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África tem todos os problemas ambientais do mundo, só que mais graves

África tem todos os problemas ambientais que existem no resto do mundo, só que mais graves devido ao estado de desenvolvimento económico e a vários regimes políticos, defendeu um responsável da associação ambiental Quercus.

Numa entrevista à agência Lusa, João Branco, presidente da Direção Nacional da Quercus, instituição que estará presente na reunião de Nova Iorque consagrada ao Ambiente, que começa sexta-feira nas Nações Unidas, lamentou que, no continente africano, nenhum setor ambiental está de boa saúde.

“O continente africano tem todos os problemas ambientais que existem no resto do mundo, mas são mais graves ainda do que a média por uma série de contingências que têm a ver com o estado de desenvolvimento económico e com os regimes políticos. Não há nenhum setor ambiental que esteja bem em África, infelizmente”, disse.

Os setores são muitos e estão diretamente ligados às alterações climáticas, à ação do homem e a interesses políticos e económicos, salientou, lembrando também a “vulnerabilidade” de alguns Estados africanos.

A falta de água potável, aumento do nível das águas do mar, que está a acidificar e a contaminar os lençóis freáticos em terra, o lixo e os resíduos sólidos, as queimadas, a desflorestação, a desertificação, as secas, as inundações, a perda da biodiversidade e o ordenamento do território são alguns dos problemas apontados por João Branco.

Nesse sentido, defendeu a aposta nas energias renováveis, maior sensibilidade dos regimes políticos para as questões ambientais, campanhas de sensibilização junto das populações e a educação para o ambiente nos ensinos básico e secundário.

Ajuda do Papa e da sociedade civil

O Governo defende que a cimeira da ONU sobre desenvolvimento sustentável em Nova Iorque, preparatória da Cimeira de Paris, prevista para o final do ano, pode contribuir para um acordo climático, posição justificada com sinais como o empenho do papa Francisco e de alguns dirigentes mundiais.

“O consenso que se tem gerado à volta dos 17 objetivos estabelecidos” para o desenvolvimento sustentável, “boa parte” dos quais têm relação direta com a questão ambiental, “é um bom prenúncio”, disse à agência Lusa o secretário de Estado do Ambiente, Paulo Lemos.

Para o governante, que vai estar na Cimeira das Nações Unidas, em Nova Iorque, a partir de sexta-feira, é importante que haja uma vontade a nível mundial de resolver o problema da pobreza e da desigualdade, mas também as grandes questões ambientais, as alterações climáticas, a gestão dos recursos hídricos a qualidade de vida dos cidadãos e dos ecossistemas.

“É muito positivo e um sinal que cria uma dinâmica muito positiva para a conferência de novembro”, sobre alterações climáticas, em Paris, referiu Paulo Lemos, expressando o desejo de que “se crie boa vontade e espírito de colaboração que permita que haja um acordo”.

Paulo Lemos realça o empenhamento do secretário geral das Nações Unidas, do papa Francisco, dos dirigentes mundiais, da União Europeia, dos EUA, e da China sobre o desenvolvimento sustentável e alterações climáticas, assim como as manifestações da sociedade civil agendadas para várias cidades em todo o mundo.

Longo caminho até Cimeira de Paris

Questionado pela Lusa sobre o que espera da reunião de Nova Iorque, o responsável da Quercus disse ser “muito importante” que os poderes político e económico interiorizem e financiem os problemas há muito identificados por investigadores e pelas ONG.

“É muito importante que os objetivos sejam definidos, que se identifiquem os problemas e as metas. Mas não espero mais do que isso. A grande questão é saber quem vai pagar todo esse processo de desenvolvimento sustentável. Não me parece que os países que podem pagar, os ricos, tenham disponibilidade para o fazer”, lamentou.

“O conjunto das nações tem de admitir publicamente e de forma coletiva que há problemas. Isto é só o primeiro passo, pois está tudo por fazer. Mas é um primeiro passo e nós congratulamo-nos”, acrescentou.

Para João Branco, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS, que abrangem 169 metas e que sucedem aos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milénio – ODM, 2000/15) têm de contar com vontade política de todos os países e com recursos para os financiar, “a grande questão, afinal”.

“Nos ODS há a erradicação da pobreza. Se alguns Estados europeus não conseguiram resolver este problema como se pode esperar que o consigam em África? Se não se consegue erradicar a pobreza em Portugal como se vai conseguir fazê-lo em Moçambique? Se não se consegue proteger a natureza e a biodiversidade nos países desenvolvidos, como se vai fazê-lo nos países em desenvolvimento?”, questionou.

As energias renováveis no continente africano podem ser uma solução, mas desde que sejam planeadas, “o que não acontece”, sublinhou, dando como exemplo o caso mais flagrante, o das barragens, que se constroem sem estudos de impacto ambiental e sem consultas públicas prévias.

“Em África nada disso se faz. Constroem-se barragens em África de forma totalmente desordenada, sem qualquer estudo de impacto ambiental, afetando até parques nacionais”, referiu, exemplificando com os casos de Kapanga (na bacia do rio Cuanza, Angola) e de Crocodile River (que atravessa o Kruger Park, África do Sul).

A conservação da natureza não tem qualquer peso nem influência nas construções“, criticou, estendendo as críticas à questão da gestão dos resíduos sólidos, sobretudo nas grandes cidades africanas, em que são milhões as garrafas de plástico e de latas, não biodegradáveis, que as inundam, pois não há recolha de lixo, alertou.

“O lixo não tem tratamento, não é reciclado e nem sequer é colocado em aterros sanitários, que também não há. E também não há esgotos”, concluiu, retomando a ideia de que a questão do ambiente no continente africano “não tem solução no curto prazo”.

/Lusa

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