Supremo brasileiro acaba com “legítima defesa da honra” para desculpar assassínio de mulheres

O Supremo Tribunal Federal do Brasil declarou na terça-feira inconstitucional o uso da tese da “legítima defesa da honra” para justificar o assassínio de mulheres pelas mãos dos seus companheiros.

Os juízes consideraram por unanimidade que esta tese é contrária aos princípios da igualdade de género, da dignidade humana e da proteção da vida previstos na Constituição, pelo que proibiu a sua utilização direta ou indireta durante os julgamentos.

A tese foi, por vezes, invocada em processos de assassínio de mulheres, nomeadamente em júris populares, para defender o homem acusado de ter morto a companheira, com o argumento de que as relações extraconjugais desta tinham ferido a sua honra.

O relator do projeto, do esembargador José Antonio Dias Toffoli, havia argumentado em junho, em sessão anterior, que a “legítima defesa da honra” nada tinha a ver com o conceito de “legítima defesa” previsto no Código Penal brasileiro contra agressões físicas.

No seu voto a favor da anulação da tese, a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, referiu-se na terça-feira a “Gabriela, cravo e canela“, o famoso romance do escritor brasileiro Jorge Amado em que é narrado o assassínio de uma mulher às mãos de um marido ciumento.

“O escritor baiano reconstrói o universo nordestino do século XX, narrando as crónicas de uma sociedade predominantemente patriarcal, arcaica e autoritária”, disse.

A sociedade, frisou, “não mudou muito, continua misógina e machista.”

A ideia da “legítima defesa da honra” refletia, segundo Weber, “a expressão dos valores de uma sociedade patriarcal, arcaica e autoritária” que justificava os homicídios com base na “superioridade” dos homens.

O julgamento responde a uma ação judicial movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) contra a constitucionalidade da tese, posição partilhada pela Procuradoria-Geral da República.

Com a votação desta terça-feira, o Supremo Tribunal Federal confirma uma decisão preliminar de 2021 que ia no mesmo sentido e, dessa forma, encerra a questão.

Lusa //

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