As origens dos buracos negros binários podem ser “fabricadas”

NASA Goddard

Simulação da luz emitida por um sistema binário supermassivo de buracos negros onde o gás circundante é oticamente fino (transparente).

O modo como um buraco negro gira fornece pistas da sua origem. Isto é especialmente verdade para os binários, em que dois buracos negros se orbitam um ao outro antes de se fundirem.

A rotação e a inclinação dos respetivos buracos negros, imediatamente antes da fusão, pode revelar se os gigantes invisíveis surgiram de um disco galáctico calmo ou de um enxame mais dinâmico de estrelas.

Os astrónomos esperam determinar qual destas histórias de origem é a mais provável através da análise dos 69 binários confirmados detetados até à data.

Mas um novo estudo conclui que, por agora, o catálogo atual de binários não é suficiente para revelar nada de fundamental acerca da formação dos buracos negros.

No estudo, publicado na revista Astronomy and Astrophysics, físicos do MIT mostram que quando todos os binários conhecidos e as suas rotações são colocadas em modelos de formação de buracos negros, as conclusões podem parecer muito diferentes, dependendo do modelo em particular utilizado para interpretar os dados.

As origens de um buraco negro podem, portanto, ser “fabricadas” de diferentes maneiras, dependendo das suposições do modelo sobre a forma como o Universo funciona.

“Quando se muda o modelo e se torna mais flexível ou se fazem pressupostos diferentes, obtém-se uma resposta diferente sobre como os buracos negros se formaram no Universo”, diz a coautora Sylvia Biscoveanu, estudante no MIT que trabalha no Laboratório LIGO.

“Mostramos que os cientistas precisam de ter cuidado porque ainda não estamos na fase em que os nossos dados nos permitem acreditar no que o modelo nos diz”.

Os coautores do estudo incluem Colm Talbot, pós-doc do MIT, e Salvatore Vitale, professor associado de física e membro do Instituto Kavli de Astrofísica e Investigação Espacial no MIT.

Um conto de duas origens

Pensa-se que os buracos negros nos sistemas binários surgem por uma de duas vias.

A primeira é através de “evolução binária de campo“, em que duas estrelas evoluem juntas e eventualmente explodem como supernovas, deixando para trás dois buracos negros que continuam a orbitar num sistema binário.

Neste cenário, os buracos negros devem ter rotações relativamente alinhadas, pois teriam tido tempo – primeiro como estrelas, depois como buracos negros – de se puxar um ao outro para orientações semelhantes.

Se os buracos negros de um binário tiverem aproximadamente a mesma rotação, os cientistas pensam que devem ter evoluído num ambiente relativamente calmo, tal como um disco galáctico.

Os buracos negros binários também se podem formar através de “montagem dinâmica“, onde dois buracos negros evoluem separadamente, cada um com a sua própria inclinação e rotação.

Devido a determinados processos astrofísicos, os buracos negros eventualmente encontram-se e aproximam-se o suficiente para formar um sistema binário.

Um tal emparelhamento dinâmico ocorreria provavelmente não num disco galáctico calmo, mas num ambiente mais denso, como um enxame globular, onde a interação de milhares de estrelas pode fazer com que dois buracos negros se juntem.

Se os buracos negros de um binário tiverem rotações orientadas aleatoriamente, é provável que se tenham formado num enxame globular.

Mas que fração de binários se formam através de uma via vs. a outra? A resposta, pensam os astrónomos, deve residir nos dados e, particularmente, nas medições das rotações dos buracos negros.

Até à data, os astrónomos derivaram as rotações de buracos negros em 69 binários, que foram descobertos por uma rede de detetores de ondas gravitacionais incluindo o LIGO nos EUA e o seu homólogo italiano Virgo.

Cada detetor “ouve” sinais de ondas gravitacionais – reverberações muito subtis através do espaço-tempo, remanescentes de eventos astrofísicos extremos tais como a fusão de buracos negros massivos.

Com cada deteção binária, os astrónomos estimaram as propriedades dos respetivos buracos negros, incluindo a sua massa e rotação.

Trabalharam as medições da rotação num modelo geralmente aceite da formação de buracos negros e encontraram sinais de que os binários poderiam ter tanto uma rotação preferida e alinhada como rotações aleatórias. Ou seja, o Universo pode produzir binários tanto em discos galácticos como em enxames globulares.

“Mas nós queríamos saber se temos dados suficientes para fazer esta distinção”, diz Biscoveanu. “E acontece que as coisas são confusas e incertas e é mais difícil do que parece”.

Percebendo os dados

No seu novo estudo, a equipa do MIT testou se os mesmos dados produziriam as mesmas conclusões quando trabalhados em modelos teóricos ligeiramente diferentes de como os buracos negros se formam.

A equipa primeiro reproduziu as medições de rotação do LIGO num modelo amplamente utilizado da formação de buracos negros.

Este modelo assume que uma fração de binários no Universo prefere produzir buracos negros com rotações alinhadas, onde o resto dos binários têm rotações aleatórias.

Descobriram que os dados pareciam concordar com as suposições deste modelo e mostraram um pico onde o modelo previa que deveriam existir mais buracos negros com rotações semelhantes.

Depois ajustaram ligeiramente o modelo, alterando os seus pressupostos de modo a prever uma orientação ligeiramente diferente das rotações preferidas dos buracos negros.

Quando trabalharam os mesmos dados neste modelo ajustado, descobriram que os dados se deslocaram para estarem alinhados com as novas previsões. Os dados também fizeram deslocações semelhantes em outros 10 modelos, cada um com uma suposição diferente de como os buracos negros preferem girar.

“O nosso trabalho mostra que o resultado depende inteiramente de como modelamos a astrofísica, em vez dos dados propriamente ditos”, diz Biscoveanu.

Precisamos de mais dados do que pensávamos, se quisermos fazer uma afirmação que é independente das suposições astrofísicas que fazemos”, acrescenta Vitale.

De quantos mais dados necessitam os astrónomos? Vitale estima que assim que a rede LIGO volte a funcionar, no início de 2023, os instrumentos vão detetar um novo buraco negro duplo a cada poucos dias. Durante o próximo ano, poderemos ter centenas de novas medições a acrescentar aos dados.

“As medições das rotações que temos agora são muito incertas”, diz Vitale. “Mas à medida que acumulamos muitas mais, podemos obter melhor informação. Então podemos dizer, independentemente do detalhe do meu modelo, que os dados contam sempre a mesma história – em que podemos então acreditar”.

// CCVAlg

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