O “virar de página” da TAP tem mais perguntas sobre o passado que certezas sobre o futuro

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Andre Kosters/Lusa

Conferência de imprensa dos ministros das Finanças, Fernando Medina, e das Infraestruturas, João Galamba

Fernando Medina escudou-se no “virar de página” para evitar perguntas sobre as consequências políticas do relatório da Inspeção Geral das Finanças.

No final da tarde de ontem, Fernando Medina, ministro das Finanças, e João Galamba, ministro das Infraestruturas, realizaram uma conferência de imprensa que teve como principal objetivo dar a conhecer os resultados do relatório da Inspeção Geral das Finanças resultante da investigação feita à saída de Alexandra Reis, gestora, mas sobretudo à indemnização que lhe foi concedida — de 500 mil euros, poucos antes de integrar a NAV e, mais tarde, transitar para o Ministério das Finanças.

Nos primeiros minutos, Medina tratou de esclarecer o mistério que se adensava nos últimos dias: apesar dos bons resultados obtidos nos últimos meses, numa altura em que a empresa passa por um processo de reestruturação, Manuel Beja, presidente da administração, e Christine Ourmières-Widener, estão de saída da TAP, com o Governo a alegar justa causa na decisão. Desta forma, os dois responsáveis só receberão as compensações devidas por lei, as quais não incluem indemnização ou subsídio de desemprego.

A única compensação que poderá estar em cima da mesa varia entre os 15 e os 45 dias de remuneração base e diuturnidades por cada ano de trabalho.

No entender do ministro das Finanças, é possível detetar “implicações no controlo da legalidade” e “deficiências graves na relação com o acionista“. Um “virar de página” é, por isso, necessário, entende o Governo, de forma a restabelecer a confiança entre o país e a companhia aérea. Apesar da saída de Manuel Beja e Christine Ourmières-Widener, a restante administração deve manter-se em funções, pelo menos para já, confirmou João Galamba, que reconheceu que “alguns ajustamentos poderão existir“.

Luís Rodrigues é o nome que se segue nos comandos da TAP, acumulando as duas pastas que por decisão do Governo ficaram sem detentores. O gestor havia sido reconduzido como CEO da SATA ainda em dezembro.

De volta ao caso Alexandra Reis (que espoletou toda a polémica), perante a nulidade do acordo decretada pela IGF, a gestora terá que devolver 450 mil euros do total recebido e que lhe foram “indevidamente pagos“. O restante valor diz respeito ao contrato de trabalho e quanto a esse não foi declarada nenhuma ilegalidade.

As reações dos protagonistas

Apesar de o Governo alegar justa causa nas demissões, de forma a evitar o pagamento de indemnizações, tal não implica que os mesmos não recorram à justiça para contestar a decisão. “Assistirá sempre a cada um o direito de discordar da opção do Governo, é isso que faz o Estado Democrático”, reconheceu Fernando Medina.

Christine Ourmières-Widener ainda não admitiu publicamente, pelo menos de forma clara, se pretende seguir esta via, mas numa reação ao documento acusou a Inspeção-Geral de Finanças de “comportamento discriminatório” e mostrou a sua “perplexidade ao constatar que, lamentavelmente, foi a única pessoa diretamente envolvida” no processo “que não foi ouvida pessoalmente perante a IGF”.

“Fica devidamente registado este comportamento discriminatório por parte da IGF, relativamente ao qual não deixará de se reiterar, em devido tempo, todas as consequências legais“, ameaçou. Uma das questões que se coloca com a saída da CEO é se terá direito a prémios relativos ao período em que exerceu funções, apesar de os objetivos globais a que se propôs não terem sido alcançados.

Manuel Beja, por sua vez, quebrou o silêncio que o caracterizava há meses, mesmo quando os valores da indemnização a Alexandra Reis abriam noticiários e a CEO da companhia aérea respondia perante o Parlamento. Através de uma publicação no seu perfil do Linkedin, o gestor fez saber que tentou segurar Alexandra Reis na TAP, que foi leal à empresa e que cumpriu com os seus deveres em questões de governação.

