O pacote prevê um investimento de 300 mil milhões de dólares no combate às alterações climáticas — o maior de sempre nos EUA. Antecipa-se que a lei seja aprovada esta semana na Câmara dos Representantes.
Depois de meses de negociações, o Senado conseguiu finalmente chegar a um consenso para aprovar um grande pacote legislativo de Joe Biden.
Após assegurar os votos decisivos dos Democratas Joe Manchin e Kyrsten Sinema, o partido alcançou os 50 votos precisos para aprovar o Inflation Reduction Act, graças ao voto de desempate da vice-presidente Kamala Harris.
Estima-se que o pacote contenha investimentos no valor de 430 mil milhões de dólares, mas renda outros 740 mil milhões. A lei inclui para a transição energética e de combate à escalada de preços e vai agora ser enviada para a Câmara dos Representantes, onde se espera que a maioria Democrata a aprove esta sexta-feira.
“O Senado está a fazer história. Para os americanos que perderam esperança de que o Congresso possa fazer coisas grandes, esta lei é para vocês. Esta lei vai mudar a América durante décadas”, anunciou Chuck Schumer, líder da maioria Democrata do Senado, que reforça que este é o “pacote mais ambicioso para a energia limpa na história da América”.
Dado que o pacote se paga a si mesmo e reduz o défice federal ao longo do tempo, o Democratas argumentam que ajudará a reduzir a inflação, que é actualmente o problema que mais preocupa os eleitores e pode fazer estragos nas intercalares.
Os Republicanos, por sua vez, acreditam que a lei terá um impacto negativo na economia. Já o Escritório Orçamental do Congresso, que não é partidário, antecipa que a lei tenha um impacto “insignificante” na escalada de preços.
Joe Biden já reconheceu que esta lei fica muito aquém das suas promessas no Build Back Better, o enorme pacote social de 3,5 biliões de dólares que era uma das bandeiras da sua campanha e que “morreu” no Congresso.
“A lei está longe de ser perfeita. É um compromisso. Mas é muitas vezes assim que o progresso é feito. Esta é lei mais forte que se pode passar para se combater a inflação, cortar o défice, reduzir os custos de saúde, responder à crise climática e promover a segurança energética”, já tinha afirmado o chefe de Estado.
O que está (e não está) na lei
O pacote prevê que mais de 300 mil milhões de dólares sejam destinados à transição energética, o maior investimento nas energias limpas de sempre nos EUA. Apesar disto, os Democratas queriam que o valor fosse 555 mil milhões, mas o investimento foi sendo cortado ao longo das negociações.
O partido garante que as medidas previstas — como créditos fiscais para a compra de carros elétricos ou para a maior eficiência das casas, a construção de mais parques solares e eólicos ou a taxação às emissões de metano das petrolíferas — vai cortar as emissões de gases com efeito de estufa em 40% até 2030, tendo por base os valores de 2005. Biden queria inicialmente que o corte fosse de 50%.
Na saúde, uma das principais medidas é o corte no preço dos medicamentos fornecidos no Medicare (sistema de seguros de saúde gerido pelo Governo e destinado às pessoas acima dos 65 anos). Isto acontece porque o Secretário de Saúde terá agora o poder para negociar os preços com as farmacêuticas.
No entanto, a mudança não se aplica a todos os remédios nem vai avançar de imediato. As negociações relativas a 10 medicamentos vão avançar em 2026 e espera-se que em 2029 já haja 20 fármacos com os preços mais baixos.
Uma porção importante da lei que pretendia impor um limite de 35 dólares mensais no preço da insulina acabou por cair. Recorde-se que, nos Estados Unidos, a insulina é bastante mais cara em relação aos preços praticados noutros países desenvolvidos. Em 2018, uma dose de insulina nos EUA custava, em média, 98,70 dólares, um grande contraste com os 6,94 dólares praticados na Austrália. Estima-se que um quarto dos diabéticos nos EUA tenha de racionar insulina e há muitos que até atravessam a fronteira com o Canadá para a comprarem a preços mais baratos.
O pacote também impõe um limite de 2000 dólares em prescrições que não sejam cobertas pelos seguros na população que seja elegível para o Medicare. Esta medida deve avançar em 2025, relata o NPR.
Os subsídios de saúde fornecidos pelo Obamacare que foram originalmente estendidos na lei de resposta à pandemia aprovada no ano passado também serão alargados durante mais três anos.
O imposto mínimo de 15% sobre as grandes empresas que têm mais de mil milhões de dólares de rendimentos também vai avançar. Espera-se que a medida renda 300 mil milhões aos cofres do Estado.
Já a taxa que seria cobrada sobre os lucros que vão para os executivos de empresas de gestão de património privado (que iria render 13 mil milhões) acabou por cair durante as negociações com Kyrsten Sinema. Em vez disso, foi introduzido um imposto especial de consumo de 1% sobre a recompra de acções que deve entrar em vigor em 2023 que se estima que traga cinco vezes mais dinheiro ao Estado.
Outras ambições dos mais progressistas que acabaram por morrer na praia incluem a gratuitidade das creches e das universidades públicas gratuitas e o reforço nos cuidados para os idosos.
De olho nas intercalares
Depois de ter visto muita da sua agenda política morrer no Congresso ou então ser muito diluída para se conseguir a aprovação, o avanço do Inflation Reduction Act dá um novo fôlego à presidência de Biden.
Os constantes impasses políticos têm feito mossa na popularidade do chefe de Estado, assim como a escalada dos preços e a falta de reformas às leis das armas. No agregador de sondagens FiveThirtyEight, Biden tem uma taxa de aprovação de apenas 39,3%, sendo que 55,6% dos norte-americanos desaprovam a sua conduta na Casa Branca.
Estes números desanimadores de Biden são um mau agoiro para os Democratas. Na tradição política norte-americana, o partido do Presidente costuma sempre perder lugares nas eleições intercalares para o Congresso — e a falta de popularidade de Biden pode fazer grandes estragos nas esperanças do partido de segurar as duas Câmaras, especialmente o Senado, onde os Republicanos já tem 50 dos 100 lugares.
Com a nova lei, os Democratas ganham dois novos trunfos eleitorais — o combate às alterações climáticas, que é um dos problemas que mais preocupa os eleitores, especialmente os mais jovens, e a redução dos preços dos medicamentos, que é uma medida importante para os mais velhos.
Juntando-se a isto a recente decisão do Supremo de reverter o direito ao aborto, algo a que as sondagens indicam que a maioria dos norte-americanos se opõem, Biden ganha assim uma almofada para tentar reverter a derrota que os Democratas parecem estar destinados a sofrer nas intercalares.
Um Presidente que parece uma estátua falante. Um octogenário sem pedalada.
Mas ganhou ao idiota do Trump…