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Sem acesso ao aborto legal, venezuelanas arriscam a vida ao comprar medicamentos online

Jonathan Silverberg / Flickr

A Venezuela tem umas das políticas de aborto mais restritivas da América Latina, e isso está a fazer com que milhares de mulheres optem por meios menos seguros para interromper a gravidez.

Num país onde os apoios do estado são muito fracos, abortar pode parecer uma missão impossível. As mulheres que o querem fazer de forma legal não conseguem dentro de território nacional, por isso procuram outras opções. Um dos métodos a que mais recorrem está bem perto, mas longe de ser o ideal.

Plataformas como o Facebook Market e MercadoLibre – o principal meio de negócio de comércio eletrónico na América Latina – estão inundadas com milhares de indivíduos informais que vendem pílulas anticoncecionais e misoprostol – droga usada para abortos medicamentosos. Os produtos também são divulgados em redes sociais como o Instagram e Twitter.

Segundo o The Guardian, as redes sociais são o espaço perfeito para os golpistas que fingem ser médicos, enfermeiros ou farmacêuticos e que lucram com o desespero e a falta de informação de milhares de mulheres.

Um exemplo do desespero é Sofia. Com apenas 20 anos, também tentou abortar através de medicamentos comprados na internet. Conta que pagou 200 dólares por seis comprimidos, mas eram falsos. A venezuelana, que foi abandonada pelo namorado e pela família, referiu que não tinha dinheiro para comprar mais comprimidos.

Depois de pedir dinheiro emprestado, Sofia encontrou outro vendedor: Alberto, cujo perfil estava em alta há mais de dois anos e contava com ótimas críticas. O vendedor avisou-a que poderia ir presa por ingerir aquela medicação, mas esta foi a única solução que Sofia encontrou.

“Está a acontecer há pelo menos três ou quatro anos”

Na Venezuela, o aborto é ilegal em quase todas as circunstâncias. A lei de 1926 que proíbe o procedimento foi modificada apenas uma vez, com uma reestrutura em 2006 que permite o aborto se a vida da mulher estiver em perigo.

As duras regras colocaram o país no extremo oposto de outros países latino-americanos, como a Argentina, onde o aborto até a 14ª semana de gravidez foi recentemente legalizado.

Uma vez que que vender medicamentos online sem autorização é ilegal, os vendedores encontraram maneiras de permanecer na sombra: usam palavras-código relacionadas com carros.

“Isso está a acontecer há pelo menos três ou quatro anos”, disse um membro de uma ONG venezuelana que pediu para não ser identificado. “A maioria dos vendedores são traficantes de droga ou profissionais de saúde que os trazem os medicamentos de hospitais”.

As autoridades usam a ameaça de condenação criminal para desencorajar as mulheres  a interromper a gravidez, mas até o ano passado havia poucos processos conhecidos.

Isso mudou em outubro, quando uma ativista no estado de Mérida foi presa e processada por ajudar uma vítima de violação menor a fazer um aborto. Vannesa Rosales foi detida por mais de três meses. O seu advogado afirma que provavelmente será acusada de induzir um aborto e conspirar para cometer um crime.

A mãe da menina também foi detida, embora mais tarde tenha sido libertada. Já o suposto violador foi identificado, mas ainda está em liberdade.

Desde a prisão de Vanessa Rosales, várias organizações pararam de prestar auxílio nesta área. Outras organizações feministas, cujo trabalho não está relacionado com os direitos reprodutivos, também receberam ameaças.

Esta situação está a deixar a população do país sem recursos de informação sobre como proceder com segurança ou onde conseguir os comprimidos certos para abortar, sendo que os métodos ilegais enfrentam assim uma tendência crescente.

Ana Isabel Moura, ZAP //

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