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Último debate. Boris defendeu o Brexit e Corbyn falou da Saúde (pelo menos 15 vezes cada um)

(h) Jeff Overs / BBC / EPA

No debate televisivo, transmitido pela BBC, o último antes das eleições da próxima quinta-feira, Boris Johnson defendeu que é o melhor preparado para concretizar o Brexit e terminar com o impasse no processo, prometendo ainda um grande reforço de polícias na rua. 

Jeremy Corbyn respondeu às acusações de anti-semitismo com a mesma arma: classificou o atual primeiro-ministro como islamofóbico por ser autor de declarações que definiu como racistas, insistindo também o líder trabalhista que os conservadores querem privatizar o sistema de saúde e outros serviços públicos. No final, parece ter havido um empate, com os apoiantes de ambos a ficarem satisfeitos.

Boris procurou atacar o candidato do Labour com o anti-semitismo de que tem sido muito criticado. “Acho que a sua falta de vontade em se posicionar e defender o povo judeu no Partido Trabalhista é um fracasso de liderança”, disse Johnson.

Corbyn recordou artigos antigos de Boris em que se referiu aos islâmicos de forma que o trabalhista diz ser depreciativa: “Uma falha de liderança é quando você usa comentários racistas para descrever pessoas de diferentes países na nossa sociedade. Eu nunca farei isso.”

O modelo de debate levou a que os dois começassem por fazer breves declarações e depois responderam a perguntas da audiência representativa de diferentes opiniões políticas e origens geográficas, refletindo ainda o resultado do referendo sobre o Brexit de 2016, com uma pequena maioria de eurocéticos.

Enquanto Boris Johnson começou pelo dilema que o país enfrenta nas eleições de quinta-feira relativamente ao Brexit e prometeu “pôr fim à paralisia”, Corbyn evitou referir aquele tema para enfatizar a pobreza infantil e desigualdade social existente no país.

Várias perguntas centraram-se na questão da saída do Reino Unido da União Europeia, tendo Boris Johnson aproveitado para questionar o plano do Partido Trabalhista para negociar um novo acordo e submetê-lo a um novo referendo, com a opção para permanecer na UE. “Não pode acabar com a incerteza no Brexit se não souber qual é o acordo que deseja fazer”, alegou o primeiro-ministro, acusando o adversário de um “fracasso da liderança” por querer manter-se neutro e não tomar uma posição.

Corbyn respondeu que o plano é uma solução que pretende proteger postos de trabalho e relações comerciais com a UE e ao mesmo tempo dar aos eleitores uma palavra final, em vez de ser decidido pelos deputados. “O país precisa de se unir e não pode continuar a negociar e a discutir consigo próprio”, argumentou.

Sem momentos decisivos, destacaram-se intervenções de Boris Johnson, quando troçou de Corbyn e disse que vieram do “triângulo das Bermudas” os documentos que alegadamente mostram o interesse de empresas privadas norte-americanas no sistema público de saúde britânico, ou quando o líder trabalhista, a propósito do capitalismo, afirmou: “Fomos longe demais na economia de livre mercado e criámos muita desigualdade”.

De acordo com o Observador, Boris Johnson disse “Brexit” um total de 15 vezes e a palavra “acordo” subiu às 26 — já descontando a vez em que o primeiro-ministro utilizou a palavra “deal” como forma verbal.

Jeremy Corbyn falou do NHS (sigla para o serviço nacional de saúde do Reino Unido) um total de 15 vezes, procurando protegê-lo da “austeridade” (4 vezes) e de um acordo com os EUA que aproxime aquele sistema público de algum tipo de privatização. As menções ao país do Tio Sam foram 8.

Sondagens apontam para maioria absoluta de Boris

Uma maioria absoluta do Partido Conservador é o resultado mais provável das eleições legislativas britânicas de 12 de dezembro, mas ainda é possível que os eleitores decidam manter o Parlamento dividido, dizem os especialistas em sondagens.

Para o diretor da empresa Ipsos Mori, Ben Page, a vitória dos tories é uma consequência da “exaustão” dos britânicos com o processo do Brexit e uma escolha do “melhor” entre dois maus líderes partidários, Boris Johnson e Jeremy Corbyn.

