Ao montar um detetor para registar a ausência de fotões numa experiência com laser, uma equipa de físicos demonstrou um bizarro efeito de arrefecimento.
No estranho mundo da mecânica quântica, o nada nunca é realmente nada. Agora, descobrimos que esse nada — ou a ausência de um fotão — pode ser utilizado para arrefecer coisas.
Uma das formas mais comuns de os cientistas arrefecerem as coisas é através da utilização de lasers.
Quando as partículas de luz, ou fotões, com uma frequência específica atingem um átomo ou molécula, esta absorve o fotão e depois dispara outro fotão com uma energia ligeiramente superior, o que arrefece o sistema no seu todo.
Mas, estranhamente, ao colocar um detetor de fotões junto a um átomo para contar os fotões emitidos, o laser faz aumentar a temperatura do sistema. Isto acontece porque, na mecânica quântica, o ato de medir uma dada propriedade pode alterar o estado de um sistema.
Este é o chamado Princípio da Incerteza de Heisenberg, que na realidade são dois: no mundo quântico, não se pode medir uma propriedade sem a alterar, porque a energia usada na medição altera a propriedade medida; e não se pode medir com a mesma precisão e ao mesmo tempo a posição e velocidade de uma partícula, porque ao medir a velocidade alteramos a posição — e vice versa.
Assim, medir a posição de um eletrão, por exemplo, muda-o de uma nuvem de probabilidades de posições possíveis para um lugar específico.
Do mesmo modo, a deteção de um fotão confirma que o sistema tinha energia suficiente para produzir esse fotão, e a sua medição aumenta a sua energia, ou temperatura.
“Se estivermos sentados debaixo de uma macieira e não soubermos quantas maçãs há na árvore por cima de nós, mas uma cai e bate-nos na cabeça, podemos pensar: ‘Oh, provavelmente há mais maçãs lá em cima do que eu pensava inicialmente'”, explica Michael Vanner do Imperial College de Londres, citado pela New Scientist.
Agora, Vanner e os seus colegas descobriram que a instalação de um detetor para procurar a ausência de fotões tem o efeito oposto e pode tornar os objetos mais frios quando não foi detetado qualquer fotão.
No seu estudo, recentemente pré-publicado no arXiv, a equipa de investigadores disparou um laser de infravermelhos contra uma pérola de vidro com 200 micrómetros de largura, ou seja, duas vezes a largura de um cabelo humano.
Isto produziu ondas sonoras que viajaram através da pérola de vidro e geraram a sua própria radiação, que abrandou e arrefeceu as ondas num cenário convencional de arrefecimento por laser.
Junto à pérola, os investigadores colocaram um sistema que procura a ausência de fotões, com dois detetores: um concebido para medir apenas um ou nenhum fotão, e outro que regista todos os fotões emitidos pela pérola.
Comparando os detetores, Vanner e a sua equipa puderam registar os momentos em que não foram emitidos quaisquer fotões — o que significa que não havia ondas sonoras com energia suficiente para produzir luz, o que equivale a um sistema global mais frio.
O efeito de arrefecimento é pequeno nesta experiência, que se destinava a ser uma prova de conceito, diz Vanner, mas pode ser útil para armazenar informação numa futura Internet quântica.
“Se quisermos sincronizar sinais quânticos de luz, ou se quisermos armazená-los e libertá-los de forma controlável entre operações num computador quântico, precisamos de uma memória quântica“, diz Vanner.
Estas ondas sonoras podem durar o tempo suficiente para atuar como uma memória quântica, na ordem dos milissegundos, e podem ser facilmente convertidas na frequência da luz utilizada nas redes quânticas, afirma.
“O que torna o mundo quântico interessante, diz Cory Nunn, investigador do Instituto Nacional de Normas e Tecnologia, em Maryland, que não esteve envolvido no estudo, “é o facto de mesmo a ausência de algo continuar a ser uma coisa“.