Governo caiu, Marcelo agiu: o que se segue

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António Pedro Santos / Lusa

O presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com o Primeiro-Ministro, Luís Montenegro.

Calendário traçado pelo chefe de Estado. Marcelo já falou com Montenegro e reúne com restantes partidos hoje, Conselho de Estado amanhã: a vida continua. Tecnicamente, há uma alternativa às eleições.

Como já se esperava: o Governo caiu, após chumbo da moção de confiança do Governo esta terça-feira. O Presidente da República recebe esta quarta-feira no Palácio de Belém os partidos políticos com assento parlamentar, para discutir a crise política e o cenário de eleições legislativas antecipadas — as terceiras em três anos.

O chefe de Estado já falou com Luís Montenegro, que disse depois do encontro que “a solução para este impasse deve passar pela realização de eleições legislativas antecipadas que devem decorrer o mais rápido possível”, mas “não há razão para alarme”.

Há “todas as condições” para as eleições serem a 11 de maio e “temos todas as razões para dizer a Portugal que não vai haver uma perturbação nem do ponto de vista do funcionamento do Governo, da administração pública e da economia durante este período”, disse o líder do PSD.

Marcelo vai receber em Belém delegações do PSD, PS, Chega, IL, BE, PCP, Livre e PAN até às 19:00, com quem deverá debater a crise política e a data das próximas legislativas. As reuniões — uma por hora — começam com o PSD e acabam com o PAN.

O Conselho de Estado foi convocado para quinta-feira, pelas 15h00.

Marcelo Rebelo de Sousa já tinha dito que, se a moção de confiança fosse rejeitada provocando a queda do Governo — o que aconteceu, na tarde desta terça-feira — o “calendário eleitoral” apontaria para duas hipóteses: ou 11 ou 18 de maio. O anúncio oficial deve ser feito a seguir ao Conselho de Estado e, neste cenário, teremos um novo Governo em meados de junho.

O chefe de Estado nunca se referiu explicitamente à antecipação das legislativas, mas depois de ter dissolvido a Assembleia da República há cerca de um ano, após a demissão do anterior primeiro-ministro, António Costa, na sequência do processo Influencer, deixou entender que desta vez voltaria a optar pela mesma solução.

Quando se tornou evidente que a moção de confiança seria rejeitada, como viria a acontecer na terça-feira, o Presidente prometeu agir o mais rapidamente possível, convocando os partidos para o dia seguinte e o Conselho de Estado para dois dias depois, os dois passos constitucionalmente obrigatórios antes de qualquer dissolução do parlamento.

Marcelo considerou fundamental que “a economia, a sociedade e a vida das pessoas continuem”, num período que não será “mais longo do que dois meses” e “antes ainda daquilo que possam vir a ser as eleições autárquicas e as eleições presidenciais em normalidade”, embora manifestando preocupação com a antecipação das eleições num cenário de crise internacional.

Esta será, a confirmar-se, a terceira dissolução do Parlamento no mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, depois do chumbo do Orçamento do Estado para 2022 que dariam a maioria absoluta ao PS de António Costa e, a segunda, depois da demissão deste primeiro-ministro, em 2023, na sequência da Operação Influencer.

Mas, tecnicamente, Marcelo pode não forçar eleições. Uma personalidade, independente ou parte do Governo, pode ser convidada pelo Presidente para assumir a liderança do Executivo até ao fim da legislatura — uma opção vista como arriscada, uma vez que o Parlamento pode rejeitá-la.

Num mês: como chegamos aqui?

Em apenas um mês, as notícias sobre a Spinumviva, empresa familiar que pertenceu ao primeiro-ministro e que Luís Montenegro, antes de ir para o Governo, passou à sua mulher e mais recentemente aos seus filhos, conduziu a duas moções de censura do Chega e PCP, ambas chumbadas. Mas os partidos continuaram a manifestar, e o primeiro-ministro anunciou a apresentação de uma moção de confiança, rejeitada esta terça-feira, que provocou a queda do Governo.

