Biden deve avançar com algum tipo de alívio da dívida estudantil para os 43 milhões de norte-americanos afectados, mas os Republicanos querem travar a medida e alegam que o chefe de Estado não tem legitimidade para a impor sem a aprovação do Congresso.
Depois das suas promessas eleitorais para resolver a crise causada pela dívidas estudantis na sociedade norte-americana, Biden está agora a sinalizar que pode finalmente perdoar os milhões de cidadãos que estão endividados.
“Nenhuma pessoa neste país pagou um cêntimo nos empréstimos estudantis federais desde que o Presidente assumiu o cargo”, afirmou a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, na conferência de imprensa de segunda-feira, referindo à suspensão dos pagamentos iniciada com a pandemia e que a administração prolongou este mês.
Psaki acrescentou que Biden vai decidir o que fazer sobre um eventual cancelamento das dívidas antes do fim da suspensão dos pagamentos, que está previsto para 31 de Agosto. Quase um terço dos estudantes universitários nos EUA endividaram-se para poderem continuar os estudos, com o valor médio de dívida nos 40 mil dólares.
A dívida no país ultrapassa os 1,7 mil milhões de dólares e estima-se que 10 milhões do total de 43 milhões de devedores não estejam a cumprir os pagamentos, uma situação que foi agravada pela pandemia.
Biden já se mostrou pouco convencido com a ideia de perdoar a dívida de forma total e generalizada, tendo afirmado numa entrevista no ano passado ao The New York Times que discordava da ideia.
O chefe de Estado também já tinha dito que discordava da medida, referindo que não faz sentido perdoar a dívida aos estudantes das faculdades de elite da Ivy League, como Harvard ou Yale.
A postura de Biden foi criticada já que a grande maioria dos alunos destas escolas não termina os cursos endividados, com estimativas a mostrarem que isto só acontece em 0,3% dos casos. Há também apenas oito universidades na Ivy League do total de mais de 6000 instituições de ensino superior em todo o país.
Progressistas puxam a brasa à sua sardinha
Durante a campanha eleitoral, o então candidato à Casa Branca falou num valor de 10 mil dólares, mas a ala mais progressista dos Democratas defende que Biden vá mais longe e estipule um mínimo de 50 mil dólares. No entanto, o Presidente tem resistido a esta pressão.
De acordo com uma análise do Banco de Reserva Federal de Nova Iorque, um cancelamento mínimo de 50 mil dólares traduzir-se-ia num alívio total da dívida para quase 30 milhões de americanos e 70% dos beneficiários seriam cidadãos de baixos ou médios rendimentos.
A medida custaria cerca de 904 mil milhões de dólares, um valor que parece grande, mas que os seus apoiantes comparam os orçamentos militares federais e reforçam que esta mudança teria um impacto muito mais positivo na vida dos americanos comuns, tendo o Governo as prioridades trocadas.
Em 2021, os EUA gastaram 801 mil milhões de dólares com a Defesa e a proposta orçamental de Biden para que o valor subisse 4% atraiu críticas dos progressistas. Pramila Jayapal condenou a ideia no Twitter, onde mostrou um gráfico que mostra que os EUA gastam mais dinheiro no sector militar do que os 11 países seguintes da lista juntos. “Temos de investir nas nossas comunidades“, defende.
We do not need to raise the defense budget by another $31 billion.
It’s time to make investments into our communities — not into a defense budget that is already larger than the next 11 countries combined. pic.twitter.com/2nUpMpNt6E
— Rep. Pramila Jayapal (@RepJayapal) March 28, 2022
Os defensores do cancelamento da dívida reforçam ainda que os custos abismais do ensino superior nos Estados Unidos deixaram muitas pessoas sem escolha a não ser endividarem-se se quiserem um bom emprego num mercado competitivo.
Apesar da sua hesitação inicial, o Presidente parece estar agora a reconsiderar a sua posição. Numa reunião com os membros do caucus hispânico do Congresso, Biden partilhou os seus planos para perdoar uma quantidade substancial da dívida estudantil federal, apesar do valor ainda não ser especificado.
“O Presidente nunca mencionou uma quantidade ou se ia perdoar todas as dívidas”, afirmou o representante Democrata Tony Cardenas, sublinhando que o caucus hispânico expressou o seu apoio para que o chefe de Estado use o poder executivo para aplicar a medida.
Na resposta, Biden “sorriu e disse: ‘Vocês vão gostar do que eu vou fazer, estou a pensar fazer algo sobre isso'”.
Republicanos batem o pé
Mas a ideia de que a Casa Branca pode avançar sem o aval do Congresso está longe de ser unânime. Na quarta-feira, os Republicanos introduziram uma proposta no Senado que quer travar as intenções de Biden e que quer impedir tentativas futuras de uma suspensão unilateral dos pagamentos sem a aprovação do Congresso.
“Com os americanos a regressarem ao trabalho mais de dois anos depois do início da pandemia, está na hora dos devedores voltarem a pagar as obrigações das dívidas estudantis. Os contribuintes não devem ser continuar a ser responsáveis pelos custos associados com a suspensão dos pagamentos”, lê-se num comunicado de John Thune, o número dois dos Republicanos no Senado.
O Senador Mike Braun acrescenta ainda que a medida é injusta porque a maioria da população não tem uma formação superior. “Porque é que devem ser obrigados a pagar a conta de cursos universitários em nome do alívio por causa da pandemia? Esta transferência de riqueza não vai avançar a igualdade, é sim mais um sacrifício dos contribuintes para satisfazer activistas de extrema-esquerda“, atira.
Biden de olho nas intercalares
Antecipa-se assim mais uma batalha no Congresso que pode atrasar ou anular as intenções de Biden. Depois de grande parte da sua agenda política ter sido diluída ou acabado por morrer na praia no seu primeiro ano de mandato — como no caso do Build Back Better — o chefe de Estado não parte com muitos trunfos do seu lado na antecipação das eleições intercalares de Novembro.
Uma sondagem recente do Morning Consult concluiu que a popularidade de Biden está em terreno negativo em 40 dos 50 estados norte-americanos, incluindo alguns dos estados “roxos” decisivos que lhe deram a vitória contra Donald Trump, como o Arizona, a Geórgia e a Pensilvânia.
Os únicos estados onde Biden se aguenta são os bastiões Democratas da Califórnia, Washington, Maryland, Nova Iorque, Massachusetts, Vermont, Illinois, Rhode Island, Delaware e Havai — mas até nestes a sua popularidade caiu em comparação com o mesmo período do ano passado.
Dada a relação histórica entre a popularidade do Presidente e o resultado do seu partido nas intercalares, para além da tendência típica para que este perca lugares nas eleições a meio do mandato, estes valores não são boas notícias para os Democratas.
Neste sentido, a proposta de alívio do endividamento seria uma boa forma de Biden tentar reconquistar o eleitorado, especialmente os mais jovens. Um inquérito recente da Harvard Youth Poll a americanos entre os 18 e 29 anos concluiu 85% apoia algum tipo de resposta do Governo à crise das dívidas estudantis.
E numa altura em que 58% dos cidadãos entre os 18 e 34 anos desaprovam a actuação do Presidente, de acordo com uma sondagem do instituto Gallup, a medida poderia dar um muito preciso impulso às esperanças dos Democratas de segurarem o controlo das duas câmaras do Congresso em Novembro. Resta-nos esperar para ver.