Liz Truss sucede ao “amigo” Boris e será a nova primeira-ministra britânica

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Neil Hall / EPA

A Ministra dos Negócios Estrangeiros conquistou 57,4% dos votos contra 42,6% para Rishi Sunak. A candidata promete cortar os impostos e teceu elogios ao “amigo” Boris Johnson.

Depois de quase dois meses de especulação e de os deputados Conservadores terem depositado as suas esperanças em Liz Truss e Rishi Sunak, os militantes do partido já se fizeram ouvir e consagraram a actual Ministra dos Negócios Estrangeiros como nova líder partidária e sucessora a Boris Johnson em Downing Street.

A votação por correio e online dos cerca de 200 mil membros do partido Conservador começou no início de agosto, um mês depois de Johnson ter anunciado a demissão, e terminou na sexta-feira.

Sunak foi o vencedor em todas as rondas de votação dos deputados, mas Truss afirmou-se desde cedo como a favorita entre a base do partido, apesar de a sua popularidade ter escorregado ao longo da campanha — no início de Agosto, 49% dos eleitores Conservadores em 2019 achavam que a candidata parecia ser uma “primeira-ministra em espera”, mas a 30 de Agosto o valor caiu para 31%.

No mesmo sentido, 55% dos eleitores consideravam Truss competente no início de Agosto, mas no final do mesmo mês a percentagem derrapou para os 35%, de acordo com uma sondagem para o Observer.

Mas esta quebra não chegou para deter o seu favoritismo. Truss conquistou 57,4% dos votos contra 42,6% para Sunak. A afluência ficou-se pelos 82,6%, ficando abaixo dos 87,4% registados no confronto de 2019 entre Boris Johnson e Jeremy Hunt.

Na reacção ao anúncio da sua vitória, Liz Truss, que será a terceira mulher a assumir o cargo de primeira-ministra na história do Reino Unido, mostrou-se grata pela “honra” de ser a nova líder dos Conservadores.

“Amigos e colegas, obrigada por terem fé em mim para liderar o nosso grande partido Conservador, o maior partido político na Terra”, começou. A nova chefe do Governo agradeceu aos membros do partido pela organização de uma “das maiores entrevistas de emprego na história” e não esqueceu o rival Rishi Sunak, dizendo que as campanhas dos dois mostraram “a profundidade do talento” nos Tories.

Outro nome que não foi esquecido foi o do “amigo” Boris Johnson, que Truss nunca abandonou nem no meio de todos os escândalos que o ainda primeiro-ministro protagonizou.

Boris, tu concretizaste o Brexit. Tu esmagaste o Jeremy Corbyn, tu lideraste a administração das vacinas. E tu fizeste frente a Vladimir Putin. Foste admirado desde Kiev a Carlisle”, afirmou.

A vencedora enumerou os valores do partido, como a crença “na liberdade, na capacidade de controlar a própria vida, nos impostos baixos, na responsabilidade pessoal”, que disse terem sido responsáveis pela vitória do partido em 2019.

“Vou levar a cabo um plano ousado para se cortar os impostos e crescer a nossa economia. Vou responder à crise energética, lidar com as contas, mas também lidar com os problemas a longo prazo que temos no fornecimento de energia. E vou responder no Serviço Nacional de Saúde”, prometeu.

A fechar, Truss matou qualquer especulação que pudesse existir sobre a possibilidade de convocar eleições antecipadas, garantindo que vai dar uma “grande vitória” aos Conservadores em 2024.

Inflação é o bicho-papão de Truss

O principal obstáculo para Truss será o combate à inflação, que está num pico nos últimos 40 anos e se adivinha como o seu maior desafio. Só nos preços da energia já se antecipa uma subida de 80% a partir de Outubro.

Face a esta situação, a nova primeira-ministra tentou acalmar os eleitores na edição da última quinta-feira do The Sun, escrevendo que vai “prestar apoio imediato para garantir que as pessoas não enfrentam faturas de energia incomportáveis” no Inverno.

“Acredito firmemente que, nestes tempos conturbados, precisamos de ser radicais”, acrescentou.

Truss, que é considerada uma “nova Dama de Ferro”, inspirou-se em Thatcher e fez do corte nos impostos a principal bandeira da sua campanha, prometendo reduzir a carga fiscal em 30 mil milhões de libras.

As críticas a estes enormes cortes de impostos, a polémica gerada em torno dos seus comentários sobre a produtividade dos britânicos, e o seu recente bate-boca com Macron, também podem ter sido responsáveis pela derrapagem da ex-Ministra dos Negócios Estrangeiros.

