Descobertas mais provas de que a COVID longa é uma lesão cerebral

José Coelho / Lusa

A natureza exata da COVID longa ainda está a ser revelada, mas foram descobertas algumas das melhores provas de que esta doença debilitante tem origem numa lesão cerebral.


Utilizando scanners de alta resolução, os investigadores das Universidades de Cambridge e Oxford mostraram anomalias estruturais microscópicas nos cérebros das pessoas que recuperaram da COVID-19, num estudo publicado na revista Brain.

Segundo o Science Alert, os sinais de inflamação cerebral estavam presentes até 18 meses após a primeira contração do vírus SARS-CoV-2.

“Mostramos que o tronco cerebral é um local de vulnerabilidade aos efeitos a longo prazo da COVID-19, com alterações persistentes evidentes nos meses após a hospitalização”, concluem os autores do estudo.

“Estas alterações foram mais evidentes em doentes com internamentos mais longos, maior gravidade da COVID, respostas inflamatórias mais proeminentes e piores resultados funcionais”.

O estudo foi realizado com 31 pessoas no pico da pandemia, que foram hospitalizadas com COVID-19 antes de as vacinas estarem disponíveis.

Os seus cérebros foram analisados, pelo menos, três meses depois de deixarem o hospital, mas, mesmo assim, os investigadores notaram sinais de inflamação nas três partes do tronco cerebral, comparativamente com participantes saudáveis da mesma idade.

O tronco cerebral humano é constituído pela medula oblonga, pela ponte e pelo mesencéfalo, todos eles parte do “centro de controlo automático” do cérebro, que regula os ciclos de sono, bem como a respiração e o ritmo cardíaco. A fadiga, a falta de ar e o ritmo cardíaco elevado são alguns dos sintomas mais comuns da COVID-19 prolongada.

“O facto de observarmos anomalias nas partes do cérebro associadas à respiração sugere fortemente que os sintomas de longa duração são um efeito da inflamação no tronco cerebral após a infeção por COVID-19”, afirma Catarina Rua, neurocientista de Cambridge.

Um padrão semelhante é encontrado em pessoas que sofreram lesões cerebrais traumáticas graves — um grupo de pacientes com muitos dos mesmos sintomas.

Além disso, estudos de autópsias de pessoas que morreram com COVID-19 de longa duração mostraram troncos cerebrais inflamados com degeneração dos tecidos. Isto levou alguns cientistas a suspeitar que o vírus está a entrar furtivamente no tronco cerebral através do nervo vago.

No entanto, em cérebros vivos de pessoas com COVID-19 longa, os estudos convencionais de ressonância magnética não revelaram quaisquer anomalias estruturais no tronco cerebral.

“As coisas que acontecem dentro e à volta do tronco cerebral são vitais para a qualidade de vida, mas tinha sido impossível analisar a inflamação dos núcleos do tronco cerebral em pessoas vivas, devido ao seu tamanho minúsculo e à sua posição difícil”, explica Rua.

“Os aparelhos de ressonância magnética normais, do tipo hospitalar, não conseguem ver o interior do cérebro com o tipo de pormenor químico e físico de que necessitamos. Mas com os scanners de 7T (7 Tesla), podemos agora medir esses pormenores”.


No ano passado, quando os investigadores australianos utilizaram scanners de 7T em 8 doentes com COVID-19 de longa duração, descobriram que as regiões do tronco cerebral eram significativamente maiores do que as de 10 indivíduos saudáveis de controlo. Isto indica uma inflamação cerebral contínua.

É de salientar que o mesmo padrão aparece em doentes com síndrome de fadiga crónica ou encefalomielite mialgica (CFS/ME) — uma doença com sintomas semelhantes que pode estar relacionada com a COVID longa ou ser desencadeada por fatores semelhantes.

No início deste ano, investigadores dos EUA também seguiram as células imunitárias num pequeno grupo de doentes com COVID-19 longa, utilizando um teste de imagem PET (tomografia por emissão de positrões). E também encontraram uma atividade imunitária anormal nos troncos cerebrais dos doentes.

“O tronco cerebral é a caixa de junção crítica entre o nosso eu consciente e o que está a acontecer no nosso corpo”, explica James Rowe, neurocientista de Cambridge.
 “A capacidade de ver e compreender como o tronco cerebral se altera em resposta à COVID-19 ajudará a explicar e a tratar os efeitos a longo prazo de forma mais eficaz”.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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