Em Angola, já há filas para pedir o visto para Portugal (é o “medo” das eleições mais renhidas em 30 anos)

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David Stanley / wikimedia

Assembleia Nacional de Angola, em Luanda

Angola vive as eleições mais “renhidas” dos últimos 30 anos, com MPLA e UNITA a disputarem o poder taco a taco. E, numa altura de tanta incerteza, os receios de um conflito depois do sufrágio de 24 de Agosto já estão a criar filas de pessoas em busca do visto para Portugal.

Angola vai a eleições gerais nesta quarta-feira, 24 de Agosto. Mas o que “preocupa é o que vai acontecer no dia a seguir às eleições“, como confessa à Rádio Observador o director da Rádio Essencial de Angola, Emídio Fernando.

Perante o risco de conflito nos dias a seguir às eleições, Emídio Fernando nota que “ou as autoridades vão impor respeito à força ou vamos ter uma agitação muito grande até saírem os resultados oficiais”.

Entretanto, com esse medo no horizonte, já há “filas de pessoas no Consulado português a pedir o visto para vir para Portugal”, bem como para outros países, designadamente Espanha e Brasil, aponta ainda o jornalista.

Também o director do semanário angolano Novo Jornal, Armindo Laureano, reporta à Rádio Observador a sua preocupação.

“No seio da UNITA, têm a percepção de que nunca esteve tão perto de ser poder e no seio do MPLA, há sectores que têm essa percepção de que nunca o MPLA esteve tão perte de perder poder“, aponta Armindo Laureano, concluindo que são “cenários que, de um lado e do outro, criam medo“.

Estamos numa realidade de enorme “agitação política” com uma “disputa renhida” como não se viu nos últimos 30 anos entre MPLA e UNITA, como atesta Emídio Fernando, frisando que esta bipolarização não vai permitir que outros partidos cresçam.

UNITA apela às forças de segurança e cita exemplo de Cabo Verde

O líder da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) já apelou aos eleitores que sigam o exemplo de Cabo Verde, onde existe “alternância democrática” e “uma verdadeira democracia”.

No comício de encerramento da campanha eleitoral, Adalberto da Costa Júnior pediu às forças de segurança e de defesa para se manterem equidistantes, prometeu combater a corrupção e criticou a falta de transparência e independência do processo eleitoral, em favor do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

Perante a presença do ex-presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, na qualidade de líder da missão de observadores da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), Adalberto Costa Júnior saudou-o e elogiou a democracia cabo-verdiana.

“Nada melhor que o exemplo de Cabo Verde para nos inspirar no que queremos” para Angola, frisou o líder da UNITA certo de que, nestas eleições, vai conseguir “acabar com o partido único no poder”.

Dirigindo-se aos membros do MPLA, Costa Júnior aconselhou-os a não terem “medo da alternância”. “Não há democracia sem a alternância do poder”, vincou, salientando que “a continuidade do partido único do poder corresponde ao adiamento do desenvolvimento de Angola”.

Mortos nas listas eleitorais preocupam

Sobre o processo eleitoral, Costa Júnior recordou que “entrou mais um processo no Tribunal Constitucional e outra chamada de atenção à CNE [Comissão Nacional Eleitoral]” para “apelar ao respeito à lei”.

Em causa está a ausência de uma auditoria, a não publicação dos cadernos eleitorais e a retirada dos mortos das listas de eleitores, entre outras questões elencadas.

“Fizemos todas as pressões”, mas “nada foi feito” e segundo a UNITA, permanecem 2,5 milhões de mortos numa lista de 14 milhões de eleitores, um número que poderá ser decisivo caso sejam descarregados como votantes noutro partido.

No país, vários dirigentes apelam ao movimento “Votou, sentou”, em que os eleitores são desafiados a ficar junto às assembleias para vigiar a contagem até ao momento da publicação das actas de cada assembleia.

Deputado europeu alerta para fraude eleitoral

O deputado italiano Fulvio Martusciello apelou aos responsáveis europeus que condenem “firmemente” potenciais tentativas de fraude nas eleições angolanas e pediu informações sobre uma eventual suspensão da Internet no país.

A carta do eurodeputado da Forza Itália (que integra o grupo de centro-direita do Partido Popular Europeu), a que a Lusa teve acesso, é dirigida ao Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e vice-presidente da Comissão Europeia, Josep Borrell.

Martusciello defendeu que a União Europeia (UE) tem o dever de apoiar a realização de eleições justas e transparentes em Angola, classificando a situação política do país como “crítica”.

O deputado italiano notou ainda que os direitos políticos e liberdades civis “se deterioraram nos últimos meses numa clara tentativa de controlar os eleitores antes das eleições gerais”.

Explicações sobre suspensão da Internet

Martusciello pediu também uma explicação oficial às autoridades angolanas sobre a decisão de suspenderem serviços de Internet no país, antes, durante e depois das eleições, “congelando” a principal rede de comunicações.

Segundo o político, a decisão da Unitel de “congelar” os serviços de Internet em todo o país, que tem início em 22 e termina a 28 de Agosto, causou estranheza em sectores da sociedade angolana.

A Unitel já veio notar que o congelamento da rede é um procedimento normal, aplicado em período de grande tráfego para manter a estabilidade de infraestruturas em ambientes considerados complexos, e que precisam de alta disponibilidade, especialmente em período crítico, de aumento exponencial da procura por parte do Estado e outras instituições, das famílias e das empresas.

A decisão mereceu resposta por parte da filha do ex-presidente José Eduardo dos Santos e fundadora da Unitel, Isabel dos Santos, que perdeu o controlo da empresa e deixou a administração no âmbito dos processos judiciais que enfrenta em Angola. “Nunca ouvi falar em congelar a rede de Internet, deve ser algo novo”, ironizou a empresário.

“O facto é que o método de ‘congelamento’ da Internet tem sido uma realidade em vários países não democráticos do continente africano com o único objectivo de impedir que os eleitores compartilhem os resultados eleitorais das actas sumárias que devem ser afixadas no mural das assembleias de voto, após o encerramento das urnas”, alertou o eurodeputado italiano.

“É apenas com base nestes dados que os partidos políticos podem fazer comparações entre os resultados das assembleias de voto e os resultados divulgados pela CNE”, acrescentou, pedindo uma reacção oficial com urgência.

ZAP // Lusa

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