À esquerda, ataques dos novos e velhos inimigos, carpideiras, mil euros, e a mais bela revolução

José Sena Goulão / Lusa

O líder do PS, Pedro Nuno Santos, discursa nas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril

Os ataques dos novos e velhos inimigos, as carpideiras e o capitalismo, a hora de uma nova música, abril não é mil euros e a mais bela revolução. Os 50 anos do 25 de abril, vistos à esquerda.

No discurso da sessão solene dos 50 anos do 25 de Abril no parlamento, o seu primeiro na qualidade líder do PS, Pedro Nuno Santos enalteceu o movimento de capitães que “pôs fim à mais antiga ditadura da Europa Ocidental” quando Portugal “era um país de cidadãos de segunda e onde as mulheres eram cidadãs de terceira”.

“As portas que Abril abriu transformaram um Estado repressivo num Estado de direito democrático e social. É verdade que a concretização dos sonhos de abril é um trabalho imperfeito e ainda inacabado, mas os portugueses venceram”, defendeu Pedro Nuno, de cravo vermelho na lapela.

Sublinhando que a revolução “é mais do que história e mais do que memória“, porque “Abril é vitória”, o líder do PS avisou que “os avanços sociais e culturais geram muitas vezes reações de incompreensão e até de rejeição”.

O secretário-geral socialista comprometeu-se com a defesa da democracia política, social e cultural “dos ataques dos novos e velhos inimigos“, considerando que Abril é uma vitória dos portugueses cujos problemas “não se resolvem com o populismo”.

“O PS aqui estará para defender a democracia política e a democracia social e cultural dos ataques dos seus novos e velhos inimigos. Foi uma e outra que Abril construiu. Uma e outra estão sob ataque e uma e outra terão a nossa proteção”, prometeu.

Segundo o líder socialista, “os desafios e os problemas que muitas famílias enfrentam não se resolvem com o populismo” que é “uma política que explora os nossos sentimentos mais negativos, uma política dura com os fracos porque lhe falta a coragem para ser dura com os fortes”, um momento que lhe valeu uma das várias salvas de palmas que recebeu de toda a esquerda.

Segundo Pedro Nuno Santos, “nos últimos 50 anos os portugueses conquistaram o direito a viverem com liberdade, a amarem quem quiserem e a constituir a família que desejam” e “conquistaram o direito a serem felizes, sem ter de se esconder ou sentir vergonha de como são e se sentem”.

Abril não proíbe nenhuma família, Abril é liberdade e alegria e as mulheres, nas últimas décadas, emanciparam-se e libertaram-se e passaram a não ter de pedir licença para procurarem a sua felicidade”, defendeu.

“Mas já não há recuo possível: as mulheres em Portugal já conquistaram o direito a perseguir os seus sonhos”, disse Pedro Nuno Santos, que concluiu com as palavras de Capicua: “eles têm medo que nós não tenhamos medo“.

A mais bela revolução

Rui Tavares lembrou o 25 de Abril de 1974 como “a mais bela revolução do século XX”, data que considerou única, apelando a um país “cheio de desejos de objeto político” contra os inimigos da revolução.

“A razão pela qual o 25 de Abril deu a volta ao mundo é porque foi a mais bela revolução do século XX, e é nossa”, considerou o porta-voz do Livre.

Numa intervenção fortemente aplaudida pela bancada do Livre mas também do PS, Rui Tavares afirmou que houve vários marcos importantes após o 25 de Abril, mas salientou que são incomparáveis “com o dia que os criou”.

Tavares alertou que quem “deseja o poder” quer sempre “estar nas bocas do mundo” e para isso, “a melhor maneira é menosprezar ou profanar o 25 de Abril”.

“Por isso, peco-vos, não lhes demos esse prazer”, apelou, defendendo que “é enchendo o país de objetos de desejo político” que o país poderá continuar a “sonhar abril”.

As carpideiras e o capitalismo

A coordenadora do BE, Mariana Mortágua, criticou hoje as “carpideiras do salazarismo”, avisando que “os saudosistas são perigosos porque vivem para a mentira” e pedindo um “manifesto pelo futuro” com alertas sobre o capitalismo.

“Dizem-nos agora alguns, saídos do armário ao fim de 50 anos, que a revolução foi supérflua e um exagero, que afinal a chibata sempre educa, a masmorra moraliza e o lápis azul ilustra”, disse Mortágua.

As carpideiras do salazarismo não são perigosas pela nostalgia desse passado: não será reconstruído nenhum império, o Tarrafal fechou para sempre e o Aljube e Peniche são agora museus que devem ser visitados“, defendeu Mariana Mortágua.

