Marcello Casal Jr. / ABr
O estranho fenómeno, que acontece numa vila no sul da República Dominicana, transforma as raparigas em rapazes durante a puberdade.
Chamados de “guevedoces”, o que se traduz por “pénis aos doze”, estes são casos de jovens que sofrem de uma anomalia genética bastante rara, pode ler-se na BBC.
Provenientes de uma vila, no sul da República Dominicana, estas crianças nascem como raparigas e aparentam ter um sistema reprodutor feminino mas, assim que atingem a puberdade, desenvolvem um pénis e testículos.
Johnny, que antes era conhecido como Felicita, é um desses estranhos casos que, quando oficialmente se tornou um rapaz, sofreu bastante com a mudança.
“Nunca gostei de me vestir como uma menina e, quando me davam brinquedos para rapariga, eu nem brincava. Quando via um grupo de meninos, ia jogar à bola com eles.”, recorda.
Na escola, já depois da mudança, as outras crianças chegaram a insultá-lo e a dizer que Johnny “era o diabo”.
Já Carla, com apenas sete anos, está prestes a tornar-se Carlos porque a mãe quer antecipar a mudança.
“Os músculos e o peitoral dela começaram a crescer. Percebe-se que vai ser um menino. Eu amo-a e não importa como ela é. Menina ou menino, não existe diferença”, diz a mãe.
Uma das primeiras pessoas a estudar esta condição foi Julianne Imperato-McGinley, do Cornell Medical College, em Nova Iorque.
Nos anos setenta, a investigadora partiu para a vila, na qual fez diversas pesquisas com vários “guevedoces”, incluindo biópsias dolorosas, para tentar perceber a causa deste mistério.
A explicação do mistério
Quando um ser humano é concebido, normalmente possui um par de cromossomas X se for menina ou um par de cromossomas XY se for menino.
Cerca de oito semanas após a conceção, as hormonas sexuais começam a aparecer. Se for do sexo masculino, o cromossoma Y indica o desenvolvimento de testículos e envia testosterona para uma estrutura chamada tubérculo, no qual é convertida numa hormona mais potente chamada dihidrotestosterona. É esta substância que transforma o tubérculo num pénis. Se for do sexo feminino, e como não se produz dihidrotestosterona, o tubérculo torna-se um clitóris.
Neste estranho caso, Imperato-McGinley descobriu que o problema se deve à deficiência de uma enzima chamada 5-alfarredutase que, normalmente, converte a testosterona em dihidrotestosterona.
Desta forma, os meninos, apesar de terem cromossomas XY, parecem meninas quando nascem. Quando chegam à puberdade, produzem novamente uma grande quantidade de testosterona, o que provoca o desenvolvimento do órgão masculino, dos músculos e até de uma voz mais grossa.
A pesquisa da investigadora mostrou que, na maioria dos casos, os novos órgãos masculinos funcionam bem e que os “guevedoces” passam a viver como seres do sexo masculino. Outros, no entanto, fazem uma cirurgia e continuam a ser mulheres.
Outra descoberta de Imperato-McGinley foi que os “guevedoces” tinham a tendência a ter próstatas pequenas.
Esta observação, aproveitada por Roy Vagelos da farmacêutica Merck, deu início a uma pesquisa que levou ao desenvolvimento daquele que se tornou um dos medicamentos mais vendidos do mercado, finasterida, prescrito para tratar o aumento da próstata, um problema enfrentado por muitos homens à medida que envelhecem. Também é usado para tratar a calvície masculina.
Uma última observação da investigadora foi que os “guevedoces”, apesar de serem criados como meninas, na sua maioria demonstraram preferências heterossexuais, concluindo assim que as hormonas no útero tem um papel ainda mais decisivo sobre a orientação sexual do que o tipo de educação que se recebe.
ZAP / BBC
