Biden avalia Estado da União com a Guerra Fria em pano de fundo

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gageskidmore / Flickr

O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden

Presidente dos Estados Unidos tem a difícil tarefa de unir à volta da NATO, e contra a Rússia, um país cansado de guerras e marcado por profundas divisões.

Na extrema-direita e no Partido Republicano, crescem os sinais de desvalorização das ameaças de Vladimir Putin, noticia o Público.

Meio século depois de ter iniciado a carreira política no pequeno estado do Delaware, aos 29 anos, Joe Biden vai ao Congresso norte-americano, na terça-feira, para fazer o primeiro discurso do Estado da União como Presidente dos Estados Unidos, no ano em que comemora o 80º aniversário.

E é nessa história de vida que poderá apoiar-se, no discurso, para dizer às gerações nascidas depois da Guerra Fria — e a um Partido Republicano cada vez menos desconfiado de Vladimir Putin — até onde está disposto a ir para enfrentar as ameaças do Governo da Rússia no Leste da Europa.

A tarefa de Biden na sua segunda comunicação ao Congresso dos EUA desde que chegou à Casa Branca (a primeira para o discurso oficial do Estado da União, ao fim de um ano de mandato) é dificultada pelo ambiente de divisão na política do país, e por um índice de popularidade muito abaixo dos 57% registados em janeiro e fevereiro de 2021.

Muito penalizado pela subida da inflação, pelas dificuldades na gestão da pandemia e ainda pelo desastre da saída do Afeganistão, no verão de 2021, Biden chega ao fim de fevereiro de 2022 com uma taxa de aprovação de 41% — dois pontos acima dos valores de Donald Trump na mesma altura do seu mandato, segundo a Gallup, e a perder apoio a um ritmo alarmante entre os independentes que se identificam com o Partido Democrata.

De um lado, uma parte do eleitorado do centro-esquerda e os progressistas cobram-lhe promessas não cumpridas, como o perdão das dívidas dos estudantes e a incapacidade do Partido Democrata para fazer aprovar, no Congresso, propostas como a reforma das leis eleitorais e um investimento histórico nas reformas sociais.

Do outro lado, o centro-direita e a ala “trumpista” do Partido Republicano parecem estar apenas à espera de 2024 para o derrotar, sejam quais forem as propostas e as decisões da Casa Branca.

Inflação no topo

Num ano de eleições para o Congresso em que o Partido Republicano se prepara para recuperar a maioria na Câmara dos Representantes, a guerra na Ucrânia não é, ainda, um assunto dominante nos EUA.

E está por demonstrar que a subida da inflação, ou até o debate sobre o fim das restrições no combate à pandemia, vão descer nas prioridades dos cidadãos norte-americanos nos próximos tempos.

Segundo um estudo do instituto Pew Research Center publicado na sexta-feira, os eleitores dizem que o fortalecimento da economia é o assunto que deve estar no topo da lista do Presidente dos EUA em 2022, seguido de uma redução dos custos com a saúde e da gestão da pandemia de covid-19.

No domingo, a porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, confirmou que Biden irá reservar uma boa parte do seu discurso à situação na Europa, mas disse que o foco principal será a situação interna: a economia e a pandemia, mas também temas como a nomeação de Ketanji Brown Jackson para o Supremo Tribunal.

“O que as pessoas também vão ouvir do Presidente é o seu otimismo e a sua crença na resiliência e na força do povo americano”, disse Psaki.

Aula de História

Alguns comentadores políticos nos EUA, como James Hohmann — um historiador e antigo jornalista do Washington Post —, defendem que Biden deve fazer do seu primeiro discurso do Estado da União, na noite de terça-feira (madrugada de quarta-feira em Portugal), uma aula de História sobre a Europa.

A geração da Guerra Fria percebe melhor o que está em jogo, mas representa uma parcela do eleitorado cada vez mais pequena”, escreveu Hohmann no domingo.

“Uma pessoa com 39 anos nasceu em 1983. Uma pessoa com 29 anos nasceu em 1993. As próximas eleições, em novembro, vão ter votos de eleitores que nasceram três anos depois dos ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001”.

A relação entre a idade dos eleitores norte-americanos e as suas opiniões sobre a crise na Europa está patente nas sondagens.

Num estudo do instituto YouGov, de 11 de fevereiro, 61% dos inquiridos dos 18 aos 29 anos disseram que os EUA devem manter-se neutrais no conflito, e 61% dos que têm mais de 65 anos disseram que o país deve apoiar a Ucrânia.

Numa outra sondagem, do Washington Post, feita entre 20 e 24 de fevereiro, apenas 35% dos inquiridos dos 18 aos 39 anos disseram que apoiam a aplicação de sanções à Rússia se isso levar ao aumento dos preços da energia nos EUA.

Na faixa etária acima dos 65 anos, 70% dizem estar dispostos a aguentar as consequências económicas das sanções.

“Os resultados mostram-nos que este momento exige mais do que uma simples reafirmação do compromisso dos EUA com o Artigo 5º da NATO”, defendeu Hohmann, sobre o discurso do Estado da União. “Isto pode parecer uma perda de tempo para Biden, porque ele sabe instintivamente o que está em jogo“.

Para o colunista do Post, um discurso de Biden sobre a importância da NATO e de apoio à Ucrânia deve estar livre de ataques a Trump, e deve fazer levantar tanto os congressistas do Partido Democrata como os do Partido Republicano.

Dessa forma, será possível “mostrar aos jovens dos 18 aos 29 anos que os EUA levam a sério as suas alianças”.

Elogios a Putin

Mas, além de uma eventual demonstração de apoio à Ucrânia, na noite de terça-feira, através de peças de vestuário com as cores da bandeira do país, é difícil imaginar que os republicanos queiram ser filmados a ovacionar Biden, seja qual for o momento no discurso do Estado da União.

Na última sexta-feira (no segundo dia da invasão russa), dois congressistas republicanos participaram numa conferência, na Florida, organizada por Nick Fuentes — um conhecido supremacista branco e admirador de Putin, cuja conta na rede social lançada por Trump na semana passada, a Truth Social, foi aceite e verificada.

A participação de Marjorie Taylor Greene e de Paul Gosar na conferência da Florida foi duramente criticada pelos republicanos Mitt Romney e Liz Cheney, mas a congressista do estado da Georgia seria recebida de forma calorosa, no sábado, na importante conferência anual CPAC, onde se reúnem as principais figuras do Partido Republicano.

Um dia depois, no domingo, Trump reafirmou os seus elogios ao Presidente russo, ao mesmo tempo que atacou o atual Presidente norte-americano.

“O problema não é Putin ser esperto — é claro que ele é esperto — o problema é que os nossos líderes são burros“, disse o ex-Presidente dos EUA.

ZAP //

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