Estes dados indicam que, após seis meses de confinamento, houve 31 milhões de casos a mais de violência de género.

As medidas de confinamento, bem como o encerramento de escolas, fizeram com que muitas meninas africanas fossem obrigadas a voltar para a casa dos pais, um lugar que nem sempre é seguro. Em Serra Leoa, várias ONGs, como a Save the Children, lançaram um programa para alimentar meninas vulneráveis ​​que vivem nas regiões mais pobres do país.

As organizações querem evitar o aumento da gravidez na adolescência, um fenómeno que cresceu quando ocorreu a pandemia de Ébola em 2014. Nessa altura, o número de jovens menores grávidas aumentou cerca de 65% em comparação com os anos anteriores e a maioria das meninas foi forçada a fazer sexo em troca de alimentos.

No Uganda e no Quénia, os especialistas voltaram a observar um crescente número de mulheres grávidas durante a adolescência. Isto acontece porque a maior parte das meninas vivem com pessoas que abusam delas sexualmente e usam as relações sexuais como moeda de troca para atender às suas necessidades básicas.

No caso de Uganda, para tentar amenizar esta situação, foi criado um Comitê de Proteção à Criança com a colaboração de organizações internacionais como a Visão Mundial em zonas com maior incidência deste problema.

Casamentos infantis

Segundo a ONU, devido à pandemia que se vive atualmente, a expectativa é de que na próxima década hajam mais de 13 milhões de casamentos infantis, dos quais 4 milhões deverão ocorrer nos próximos dois anos. Este número junta-se aos 12 milhões de meninas que se casam anualmente.

Essa prática está enraizada na desigualdade de género e nas estruturas patriarcais, bem como em fatores de pobreza, falta de educação e inseguranças económicas que se agravam em períodos de crise.

A Etiópia é o 15º país do mundo com a maior taxa de casamentos infantis. Embora o seu Código Penal criminalize o casamento infantil, o país tem um total de 15 milhões de meninas casadas. Mesmo que o número de casamentos infantis tenha diminuído de 60% para 40% nas últimas duas décadas, esses avanços estão agora a ser deitados para trás.

No Quénia, o encerramento das escolas significou também o encerramento de espaços seguros para as crianças, onde estas escapam de mutilações ou casamentos forçados. Vários estabelecimentos de ensino expressaram preocupação com o possível não retorno de muitas meninas e adolescentes à escola quando estas reabrirem.

No Sudão do Sul, um país onde 45% da população tem menos de 18 anos, 3,1 milhões de meninos e meninas não podem ir à escola. De acordo com a UNICEF, 52% das mulheres casam-se antes dos 18 anos e 9% antes dos 15 anos, sendo que este é o sexto país do mundo com a maior prevalência de casamentos infantis.

Campanhas de consciencialização

Para reverter essa situação, vários grupos de mulheres ativistas têm vindo a realizar campanhas de consciencialização durante o confinamento em diferentes regiões que contam com uma alta incidência de casamentos infantis e de gravidez na adolescência.

Nessas campanhas, as ativistas enfatizam a importância da educação para as meninas e desmistificam os rumores de que estas se devem casar antes do fim da pandemia. Já houve situações em que foram forçadas a casar-se por falta de apoio financeiro em casa, esperando assim que o marido pagasse as despesas escolares.

É necessário, principalmente em tempos de crise como a que estamos a viver, proteger os direitos das género, garantindo um espaço seguro para o seu desenvolvimento adequado das crianças.

Segundo o The Conversation, isso implica desfrutar de uma educação primária e secundária completa e não ser forçada, direta ou indiretamente, a fazer sexo ou a casar.

ZAP //

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