O PS apresentou uma comissão parlamentar de inquérito para produzir resultados num prazo de 90 dias. No debate em plenário de ontem, o Governo admitiu retirar a moção de confiança caso o PS reduzisse o tempo do inquérito para 15 dias, mas o PS rejeitou.

Após uma interrupção dos trabalhos durante meia-hora, o PSD fez saber que propôs ao PS que o inquérito durasse até final do mês de maio, ou seja, cerca de dois meses, proposta que também foi rejeitada pelo PS. O requerimento do PS para uma comissão de inquérito propõe um prazo de até 90 dias.

ZAP // Lusa

3 Comments

  1. O único e verdadeiro responsável pela crise política é o Sr.º Presidente da República, Marcelo Sousa, que a provocou em conjunto com a dr.ª Lucília Gago, que está a trazer graves consequências para Portugal e os Portugueses.
    O Sr.º Presidente da República, Marcelo Sousa, é um factor de instabilidade política, dissolveu a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, e a Assembleia da República.
    Junte-se a isto o envolvimento no «Caso das Gémeas» (https://expresso.pt/semanario/primeiro/em-destaque/2024-04-04-Caso-das-gemeas-IGAS-diz-que-Presidencia-da-Republica-condicionou-investigacao-e02b9166) e na contratação criminosa de serviços (https://www.sapo.pt/jornais/nacional/10256/2024-08-14).
    Não são os Governos que têm de se demitir, é o Sr.º Presidente da República, Marcelo Sousa, que não tem condições para continuar a exercer o cargo devendo demitir-se ou ser demitido, não sendo compreensível que ainda não tenha sido feito.

    • Falta aqui um terceiro nome que foi o responsável número 1. Trata-se do PM à data, Lembram-se? Era o único interessado na queda do governo e ficou fora da lista de culpados por interesse. Entendem ?

  2. A Farsa Democrática e a Perpétua Peça Parlamentar

    Eleições? Para quê eleições? Eis a interrogação que ressoa, como um badalar melancólico, nos corredores bafientos da nossa política. O povo, esse espectador entorpecido, assiste impassível à eterna peça que se desenrola na Assembleia da República, onde os mesmos rostos, as mesmas vozes e os mesmos vícios se revezam num jogo viciado de poder e compadrio. Como se de um ritual litúrgico se tratasse, fazem-se promessas de renovação, de rutura, de progresso – e, no entanto, o guião mantém-se imutável.

    Vivemos tempos queirosianos, onde a política é um teatro de vaidades e de mesquinhez, onde os interesses pessoais se sobrepõem ao bem comum, e onde a queda de um governo já não é tragédia, mas sim farsa previsível. Os artistas do parlamento, sempre os mesmos, jogam com as moções de censura como se fossem cartas marcadas de um baralho gasto. Fingem-se adversários ferozes em público, mas entre quatro paredes brindam ao compadrio, especialmente àquele tecido em aventais e apertos de mão discretos.

    Concordaria, pois, com novas eleições, desde que com um requisito essencial: nenhum dos que ocupou cadeiras parlamentares no mandato que findou deveria poder regressar. Seria um exílio temporário, uma quarentena política que purificasse a democracia do vírus da estagnação. A República necessitava de uma assembleia renovada, composta por cidadãos que não se tenham vergado ao carreirismo nem se tenham embriagado nos corredores do poder. Homens e mulheres de mérito, com provas dadas fora da política, alheios à podridão das estruturas partidárias e imunes ao jogo das influências.

    Mas o que nos espera? Mais do mesmo. O sistema perpetua-se e quem realmente cresce, eleição após eleição, é o maior partido nacional: a Abstenção. O voto que se omite é o grito silencioso de um povo descrente, cansado da farsa, resignado perante a constatação de que a alternância política não é mais do que uma ilusão. Continuaremos, pois, a assistir à pantomina parlamentar, à sucessão de governos efémeros, às guerras intestinas que destroem a governabilidade e perpetuam a mediocridade. E o país, esse, continuará à deriva, como um barco sem leme, entregue às marés da conveniência política.

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