A Unidade de Transplantes Hepáticos do Hospital Universitário de Coimbra realizou um auto-transplante de fígado, uma cirurgia inovadora e rara no Mundo que, basicamente, leva a que o órgão seja operado fora do corpo do doente.
A cirurgia realizada na Unidade de Transplantação Hepática Pediátrica e de Adultos do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) ocorreu há cerca de um mês e o doente “já teve alta e encontra-se muito bem”, revela o cirurgião Emanuel Furtado.
O procedimento foi motivado por um tumor e “o fígado foi operado fora do corpo e posteriormente colocado novamente no doente”, explica à agência Lusa Emanuel Furtado, o coordenador da unidade do CHUC.
O cirurgião salienta que apenas “meia dúzia de centros no mundo” realizam este tipo de operação.
“Esta intervenção, bem como a divisão de um só fígado por dois recetores (‘splits’), é o corolário da elevada competência técnica que a equipa foi adquirindo”, frisa Emanuel Furtado, realçando que pretende continuar a aumentar essa capacidade técnica, nomeadamente para formar outros cirurgiões que venham a operar autonomamente, numa perspectiva que não se limita apenas aos transplantes.
Transplante triplo de um só fígado
Muito recentemente, a unidade esteve quase a realizar um transplante triplo de um só fígado, cuja cirurgia é também “muito rara” e que “só não aconteceu porque houve problemas técnicos“, diz o cirurgião.
“É um procedimento muito raro, para o qual é preciso um conjunto de condições, mas que está nos nossos objectivos”, diz, realçando que o número de transplantes de fígado aumentou este ano nesta unidade.
A Unidade de Transplantação Hepática, reactivada em 2012 na componente pediátrica, já tinha ultrapassado o número de transplantes realizados em 2015, com 60 adultos e nove crianças transplantadas até final de Outubro de 2016, contra os 50 e 12 do ano passado, respectivamente.
Em 2011, o CHUC transplantou 44 adultos; em 2012, 11 crianças e 27 adultos; em 2013, 12 crianças e 59 adultos; e em 2014, 12 crianças e 48 adultos.
O aumento do número de transplantes deveu-se, em parte, ao recurso à divisão de um só fígado por dois receptores, técnica que já executou quatro vezes este ano.
Sem listas de espera na pediatria
Segundo o coordenador da unidade, na valência pediátrica não existe lista de espera, depois de recentemente terem sido transplantadas uma criança de 10 meses e uma adolescente de 16 anos com recurso ao mesmo fígado.
No caso dos adultos, e apesar de existirem “muitas pessoas em consulta e avaliação”, a lista de espera é constituída por “18 a 20 doentes, que é um número muito estável”, refere Emanuel Furtado.
Relativamente ao tempo que medeia até à cirurgia, o cirurgião destaca que há doentes que não demoram um mês a ser transplantados, mas que há outros que demoram um ano, “por condicionantes que não se conseguem controlar”, nomeadamente os grupos de sangue.
“Ao nível dos melhores hospitais do mundo”
O presidente do conselho de administração, Martins Nunes, destaca que “o que se faz hoje no CHUC na transplantação hepática, no adulto e em crianças, está ao nível do que de melhor se faz nos melhores hospitais do mundo”.
“A intervenção de auto-transplante de fígado agora anunciada ou a realização de ‘splits‘ são técnicas de execução muito complexas, só praticadas nos melhores centros mundiais, pelo que exigem alta diferenciação e elevado treino das equipas que os realizam”, sublinha.
Martins Nunes recorda ainda o sofrimento a que assistiu das crianças portuguesas em Madrid, em 2011, depois de Portugal ter interrompido o programa de transplantação hepática pediátrica [as crianças necessitavam de sair de Portugal para serem transplantadas].
“Essas imagens tristes, que guardo para sempre, fizeram-me criar a convicção de que tínhamos que ser capazes de recuperar a esperança destas crianças e das suas famílias e de construir uma unidade que estivesse ao nível das melhores do mundo“, frisa.
Martins Nunes diz ainda ter a certeza de que “os portugueses têm razões para ter muito orgulho nos profissionais de saúde e nos médicos deste Hospital” e que se revêem “no humanismo, na competência e na ambição do CHUC”.
ZAP / Lusa