A quantidade de poeira do cometa na atmosfera foi suficiente para provocar um “inverno de impacto” de curta duração, seguido por um período de arrefecimento de 1.400 anos.
Em 2024, cientistas que estudavam sedimentos antigos no leste dos EUA relataram sinais da explosão de um cometa nos céus da Terra há 12.800 anos.
Esse acontecimento, sugeriram, pode ter mergulhado o planeta num período de frio de mil anos, conhecido como o Dryas Recente.
Agora, um novo estudo levou a investigação para as profundezas do oceano, e os resultados reforçam esta hipótese.
Investigadores da Universidade da Carolina do Sul analisaram sedimentos do fundo do mar na Baía de Baffin, perto da Gronelândia, e encontraram minúsculas partículas de poeira de cometa e detritos metálicos compatíveis com uma explosão cósmica na atmosfera.
Os resultados do estudo foram apresentados num artigo publicado recentemente na revista PLOS One.
Durante anos, os cientistas discutiram o que terá desencadeado o abrupto arrefecimento global que interrompeu o aquecimento no final da última Idade do Gelo.
Muitos associavam-no à água de degelo a inundar o Atlântico e a perturbar as correntes oceânicas. Outros acreditavam que algo vindo do espaço seria o responsável — mas até agora, a falta de um cratera ou de prova concreta tornava a ideia do cometa fácil de rejeitar.
Esta nova linha de evidência poderá mudar essa perceção.
“Os nossos novos resultados apoiam ainda mais a hipótese de que a Terra colidiu com um grande cometa há cerca de 12.800 anos”, explica Vladimir Tselmovich, um dos autores do estudo, ao The Debrief.
“A quantidade de poeira do cometa na atmosfera foi suficiente para provocar um ‘inverno de impacto’ de curta duração, seguido por um período de arrefecimento de 1.400 anos”, acrescenta o investigador.
À procura de respostas no fundo do oceano
Os investigadores queriam testar se os indícios de impacto de cometa encontrados em terra também apareciam no oceano. Para isso, recorreram a núcleos de sedimentos — amostras longas e cilíndricas perfuradas verticalmente no leito marinho.
Estes núcleos preservam camadas de lama e minerais depositadas ano após ano, como se fossem páginas do diário da Terra.
Na Baía de Baffin, próxima da Gronelândia e distante de contaminação humana, os cientistas recolheram quatro núcleos cujas camadas, segundo datação por radiocarbono, correspondiam ao período do Dryas Recente.
“Depois de estudarmos em detalhe os vestígios microscópicos deste desastre na Baía de Baffin, conseguimos identificar múltiplos vestígios de matéria cometária, identificada pela morfologia e composição das micropartículas encontradas”, explica Tselmovich.
Para procurar “impressões digitais” extraterrestres, os cientistas utilizaram várias técnicas avançadas. Por exemplo, microscópios eletrónicos revelaram a forma das partículas microscópicas, enquanto a espectroscopia e a espectrometria de massa mediram a sua composição química com grande precisão.
Os resultados foram impressionantes.
Encontraram grãos metálicos contendo níveis incomumente elevados de níquel, cobalto, platina e irídio, elementos frequentemente associados a material vindo do espaço. Algumas partículas de ferro apresentavam muito pouco oxigénio mas muito níquel, uma assinatura química típica de cometas e meteoritos.
Também descobriram minúsculas esferas de rocha fundida, ou microsférulas, que parecem ter-se formado quando materiais terrestres se fundiram com uma pequena quantidade de poeira alienígena durante a explosão atmosférica.
“As microsférulas são geoquimicamente mais semelhantes a sedimentos terrestres com vestígios de material extraterrestre”, referem os autores do estudo.
Outras nanopartículas lembravam gotas metálicas torcidas e deformadas, sugerindo novamente o calor e pressão extremos de uma explosão cósmica na atmosfera. Esta descoberta é consistente com o que outros estudos encontraram em terra por vários continentes — uma camada distinta de cerca de 12.800 anos, rica em platina, irídio, vidro fundido, nanodiamantes e quartzo fracturado.
Esta consistência entre locais terrestres e oceânicos reforça a ideia de que o arrefecimento do Dryas Recente foi não só súbito, mas também global, e potencialmente causado por um cometa fragmentado que se desintegrou no céu.
A nuvem de poeira do cometa dispersou-se na alta atmosfera, refletindo a luz solar de volta para o espaço.
Para humanos e animais abaixo, teria sido como se o Sol tivesse escurecido de repente. As temperaturas caíram, as plantas murcharam e o delicado equilíbrio do aquecimento do final da Era do Gelo interrompeu-se quase da noite para o dia.
“Os resultados deste estudo apoiam a hipótese do impacto do Dryas Recente, sugerindo que o encontro e interação da Terra com um grande cometa e o seu rasto de detritos no início do deste período provocou alterações climáticas e ambientais significativas”, concluíram os autores do estudo.