Relativamente ao Brexit, apesar de ter assumido um papel importante nas negociações com a União Europeia quando foi promovida ao cargo de Ministra dos Negócios Estrangeiros, Truss foi a favor da permanência na altura do referendo. A Ministra tem sido muito criticada por defender uma nova lei que unilateralmente anularia o acordo com a UE relativo à fronteira na Irlanda do Norte.

Quando o tema é imigração, tanto Truss é a favor da polémica proposta do Governo britânico que quer enviar para o Ruanda os migrantes que chegam ao seu território através do Canal da Mancha, defendendo até uma expansão desta política a outros países, como a Turquia.

Na Defesa, a nova primeira-ministra quer ultrapassar o requisito mínimo de 2% do PIB imposto pela NATO e defende que o orçamento chegue aos 3% do PIB em 2030.

No combate às alterações climáticas, Truss compromete-se com o objectivos de zerar as emissões líquidas de gases com efeito de estufa até 2050, mas quer eliminar as taxas que apoiam o sector renovável.

O novo papel de Boris

Com a sua saída oficial de Downing Street marcada para amanhã, o que reserva o futuro para Boris Johnson?

Para Michael Gove, deputado com uma relação conturbada com o ainda primeiro-ministro, Boris Johnson está longe de estar acabado. “É muito importante reconhecer que Boris vai ter um papel significativo a desempenhar no futuro do país”, defende o ex-Ministro da Educação que foi demitido por Johnson.

O seu biógrafo, Andrew Gimson, também acredita que Boris não é o “tipo de pessoa que vai para o campo para trabalhar na igreja local e viver uma vida de obscuridade sem culpa”.

Um regresso à escrita está em cima da mesa. Durante anos, Johnson teve uma coluna de opinião no Daily Telegraph e desde 2015 que está a trabalhar numa biografia de William Shakespeare, que devia ter saído em 2016 mas foi sendo adiada devido aos seus compromissos políticos e ao arranque da campanha do Brexit.

Outra possibilidade é que Boris siga as pegadas da sua antecessora em Downing Street, Theresa May, e aposte na participação em conferências. May já amealhou 715 mil libras só este ano com nove discursos em conferências, de acordo com a BBC — e a personalidade mais cómica de Boris Johnson torna-o um convidado ainda mais apetecível do que May para este tipo de eventos.

Há também muita especulação sobre se Johnson vai continuar como deputado, especialmente depois de ter aparentemente dito apenas um “até já” e não um “adeus” quando considerou que a sua foi “cumprida, por agora” citou a famosa frase do Exterminador Implacável de Arnold Schwarzenegger e disse “hasta la vista, baby”.

Nada está garantido, já que Boris ainda pode ser suspenso quando for conhecido o resultado da investigação de que está a ser alvo por ter alegadamente mentido ao Parlamento sobre o Partygate.

E também não há certezas sobre a sua reeleição pelo círculo eleitoral de Uxbridge e South Ruislip, que pode virar as costas aos Conservadores na próxima ida às urnas. A única garantia, por agora, é que Boris Johnson não vai ter nenhum cargo no novo Governo de Truss.

Mas será que Johnson pode mesmo tentar voltar ao leme do partido? Para o professor de política da Universidade Queen Mary de Londres, Tim Bale, os Conservadores teriam de estar “bastante desesperados” para voltarem a apostar em Boris. “O futuro do partido Conservador deixar-me-ia seriamente preocupado se voltarem a Boris Johnson”, atira.

Gimson não fecha a porta a nenhuma possibilidade: “Independentemente do que ele faz, haverá sempre um culto a Boris Johnson. Muitas pessoas foram primeiro-ministro duas ou três vezes com um intervalo”.

Adriana Peixotp, ZAP //

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2 Comments

  1. “Quando os tiveres pelas bolas, os seus corações e mentes seguir-te-ão em breve”.

    Não creio que a Rússia fique satisfeita com “Ainda apoiamos a Ucrânia e dizemos que a Rússia é o mau da fita, mas precisamos do gás, por isso vamos ser amigos… por agora”.

    Essa janela de oportunidade fechou-se no início de Abril, quando BoJo fez o seu trabalho e depois Bucha aconteceu como um “obrigado” aos ingénuos russos que puxaram as suas forças num gesto de boa vontade nas negociações.

    Do modo como as coisas estão a correr agora, a Rússia terá como objectivo uma mudança total de regime, cabeças a rolar e tudo, antes mesmo de começar a pensar em “normalizar as relações” com qualquer pessoa. Isto vale tanto para a UE como para a Ucrânia. E com a chegada do Inverno, poderão até mesmo obter o seu desejo.

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