Louvado como um dos melhores avançados de sempre por Luís Figo, Pelé ou Lothar Matthäus, Cha Bum-kun escreveu a primeira página de glória do futebol sul-coreano — contra todas as adversidades.
Quando pensamos em alguns dos maiores avançados da história do futebol, provavelmente não nos vem à cabeça nenhum nome sul-coreano. Ora, Lothar Matthäus parece não concordar com esta perspetiva.
Em 1980, depois de uma derrota na final da Taça UEFA frente ao Eintracht Frankfurt, o então jogador do Borussia Mönchengladbach não hesitou ao apontar Cha Bum-kun como o “melhor avançado do mundo”.
Numa final jogada a duas mãos, o Borussia até começou por vencer o primeiro encontro por 3-2, mas viria a perder por 1-0 na segunda partida. Cha Bum-kun não marcou em nenhum dos jogos, mas a sua movimentação inteligente dentro da grande área deixou Matthäus nas covas, dando-lhe ‘via verde’ para servir Fred Schaub para o golo.
“Eu sou jovem”, disse, na altura, o germânico. “Cha Bum é o melhor avançado do mundo”.
Com o apelido de “Tscha Bum”, Cha Bum-kun foi talvez o melhor jogador coreano de sempre, lado a lado com Park Ji-Sung e Heung-min Son.
Tscha Bum começou a jogar na Korea University, rapidamente afirmando-se como um jogador de grande qualidade. Apenas com 18 anos, tornou-se o mais jovem jogador a estrear-se pela seleção sul-coreana.
Depois de sair da universidade, o coreano mudou-se para o Korea Trust Bank, em 1976. Mas tão depressa chegou como saiu do seu novo clube, vendo-se obrigado a cumprir o serviço militar obrigatório. Foi então que se mudou para o South Korean Air Force FC, a equipa de futebol da Força Aérea.
Tscha Bum deu-se a conhecer ao mundo do futebol na Taça do Presidente, em que o Eintracht Frankfurt participou.
O treinador-adjunto do Eintracht, Dieter Schulte, identificou o potencial de Cha, que o levou a instar a Federação Coreana de Futebol a permitir a dispensa antecipada do atacante.
No entanto, foi o Darmstadt que assegurou a contratação do jogador, que apenas fez um jogo oficial pelo clube, antes de voltar a ser chamado para cumprir o resto do serviço militar.
No ano seguinte, Tscha Bum acabaria por juntar-se ao emblema de Frankfurt, onde pavimentou o caminho para a entrada de jogadores asiáticos na Alemanha.
Tornou-se um favorito dos adeptos, não só marcando golos regularmente, mas mantendo também um registo disciplinar praticamente inviolável: apenas um cartão amarelo em toda a sua carreira na Bundesliga.
Além da conquista da Taça UEFA em 1980, voltaria a repetir o feito mais tarde, ao serviço do Leverkusen, em 1988.
Cha Bum-kun’s nickname: “Tscha Boom!” (Cha-boom!) for his goalscoring abilities!
52 goals in 185 matches!#FlashbackBayer #FBF pic.twitter.com/gAQ96uZ5BM
— Bayer 04 Leverkusen (@bayer04_en) June 9, 2017
O seu legado em Frankfurt é invejável, onde até tem uma banda de indie-rock inspirada em si: os Bum Khun Cha Youth.
“Recordo sempre com alegria os dez anos que passei na Alemanha”, confessou Cha. “Ainda me lembro da emoção que senti quando os adeptos torceram por mim durante os jogos, e da festa da cidade quando levantei o troféu da vitória. A Bundesliga proporcionou-me os momentos mais maravilhosos da minha vida. Ainda estou cheio de felicidade sempre que penso na Alemanha. Recebi muito amor dos adeptos durante os meus anos lá”.
Heung-min Son, jogador já referido anteriormente que é visto como um dos maiores talentos de sempre do futebol asiático, já foi comparado a Tscha Bum e revela como reage: “Cada vez que sou comparado ao Cha, sinto-me envergonhado e muito honrado”, disse o jogador do Tottenham. “Vou-me esforçar mais para ter certeza de que mereço tal elogio”.
O próprio ex-internacional português Luís Figo chegou a admitir que Cha Bum-kun era o seu “maior herói”. O lendário defesa italiano Paolo Maldini considerou-se também um sortudo por nunca ter defrontado o avançado sul-coreano. “Tscha Bum sabe verdadeiramente jogar futebol”, sentenciou Pelé, incontestavelmente um dos melhores jogadores de sempre.
Em 1991, já com as chuteiras penduradas, Tscha Bum aventurou-se na carreira de treinador. Depois de três anos no comando técnico do Hyundai Horang-i, da K-League, o icónico avançado foi chamado para guiar a Coreia do Sul no Campeonato do Mundo de 1998.
Foi um verdadeiro desastre. Cha Bum-kun foi despedido após apenas dois jogos. Primeiro, começou por perder por 3-1 frente ao México. A goleada sofrida frente à França (5-0) ditou o despedimento precoce do selecionador. Tscha Bum nem teve oportunidade de realizar o último jogo da fase de grupos, frente à Bélgica — jogo que terminaria empatado a uma bola.
Cha culpou a Federação Coreana de Futebol pelo fracasso da seleção, alegando que as partidas da primeira divisão do país eram manipulados. Além disso, disse que a falta de bónus gerou descontentamento entre os jogadores.
A federação não reagiu bem às acusações do seu lendário atleta e baniu Cha Bum-kun por cinco épocas. O mesmo jogador que trouxe o nome do futebol sul-coreano à ribalta estava agora proibido de treinar no país durante meia década.
Por sua vez, na Alemanha, Cha recebeu a Cruz de Mérito Federal do governo germânico pelo seu papel de fomentar as relações entre Alemanha e Coreia do Sul.
Tscha Bum fez mais de 300 jogos na Bundesliga, marcando quase 100 golos. Nunca bateu um penálti. Ao serviço da Coreia do Sul, marcou 55 golos em 121 internacionalizações.