As bancarrotas não são de agora. Análise a moedas romanas comprova crise financeira (e resolve debate histórico longo)

A investigação descobriu que as moedas romanas de prata pura passaram a conter também 10% de cobre, o que decifra o significado de uma misteriosa frase no ensaio De Officiis, de Marcus Tulius Cicera.

Muito antes de existirem bancos, mercados da bolsa, troikas ou FMIs, as crises económicas já se faziam sentir. Uma nova análise à composição de moedas romanas revelou mais detalhes sobre a crise financeira brevemente referida por Marcus Tulius Cicera no seu ensaio sobre a liderança moral — De Officiis — e pôs fim a um debate histórico antigo.

A descoberta foi feita por uma equipa de investigadores das Universidades de Warwich e de Liverpool, que analisaram moedas do período e notaram uma desvalorização muito maior destas do que os historiadores acreditavam, com moedas que eram inteiramente de prata antes de 90 A.C. a já incluírem 10% de cobre apenas cinco anos mais tarde.

“Os romanos estavam habituados a moedas de prata extremamente fina, por isso podem ter perdido confiança no dinheiro quando estas deixaram de ser puras. O nível preciso de desvalorização pode ter sido menos importante para os contemporâneos do que a mera realização de que a moeda foi adulterada e já não era feita de ‘prata verdadeira'”, revela Matthew Ponting, da Universidade de Liverpool.

Já Kevin Butcher, da Universidade de Warwick, refere que o puzzle da frase de De Officiis referente a “moedas que estão a ser atiradas, para que ninguém possa perceber o que têm” foi finalmente resolvido, depois de muitos historiadores debaterem este significado durante anos.

A referência faz parte de uma história que descreve comportamentos egoístas de Marius Gratidianus, que ficou com os louros pela proposta da reforma das moedas que foi criada em conjunto pelos tribunos e pelo colégio de pretores e que se tornou muito popular com o público.

Kevin Butcher explica o contexto da frase, referindo que nos anos depois de 91 A.C., o estado romano estava em risco de entrar em bancarrota e que em 86 A.C. já havia uma crise de confiança na moeda.

“Uma teoria é que Gratidianus concertou a taxa de câmbio entre as moedas de prata e de bronze. Outra é de que ele tenha publicado um método para detetar dinheiro falso, e assim restaurou a confiança nas moedas. Infelizmente, as palavras de Cicero são demasiado obscuras para os historiadores determinarem exatamente o que se passava”, refere o investigador.

O projeto de investigação de cinco anos Rome and the Coinages of the Mediterranean 200 BCE — 64 CE pretende revelar novas informações sobre as economias do Império Romano e de outros estados banhados pelo Mediterrâneo ao analisar a composição das moedas e fazer o cruzamento das descobertas com os registos históricos que já conhecemos.

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