“Foi assim, de boa-fé, e segundo a instrução da tutela, que cumpri o meu dever de lealdade na implementação de uma decisão (a composição do CA) que é legitimamente tomada pelo acionista”.

Finalmente, Alexandra Reis mostrou publicamente o seu desacordo face às conclusões que constam do relatório ontem divulgado, mas assegurou que vai proceder à devolução da quantia referida.

“Não posso, pois, concordar com o Relatório da IGF, ou seja, com um parecer, e que não é mais do que isso, que reescreve o que se passou para dar aquela que é provavelmente a resposta mais fácil. Todavia, equivocada“, alega a gestora. “Mas, para que não restem quaisquer dúvidas, e como afirmei desde o início, não quero um euro sobre o qual recaia a mínima suspeita“, garantiu.

Na reação, Alexandra Reis deixa ainda questões, como o facto de, por o acordo ter sido declarado inválido, se passa a estar em causa uma “demissão por mera conveniência“, o que lhe confere, alega, “direito a uma indemnização“.

“Para ser clara desde o início: o acordo resultou de uma iniciativa e proposta da TAP, a que acedi de boa-fé. E acedi com a finalidade última de evitar problemas institucionais no seio da Comissão Executiva da TAP e porque tive a firme convicção de que o mesmo seria lícito, assim como todos os meus atos subsequentes”, justifica num comunicado enviado aos jornalistas.

As consequências pedidas por Marcelo

De volta à conferência de imprensa, após as declarações dos dois governantes, os jornalistas procuraram saber se, para além da saída da CEO, do presidente da administração e da devolução da indemnização por parte de Alexandra Reis, o relatório também traria consequências políticas, uma questão que Fernando Medina procurou por diversas vezes evitar.

Escudou-se no “virar de página”, protagonizado pela saída dos anteriores responsáveis e pela entrada de Luís Rodrigues, nas informações que constavam no relatório, mas também nas datas, remetendo a responsabilidade das decisões para Pedro Nuno Santos, antigo ministro das Infraestruturas, que acabou por se demitir na sequência do caso.

“Já deve ter reparado nas datas. Posso ser criticado pelas decisões que tomo, mas não pelas que não tomo. Assumo plenamente as responsabilidades que me cabem, que é um problema que se gerou numa empresa onde tenho responsabilidades de tutela e na representação acionista.”

Perante a insistência dos jornalistas, Medina reconheceu que o caso gerou “grande perturbação” e admitiu que todos “prefeririam que o episódio não tivesse acontecido”. Lembrou ainda que o Governo “fez o que se impunha“, indo mais além do que as conclusões do relatório recomendavam: a recuperação da verba da indemnização e o envio do relatório para o Tribunal de Contas.

“A marca deixada precisa de ser afastada porque abalou a confiança dos portugueses na TAP e na sua administração”.

Quanto ao seu envolvimento no caso, com a nomeação de Alexandra Reis para secretária de Estado do Tesouro, Medina não deu qualquer explicação adicional nem procurou assumir responsabilidades, mantendo a versão de que não tinha conhecimento do valor da indemnização.

Partidos disparam contra Governo

Numa primeira reação, Luís Montenegro acusou o Governo de “sacudir a água do capote” e “arranjar bodes expiatórios” ao demitir os responsáveis da TAP e defendeu que o ministro das Finanças está “diminuído de autoridade política e credibilidade”.

“O Governo ao fazer cessar de funções o presidente do Conselho de Administração e a presidente executiva da TAP quer, no fundo, sacudir a água do capote, quer arranjar bodes expiatórios para uma responsabilidade política que é sua, nomeadamente do senhor ministro das Finanças”, acusou o líder do PSD.

O social-democrata garantiu ainda que se fosse ele o primeiro-ministro, o atual titular da pasta das Finanças, Fernando Medina, já não ocuparia o cargo e salientou que é preciso “aprofundar a situação” da TAP para ver se há mais “casos semelhantes” ao de Alexandra Reis. “Acho que o ministro das Finanças está cada vez mais diminuído na sua autoridade política e na sua credibilidade para o exercício da função, mas evidentemente, que compete ao primeiro-ministro fazer essa avaliação.”

