James Vary tem estado à espera de experiências de física nuclear para confirmar a realidade de um “tetraneutrão” que previu e anunciou pela primeira vez durante uma apresentação em 2014.
“Sempre que apresentamos uma teoria, temos de dizer que estamos à espera de uma confirmação experimental”, sublinhou James Vary, professor de física e astronomia da Universidade Estatal de Iowa.
No caso de quatro neutrões, unidos por instantes num estado quântico temporário ou de ressonância, esse dia finalmente chegou para Vary e uma equipa internacional de teóricos, de acordo com a Phys Org.
A recém descoberta experimental de um tetraneutrão por um grupo de investigadores, liderado por cientistas da Universidade Técnica Alemã de Darmstadt, abre portas a novos estudos e irá permitir uma melhor compreensão do universo.
Este novo e exótico estado da matéria pode também ter propriedades úteis em tecnologias existentes ou emergentes.
Os neutrões são partículas subatómicas sem carga, que se combinam com protões com carga positiva para formar o núcleo de um átomo.
Os neutrões individuais não são estáveis e, após alguns minutos, convertem-se em protões. Combinações de neutrões duplos e triplos também não formam o que os físicos chamam uma ressonância, um estado da matéria que é temporariamente estável antes de se decompor.
Agora chegou o tetraneutrão. Com o supercomputador do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley na Califórnia, os teóricos calcularam que quatro neutrões poderiam formar um estado ressonante, com uma vida útil de apenas 3×10-22 segundos, menos de um bilionésimo de um bilionésimo de segundo.
É difícil de acreditar, mas isso é tempo suficiente para os físicos o estudarem.
Os cálculos dos teóricos afirmam que o tetraneutrão deve ter uma energia de cerca de 0,8 milhões de eletrões-volts — uma unidade de medida comum em alta energia e física nuclear. A luz visível tem energias de cerca de 2 a 3 eletrões-volts.
Os cálculos também dizem que a largura do pico de energia de um tetraneutrão seria de cerca de 1,4 milhões de eletrões-volts.
Os teóricos publicaram estudos que explicavam que a energia se situaria provavelmente entre 0,7 e 1,0 milhões de eletrões-volts, enquanto a largura estaria entre 1,1 e 1,7 milhões de eletrões-volts. Esta sensibilidade surgiu da adoção de diferentes candidatos disponíveis para a interação entre os neutrões.
Um novo estudo, publicado na Nature a 22 de junho, relata que experiências na Fábrica de Feixes de Isótopos Radioativos no instituto de investigação RIKEN em Wako, no Japão, encontraram energia e largura de tetraneutrões em cerca de 2,4 e 1,8 milhões de eletrões-volts, respetivamente.
Ambos são maiores que os resultados teóricos, mas Vary afirma que as incertezas nos resultados teóricos e experimentais atuais podem cobrir estas diferenças.
“Um tetraneutrão tem uma vida tão curta, que é um choque bastante grande para o mundo da física nuclear o facto de as suas propriedades poderem ser medidas antes de se desfazer”, indica Vary. “É um sistema muito exótico”.
É, de facto, “um estado totalmente novo da matéria“, acrescentou. “É de curta duração, mas aponta para possibilidades. O que acontece se juntarmos dois ou três destes? Conseguiria obter mais estabilidade?”.
As experiências na tentativa de encontrar um tetraneutrão começaram em 2002, quando a estrutura foi proposta em certas reações com um dos elementos — um metal chamado berílio. Uma equipa da RIKEN encontrou indícios de um tetraneutrão nos resultados experimentais, publicados em 2016.
“O tetraneutrão juntar-se-á ao neutrão como apenas o segundo elemento sem carga da carta nuclear”, escreveu Vary num resumo do projeto. Isso “proporciona uma nova e valiosa plataforma para teorias sobre as fortes interações entre os neutrões“.
“Podemos criar uma pequena estrela de neutrões na Terra?”, questiona Vary. Uma estrela de neutrões é o que resta quando uma estrela maciça fica sem combustível e colapsa numa estrutura de neutrões super-densa. O tetraneutrão é também uma estrutura de neutrões “de curta duração e muito leve”.
“Eu tinha praticamente desistido das experiências”, nota Vary. “Eu não tinha ouvido nada sobre isto durante a pandemia. Isto foi um grande choque para mim. Meu Deus, aqui estamos nós, talvez tenhamos realmente algo de novo“, conclui.
Um neutrão transforma-se num protão mas liberta um electrão. Quando isso ocorre no núcleo de um átomo o electrão é uma partícula beta (radiação beta) e o núcleo transforma-se no núcleo do elemento seguinte da tabela periódica porque fica com mais um protão.