“Parece que os conservadores vão ganhar as eleições, alimentadas por uma exaustão geral. A divergência sobre o Brexit esgotou toda a gente, apesar de todo o processo ser uma confusão total. O público cansou-se e escolheu o candidato mais provável para completá-lo e, também, o melhor entre os maus, que é Boris Johnson”, afirmou à agência Lusa.

O estudo de opinião mais recente desta empresa, divulgado na sexta-feira, indica uma vantagem de 12 pontos percentuais entre os 42% de intenções de voto no Partido Conservador e 32% no Partido Trabalhista, enquanto que os Liberais Democratas caíram para 13% e o Partido do Brexit para 2%.

Outras sondagens têm mostrado diferenças maiores ou mais menores, entre 15% e 6%, mas a média tem sido em redor dos dez pontos ao longo das quatro semanas de campanha desde que as eleições foram convocadas, no final de outubro, e sempre com o Labour em segundo lugar.

A mesma sondagem da Ipsos Mori confirma tendências registadas por outros estudos: os britânicos têm uma imagem negativa do primeiro-ministro e líder conservador, Boris Johnson, resultando numa classificação negativa de -20, mas a do líder trabalhista, Jeremy Corbyn, é muito pior, de -44. “A diferença ainda é maior do que entre os partidos”, vinca Page.

Os especialistas em sondagens têm sido cautelosos nas previsões devido aos erros registados nas eleições legislativas de 2017, quando a maioria das sondagens não antecipou uma recuperação de Jeremy Corbyn relativamente a Theresa May, fazendo os conservadores perderem a maioria absoluta.

Na altura, o único estudo que previu um Parlamento sem maioria absoluta [hung parliament] foi da empresa YouGov, usando um método inovador chamado Multilevel regression and poststratification (MRP), que prognosticou com sucesso a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos EUA em 2016.

A única sondagem que aplicou esta metodologia nestas eleições legislativas de 12 de dezembro foi publicada pelo jornal The Times no final de novembro e concluiu em geral o mesmo que as outras sondagens, ou seja, que o Partido Conservador vai ter uma maioria absoluta confortável.

O académico John Curtice, descrito muitas vezes como “guru das sondagens” devido à experiência e idoneidade, adiantou que estas eleições estão a ser marcadas pelo Brexit e que o Partido Conservador conseguiu concentrar mais votos dos eleitores eurocéticos do que o Trabalhista dos eleitores pró-europeus.

“Os Conservadores têm agora 70% dos votos dos eleitores favoráveis à saída, enquanto que o Labour tem apenas metade do voto dos que querem ficar [na União Europeia]. E é esse diferencial que é absolutamente central para o resultado provável destas eleições”, disse, num encontro com jornalistas estrangeiros.

Mas também lembrou exemplos de eleições com reviravoltas dramáticas como, por exemplo, em fevereiro de 1974, quando o primeiro-ministro conservador, Edward Heath, conseguiu mais votos, mas elegeu menos três deputados do que o trabalhista Harold Wilson.

“Nem o modelo MRP nem as sondagens normais nos dizem o que pode acontecer nos próximos dias, nem se as coisas podem mudar“, alertou Joe Greenwood, académico da universidade London School of Economics, especialista em opinião pública e participação política.

Uma das dificuldades das previsões eleitorais no Reino Unido é o sistema de voto de maioria simples [First Past the Post] em círculos uninominais, onde as vitórias podem ser influenciadas por fatores locais e decididas por poucos votos.

Os especialistas concordam que, atualmente, Boris Johnson encaminha-se para uma maioria absoluta dos 650 assentos da Câmara dos Comuns, cuja proporção pode variar, mas se a margem para o Partido Trabalhista descer para apenas 6%, o risco de um Parlamento dividido é maior.

“O desafio com o sistema eleitoral britânico é que não temos representação proporcional. É possível obter 35% dos votos, como Tony Blair [em 2005] e conseguir uma maioria, ou 36% como David Cameron [em 2010] e não ter deputados suficientes e ser obrigado a formar uma coligação”, explicou Ben Page à Lusa.

ZAP // Lusa

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