A deputada do Bloco de Esquerda avisou que “os saudosistas são perigosos porque culpam a democracia e a Constituição pela pobreza que persistiu, pelo amargo das promessas não cumpridas e pela corrupção que grassa nas privatizações, nas portas giratórias, no financiamento dos próprios partidos da oligarquia”, alertando que “vivem para a mentira”.

O nosso país só foi salvo pela revolução do 25 de Abril”, salientou, recusando que este dia seja “uma consolação para um tempo encerrado”.

“O que trago aqui, em nome do Bloco de Esquerda, num abraço com todas e todos os democratas, é um alerta sobre o presente para um manifesto pelo futuro. O que nos assombra chama-se capitalismo”, considerou.

Para a coordenadora do BE, o capitalismo “é o poder que transforma tecnologias em ameaças, que sacrifica imigrantes para beneficiar os que exploram a sua ilegalização, que destrói o planeta de amanhã em nome dos dividendos de hoje”.

É o capitalismo que faz da casa um ativo financeiro e um lugar inatingível, que ataca a democracia com discursos de ódio, que chama mérito à injustiça social, que nos impõe a caricatura individualista de nós mesmos e nos reduz à condição de consumidor ou de contribuinte para assim nos proibir de imaginar o futuro coletivo, porque esse ao mercado pertence”, enumerou.

Hora de uma nova música

Inês de Sousa Real defendeu que a “música da liberdade” que tocou há 50 anos inspirou o país a lutar “por melhores condições de vida, pelos direitos humanos e justiça social” e deixou um legado “que hoje assume nova dimensão perante os grandes desafios” contemporâneos, como as guerras, as alterações climáticas ou “a ascensão de forças políticas que põem em causa direitos humanos”.

“À medida que ouvimos a música que hoje toca, somos confrontados com uma realidade que nos preocupa profundamente, que se espalhou pela Europa e que hoje se espalha por Portugal. Casa a casa, rua a rua”, destacou.

A porta-voz do PAN frisou que “os direitos conquistados aos poucos, e subtilmente, estão a ser postos em causa, não apenas os direitos das mulheres, dos mais vulneráveis, mas também os direitos dos animais e o respeito pela natureza”.

“A revolução da empatia exige que nos ergamos em defesa desses direitos, que nos tornemos capitãs e capitães, defensores da liberdade e da dignidade de todos os seres vivos”, sustentou.

Para Inês de Sousa Real, “é também chegada a hora de uma nova música, desejada por tantas e tantos, uma música que leve Abril à natureza”, que leve “em direção a um futuro promissor para todas e todos, a uma revolução que trave o declínio da biodiversidade, que promova a abolição de atividades cruéis para com os animais e o direito a viverem em liberdade no seu habitat natural”.

“É hora de sintonizar uma nova música da liberdade, de nos erguermos contra aqueles que procuram silenciar a voz de Abril”, afirmou.

Abril não é mil euros

O secretário-geral do PCP criticou a minoria “que tudo fez e faz para destruir conquistas e recuperar o poder perdido“, procurando “falsificar e reescrever a história”, e pediu que se retome “a esperança em Abril”.

Paulo Raimundo salientou que, há 50 anos, a Revolução dos Cravos “consagrou liberdades concretas e abriu portas à democracia política, social, económica e cultural”.

“Consagrou direitos políticos, sociais, laborais e civilizacionais, redistribuiu a riqueza de forma mais justa, impôs a justiça social, a igualdade, a terra a quem a trabalha, libertou o país do domínio monopolista, construiu o poder local e a autonomia regional, consagrou na lei a igualdade entre homens e mulheres e pôs fim a guerra colonial”, afirmou.

Para Paulo Raimundo, “Abril não é a maioria dos jovens ganharem mil euros de salário por mês”, é “a juventude ter condições de viver, trabalhar e fazer a sua vida no seu próprio país”.

Abril é SNS e garantir, a partir dele, acesso a todos à saúde. É o direito à escola pública e aos mais elevados níveis de ensino para todos. É o direito à habitação, não à proteção da banca e dos especuladores”, frisou.

Abril, prosseguiu, “é contra todo o tipo de discriminações” e “rejeita o ódio, o racismo e a xenofobia”, além de ter libertado “o país do fascismo e desse regime de corrupção organizada e silenciada”.

Abril é o caminho que é necessário retomar, pondo fim ao ciclo da política de direita que tem conduzido o país a crescentes desigualdades. Este é o grande desafio que está colocado aos democratas e patriotas, aos trabalhadores e ao povo, a todos os que cá vivem e trabalham”, afirmou.

ZAP // Lusa

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