O líder da IL (Iniciativa Liberal), Rui Rocha, defendeu esta segunda-feira que deve haver um “julgamento político” sobre a gestão da TAP, acusando o primeiro-ministro, António Costa, de ser o “grande responsável político” pela situação da companhia aérea.

“António Costa é o grande responsável político por toda esta situação. Como a IL tem dito desde do início, muitas vezes sozinha e não acompanhada, estamos perante uma péssima decisão política que foi a renacionalização da TAP”, afirmou Rui Rocha.

Para Rui Rocha, existe uma “tentativa” de “ilibar o poder político” da situação, considerando que deve existir um “julgamento de censura política muito forte” sobre o primeiro-ministro António Costa. “Tem de haver um julgamento político sobre a gestão da TAP no seu conjunto. Nós não podemos ver o poder político, o governo, a ficar de fora de uma avaliação sobre a condução de todas estas situações”, reforçou.

Já o Partido Socialista entende que o relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) demonstra que houve “responsabilidades do ponto de vista da gestão” sobre a indemnização e saída da ex-secretária de Estado Alexandra Reis da TAP.

“Ficou claro que havia responsabilidades do ponto de vista da gestão, da forma como indemnização foi feita e na forma como saída a de Alexandra Reis foi construída e o Governo tomou as decisões que tinha que tomar”, referiu o deputado socialista Carlos Pereira.

O PCP, por sua vez, considera que as decisões do Governo eram “uma inevitabilidade” e advertiu que é preciso saber se há outros casos como o de Alexandra Reis.“Estávamos perante uma prática verdadeiramente inaceitável, perante uma ilegalidade que tinha de ter uma consequência”, defendeu.

O deputado do PCP defendeu que é preciso saber “quantas Alexandras Reis mais poderão existir”, uma vez que o relatório atual da IGF só abordou o caso em concreto da indemnização de 500 mil euros da ex-secretária de Estado. Bruno Dias salientou que esse tipo de indemnizações constitui “uma prática verdadeiramente inaceitável, que é a marca da gestão privada que impuseram à TAP”, e que “levanta as maiores preocupações” ao partido.

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3 Comments

  1. O relatório da IGF não esclarece como é óbvio, a responsabilidade do ministro Medina no processo de burla ao erário público. É uma investigação liderada por um dos presumíveis criminosos e nesse contexto vale o que vale. Ainda que o ministro não ter tido uma participação directa, é responsável com dolo eventual já que o caso só passou por escrutínio por intervenção da comunicação social. Neste contexto penso que o ministro deve ser demitido com justa causa e para o bem dos Portugueses e das finanças públicas.

  2. Para o Povo, os Portugueses que tem problemas para resolver, prestações da casa sempre a aumentar, este problema já era, Ponto, para os Políticos e cadeias de Televisão tem de fazer render o Peixe, os políticos de políticos não tem nada, ou então estariam preocupados a melhorar a legislação e ouvir os produtores agrícolas a tentar perceber porque os preços produzidos em Portugal e sem aumentos da mão de obra os preços triplicam para melhorar as leis em conformidade, mas apenas procuram o assalto ao poder, razão porque não admirará que em próximas eleições a maioria absoluta suba ainda mais já que o governo é o único preocupado com o problema, a comunicação social que não quer gastar dinheiro em programação decente também está interessada em esticar, prolongar, confundir, baralhar, para entreter o pagode com tretas fugindo assim a gastar euros em programação.

  3. Lá vem a treta do virar de página. Não há virar de página enquanto Medina não explicar porque levou Alexandra para o governo, sabendo que a mesma fora expulsa da TAP e recebera uma avultada indemnização. Ele foge, como o diabo da cruz, quando lhe fazem esta pergunta. A sua responsabilidade política reside, sobretudo, aqui e enquanto não responder a esta questão, vai ser constantemente atazanado.

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