Mário Centeno, atual governador do Banco de Portugal, defende que o Orçamento do Estado para 2021 deve “olhar para o futuro próximo” e que o país precisa de “reforço do capital social e não apenas de fundos europeus”.
O Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, disse esta quinta-feira que o país tem de estar preparado para o momento da recuperação da pandemia, sustentando que o Orçamento deve olhar para o futuro próximo, o que o OE2021 consegue.
Falando na sessão de encerramento da 16.ª Conferência Anual da Ordem dos Economistas sobre o OE2021, Centeno defendeu a necessidade de manter “o país preparado para o dia em que se inicie, de facto, a eliminação da crise pandémica”, o que acredita que acontecerá num “momento próximo”, sustentando que o orçamento “deve olhar para o futuro próximo”.
Este objetivo, sublinhou, é conseguido com a proposta inicial de OE2021 “ao centrar as medidas orçamentais em instrumentos temporários e flexíveis, que podem ser estendidos, modulados, adaptados ao desenvolvimento da crise sanitária”.
Durante a sua intervenção o governador do Banco de Portugal salientou, por isso, que se deve evitar “a todo o custo, afastar trabalhadores de empresas”, de forma a não destruir a sua capacidade produtiva e a criar condições para “ter todas as funções da economia capazes de atuar para quando as encomendas voltarem a chegar” e para que as empresas não percam o contacto com os seus mercados.
Salientando o impacto económico e social e a incerteza causada pela pandemia, Mário Centeno referiu que é neste contexto que devem ser avaliadas a execução do OE2020 e o papel do OE2021.
“Tal como enfrentamos neste momento, enquanto não existir vacina, entramos em mais uma fase de incerteza e de redução da atividade”, apontou o governador do Banco de Portugal (BdP), adiantando ser esta “mais uma razão” para que o OE2021 “seja cauteloso, flexível e generoso no apoio de curto prazo a empresas e trabalhadores” e mudando “de forma faseada, mas decisiva o foco dos apoios, passando da manutenção do emprego ao apoio à criação de novo emprego”.
Acentuando que ao país “não se pede neste momento uma transformação estrutural”, Centeno vincou que os recursos europeus devem ser utilizados para “consolidar uma trajetória que vinha sendo seguida” no âmbito da digitalização e modernização da economia.
Neste contexto, referiu, os projetos a financiar devem ser estruturantes, mas produtivos, ou seja, “não devem deixar heranças para pagar no futuro”, uma vez que “a situação económica do país no final de 2019 não clamava por um mundo novo, mas tão só por projetos estruturantes e produtivos”.
“Desviar a nossa atenção da resposta à crise provocada pela pandemia, tratando-a como se ela fosse estrutural, vai atrasar a recuperação e criar dificuldades desnecessárias”, precisou, alertando que “o peso da dívida pública não será um fardo para o futuro se os projetos agora financiados se pagarem a si mesmos”, o que implica que se seja exigente com o seu planeamento e execução.
Numa alusão ao debate na especialidade e às propostas de alteração que todos os anos são entregues, Centeno observou que o Orçamento do Estado é “aditivado de matérias que deveriam ter outro espaço e momento de debate”, exemplificando com alterações à lei laboral, a diplomas orgânicos de diversas entidades ou “as próprias normas programáticas”.
Neste contexto, precisou que “a dimensão financeira absoluta atingida” pelo OE “merece de todos os intervenientes um sentido de responsabilidade que por vezes não se vislumbra na forma como o seu debate é conduzido”.
Considerando que um OE deve fazer escolhas pensando não apenas no presente, mas também no futuro, deve por isso refletir sobre a dívida pública, rejeitando a ideia de que este não é o momento para este tipo de preocupações.
É que, “mesmo que assim seja, devemos ser muito exigentes com a forma como utilizamos os recursos que são comuns e que sendo também europeus são necessariamente portugueses”, pelo que o pais deve centrar a sua atenção no combate a uma crise temporária, e não estrutural, “através de medidas precisamente temporárias e não estruturais”.
Na sua intervenção, o governador do Banco de Portugal apontou a resposta das políticas e dos agentes económicos à crise desencadeada pela covid-19, que classificou de “exemplar”.
O governador do banco central referiu ainda a a diferença entre as crises de 2008 e sequela de 2011 e a atual ao nível da resposta da União Europeia e do papel do sistema financeiro, salientado que, no contexto atual, “os bancos fizeram parte da solução, não foram parte do problema”.
Sobre o futuro próximo, “a ação dos bancos centrais deverá continuar a mostrar toda a disponibilidade, flexibilidade e rapidez de atuação a que assistimos até aqui”, acrescentou.
ZAP // Lusa