Cientistas liderados pela portuguesa Ana Ferreira concluíram que o manto terrestre flui mais dinamicamente do que se pensava, com implicações no arrefecimento mais rápido do interior da Terra e na evolução do planeta.
O manto, que controla a ocorrência de sismos e erupções vulcânicas, é a camada da estrutura interna da Terra que fica entre a crosta e o núcleo. Há um manto superior, entre os cerca de 30 e 660 quilómetros de profundidade, e um inferior, entre os 660 e os cerca de 3.000 quilómetros de profundidade.
No manto, o movimento do material rochoso muito quente que o compõe, em estado mais pastoso ou mais fluido consoante a profundidade, caracteriza-se por ser muito lento ao longo do tempo. A tese que prevalecia é que esse movimento aumentava a uma profundidade até 660 quilómetros (manto superior).
Ana Ferreira, investigadora do Departamento de Ciências da Terra da University College London, no Reino Unido, e a sua equipa descobriram que o manto inferior é, afinal, na zona mais no topo, mais dinâmico do que se pensava anteriormente.
“Se é mais dinâmico, isto sugere que o interior do nosso planeta esteja a arrefecer mais rapidamente”, assinalou à Lusa a especialista em sismologia, explicando que o arrefecimento do interior da Terra se deve ao calor que é transmitido do núcleo, formado por ferro líquido muito quente, para o manto e do manto para a crosta.
Segundo os autores do estudo, publicado na revista Nature Geoscience, a descoberta poderá ajudar a entender a própria dinâmica da evolução da Terra e de outros planetas do Sistema Solar, como Vénus, que é semelhante à Terra em termos de tamanho, massa e composição, mas que não tem placas tectónicas.
“Percebendo a dinâmica do nosso planeta com mais detalhe, no futuro ajudará a perceber a origem das placas tectónicas e da própria vida na Terra”, sustentou Ana Ferreira, acrescentando que as placas tectónicas mantêm “o clima estável” no planeta.
O grupo coordenado pela investigadora portuguesa descobriu que o topo do manto terrestre inferior é mais dinâmico do que se pensava antes, sobretudo na América do Sul, no Japão, nas Filipinas e no Tonga, zonas onde “antigos fundos de oceanos, densos e frios” atravessaram o manto terrestre ao longo de milhões de anos.
Para chegar a esta conclusão, a equipa, que incluiu cientistas de Itália e da Coreia do Sul, construiu imagens computorizadas do interior da Terra a partir das ondas sísmicas resultantes de tremores de terra e que foram registadas nos últimos 20 anos por sismógrafos um pouco por todo o mundo.
Depois, com métodos computacionais avançados, simulou a evolução do manto terrestre e verificou a compatibilidade dos cenários com as imagens.
De acordo com Ana Ferreira, o mecanismo de movimento que “domina no manto superior” é igualmente extensível ao manto inferior, com os especialistas a atribuírem este movimento a “defeitos nas redes cristalinas das rochas a grande escala” que o compõem.
Numa próxima etapa da investigação, a mesma equipa científica pretende aferir se a mesma dinâmica do manto terrestre se se verifica em regiões em que “material quente”, fruto da “interação entre manto e núcleo”, subiu para superfície. São “candidatos” a essas regiões, como chama Ana Ferreira, os arquipélagos dos Açores, das Canárias, do Hawai, das Galápagos e do Tonga.
// Lusa