Momento de desespero de um homem que pensou que não iria sobreviver. E que acha que o que fez não foi propriamente um acto de herói.
Pensou que não iria sobreviver mas sobreviveu para contar a história.
Serhii é um soldado ucraniano de 36 anos que, tal como milhares de compatriotas, alistou-se no exército logo em Fevereiro de 2022, quando a Ucrânia foi invadida pela Rússia.
No final de Outubro foi colocado nos arredores de Bakhmut para proteger trincheiras na linha de frente da zona leste.
Uma missão que deveria durar três dias mas que se prolongou por duas semanas – os ucranianos foram atingidos pelos russos.
Num dos bombardeamentos, Serhii e outros dois ucranianos ficaram isolados do resto do grupo.
Serhii ficou ferido nas duas pernas mas, quando a equipa de resgate chegou, pediu para levar os seus compatriotas, porque estariam piores.
O soldado ficou à espera de outra equipa de resgate… que nunca apareceu. Ou melhor, aparecia mas os ataques russos impediam que Serhii fosse resgatado.
Serhii ficou então isolado numa trincheira, mas foi conseguindo água, medicamentos e alguns alimentos através de um dreno.
Os soldados russos estavam cada vez mais perto daquele soldado sozinho.
Pensando que não iria sobreviver, Serhii teve uma ideia: deu ao comandante as coordenadas do local onde estavam os russos.
Mas esse local também era onde o próprio Serhii estava. Era um ataque ucraniano a ele próprio.
O exército ucraniano atacou, de forma precisa, mas outros soldados russos continuaram a assumir posições ao redor daquele soldado. Ou seja, novos ataques ucranianos naquela zona.
Durante um desses ataques, um soldado russo entrou no abrigo onde Serhii se tinha escondido. O russo perguntou ao ucraniano de onde ele era e Serhii respondeu – em russo – que sofreu uma concussão; e pediu água. O russo saiu da trincheira, sem lhe dar água (e aparentemente sem saber que Serhii era ucraniano).
“Ainda não consigo entender como ele não percebeu que eu pertencia às forças armadas ucranianas. Eu tinha um uniforme militar da Ucrânia”, disse o soldado, na CNN.
Apesar de todos os ataques naquele local, o ucraniano continuava vivo. Até que o seu comandante lhe disse: “Não conseguimos resgatar-te. Só te resta sair daí a rastejar… e rezar”.
Serhii rastejou – pelo abrigo onde estavam os russos – e lá foi “de gatas” até encontrar compatriotas.
Está no hospital há duas semanas. E acha que não é herói nenhum. Heróis são os outros ucranianos: “Vocês deveriam ver o que os nossos rapazes estão a fazer na linha de frente. Como eles lutam, evacuam e resgatam os seus companheiros. E estão a pagar um preço muito alto por isso: pagam com o seu sangue”.
“Tudo que eu quero é pescar com os meus amigos, beber umas cervejas e ficar sentado em silêncio”, concluiu.