As autoridades alemãs vão publicar esta quinta-feira fotografias de 590 obras que integram o chamado “tesouro nazi de Munique”, anunciou hoje um porta-voz do grupo de trabalho encarregado de as identificar.
Mil e quatrocentas pinturas, desenhos e litografias de autores como Picasso, Matisse ou Chagall foram apreendidas em fevereiro de 2012 no apartamento de Munique de Cornelius Gurlitt, filho de um negociador de arte bem relacionado com o regime nazi, Hildebrand Gurlitt, que as terá adquirido nos anos 1930 e 1940.
O caso está a suscitar polémica na Alemanha por ter sido mantido “em segredo” e só ter sido conhecido no início de novembro através de um artigo da revista Focus, mas também porque as autoridades só agora começam a divulgar a lista das obras, dificultando, segundo organizações judaicas, a sua identificação pelos eventuais legítimos proprietários.
“Um número considerável de fotos das obras, além das já publicadas, vai estar visível a partir de quinta-feira no site www.lostart.de”, gerido pelo grupo de coordenação federal para a arte desaparecida durante a II Guerra Mundial, afirmou o porta-voz, acrescentando que o conjunto de fotografias “será aumentado” regularmente.
As autoridades tinham publicado há uma semana 50 fotografias de peças, depois de numerosas críticas contra a lentidão das investigações e a não divulgação das obras.
O Congresso Mundial Judaico, que representa uma centena de comunidades judaicas fora de Israel, advertiu hoje as autoridades de que a credibilidade da Alemanha se joga na forma como vão gerir o caso.
Para o presidente daquele grupo, Ronald S. Lauder, o “tesouro nazi de Munique” pode ser “a ponta do icebergue” da arte roubada pelos nazis e as autoridades têm a obrigação moral de a devolver.
Lauder falava depois de o procurador de Augsburg ter anunciado esta semana que pretende devolver a breve prazo a Cornellius Gurlitt algumas das obras confiscadas, pedindo ao grupo de trabalho que indique “rapidamente” quais aquelas que não suscitam dúvidas.
Hoje, a ministra da Justiça alemã, Sabine Leutheusser Schnarrenberger, disse a uma rádio regional que é necessário “encontrar forma de falar, num clima de confiança, com Gurlitt” para o persuadir a abdicar dos direitos das obras que tenham sido confiscadas pelos nazis.
A quem de direito
Cornellius Gurlitt, 80 anos, deu uma entrevista no fim de semana à revista ‘Der Spiegel’ em que prometeu lutar pela propriedade das obras. “Voluntariamente não vou dar nada, não, não”, disse, acrescentando: “Só quero viver com os meus quadros”.
O presidente do Congresso Mundial Judaico, que falou hoje à agência France Presse, repetiu apelos anteriores no sentido de as obras subtraídas a judeus serem rapidamente devolvidas e afirmou que, para isso, é preciso eliminar as limitações impostas há 30 anos à reclamação de propriedade roubada e formar uma comissão que processe as queixas e avalie as coleções públicas em busca de propriedade roubada.
“O governo alemão deve lidar com o problema porque o Holocausto foi único e o estatuto de limitações não foi pensado para lidar com saques maciços em tempo de guerra e durante um genocídio”, disse Lauder à France Presse.
Segundo Lauder, se nada for feito, os legítimos proprietários das obras roubadas podem ver-se envolvidos em prolongadas e caras batalhas legais sem qualquer garantia de recuperar os bens.
O responsável voltou também a criticar as autoridades por terem mantido em segredo a apreensão: “Inicialmente, descreveram-no como um esquema de fuga ao fisco e não como aquilo que realmente é – alguém que roubou arte durante o Holocausto e que diz ao governo alemão ‘ha, ha, sou eu que a tenho, não ma podem tirar’”, disse Lauder.
/Lusa