“Pedido de casamento” à geringonça e ataque feroz a Rio. Costa quer país do futuro a liderar no hidrogénio

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Manuel de Almeida / Lusa

António Costa abriu o debate do estado da nação com uma declaração de amor à geringonça, defendendo que Portugal precisa de um entendimento político sólido para fazer face à actual crise pandémica. O primeiro-ministro também procurou distanciar-se de Rui Rio e do PSD.

“Precisamos de uma base de entendimento sólida e duradoura. Se foi possível antes, certamente terá de ser possível agora. Se foi útil antes, revela-se indispensável agora, ante o desafio de vencer uma crise pandémica como aquela que nos assola”. A declaração de amor à geringonça surgiu no discurso de António Costa que abriu o debate do Estado da Nação, nesta sexta-feira.

O primeiro-ministro lembrou que entre as forças de esquerda no Parlamento “são várias as posições conjuntas que os aproximam“, citando, nomeadamente, “o desígnio de reforçar a capacidade produtiva e a valorização dos nossos recursos”, “a prioridade ao fortalecimento dos serviços públicos”, “o reforço do investimento público”, “o combate às precariedades na habitação e no trabalho” e “a luta contra as desigualdades”.

Assim, defendeu que “é possível estruturar um roteiro de acção a médio/longo prazo, sem prejuízo das conhecidas diferenças que definem a identidade de cada um, ou das visões distintas sobre a Europa e a importância da estabilidade do quadro macroeconómico, com que temos sabido conviver”.

O primeiro-ministro insistiu, desta forma, num acordo de legislatura com Bloco de Esquerda, PCP, PAN e PEV que permita a “transformação estrutural do país”.

“A resposta a esta crise não passa pela austeridade ou por qualquer retrocesso nos progressos alcançados nos últimos cinco anos. É com os partidos que connosco viraram a página da austeridade que queremos prosseguir o caminho iniciado em 2015″, realçou, apelando a “um quadro de estabilidade no horizonte da legislatura”.

“Infelizmente não podemos contar com o PSD”, analisou ainda Costa, acusando os sociais-democratas de serem “o partido dos velhos do Restelo”.

Rio critica “pedido de casamento” com papel assinado

O ataque de Costa ao PSD surgiu depois de Rui Rio ter ironizado com a ideia de um “pedido de casamento” do primeiro-ministro ao Bloco de Esquerda e ao PCP.

O presidente do PSD avisou que Portugal “já fez asneiras a mais” e pediu garantias de que não haverá “mais ‘negócios da China'” no investimento na produção de hidrogénio, que classificou como “projecto extremamente perigoso”.

“Nós não temos condições para aventuras nem para ideias megalómanas”, defendeu Rui Rio numa intervenção inicial totalmente dedicada a este assunto, à excepção da ironia sobre o apelo de Costa a um novo entendimento à esquerda.

O líder do PSD questionou que, na estratégia nacional sobre o hidrogénio, o Governo preveja investir “sete mil milhões de euros”, valor próximo do da Alemanha, nove mil milhões de euros.

“Pode assegurar na Assembleia da República que, para a produção de hidrogénio, não vamos assistir a rendas garantidas, leia-se excessivas, que aconteceram no governo Sócrates, pode garantir que não vai repetir os mesmos erros?”, questionou.

Na resposta, António Costa assegurou que Portugal vai ter “uma posição liderante” na produção de hidrogénio verde na Europa porque o país tem “condições naturais para o fazer” e porque tal representa um “factor importante para a mobilização da indústria nacional e para a valorização geo-estratégica” do país.

“O leilão que abrimos gerou intenções de investimento privado de 16 mil milhões de euros, a contrapartida de investimento público são 400 milhões de euros ao longo de dez anos”, afirmou, considerando que tal significa que haverá uma “ajuda pública mínima” comparativamente ao dinheiro privado.

Costa também acusou o PSD de estar fossilizado e de ser composto por “velhos do Restelo”.

“É chocante verificar como o PSD nada aprendeu com a história. O PSD tornou-se um partido do conservadorismo atávico, foi contra as renováveis e chegou tarde. Agora, é contra o hidrogénio, está fossilizado na defesa das energias fósseis. Infelizmente, não podemos contar com o PSD para construir um país do futuro. O PSD é hoje o partido dos ‘velhos do Restelo’, daqueles que não têm a coragem de transformar as tormentas em ‘Boa Esperança’”, afirmou.

Bloco e PCP deixaram “pedido de casamento” no ar

Na primeira intervenção no debate do Estado da Nação, a líder do BE Catarina Martins fez questão de responder à intervenção inicial do primeiro-ministro.

“O BE propôs há menos de um ano ao PS um acordo formal para a legislatura. O PS recusou esse acordo e preferiu negociar orçamento a orçamento, coisa que aliás o BE tem feito como bem sabe”, começou por recordar Catarina Martins, colocando-se ao lado de Costa e defendendo que “o horizonte” do seu partido “sempre foi o da legislatura”.

“Nunca colocamos é o nosso mandato dentro da gaveta”, alertou contudo Catarina Martins.

Na resposta, Costa fez saber ao Bloco que “quem conseguiu que não houvesse maioria absoluta tem a responsabilidade agora de assegurar também que haja geringonça mesmo com um PS mais forte”.

O chefe do executivo escusou-se a discutir a história, mas assumiu que “as circunstâncias mudaram” desde o início da legislatura e que há “uma nova agenda que é comum“.

Também o líder do PCP deixou Costa sem uma resposta directa. “O caminho para um país mais desenvolvido e mais justo exige uma política de esquerda e patriótica”, afirmou Jerónimo de Sousa que também fez críticas ao PS por ter recusado o suplemento de penosidade e risco para os trabalhadores da Função Pública.

Para Jerónimo, foi um “péssimo sinal dado pelo PS”, com “a cambalhota” de recusar o suplemento e acusou os socialistas pelo facto de que, apesar das palavras de elogio aos trabalhadores, “soçobrem aos critérios do Ministério das Finanças”.

“Massacre chocante” e os fura-casamentos

No debate do Estado da Nação, o PAN pediu a demissão do director da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), acusando-o de falta de “humanidade” no âmbito da morte de vários animais num incêndio num canil em Santo Tirso. André Silva, líder do PAN, também criticou o ministro da Administração Interna, alegando que a GNR falhou na “prestação do dever de auxílio” enquanto os animais “agonizavam queimados vivos”.

Costa assumiu que foi um “massacre absolutamente chocante” e notou que o Governo aguarda os resultados do inquérito aberto ao caso.

Do lado do CDS, Cecília Meireles instou Costa a pôr “os pés na terra” depois do que definiu como um discurso “motivacional” sobre um “país das maravilhas”. A deputada centrista também criticou o “pedido de casamento à antiga geringonça” e referiu-se aos milhares de trabalhadores que estão em lay-off, questionando Costa sobre as medidas no âmbito das moratórias.

Por seu turno, o deputado do Chega, André Ventura, falou dos “olhinhos” que Costa tem feito ao PSD e salientou que “tem de ter cuidado” porque “os triângulos amorosos não costumam funcionar muito bem”. “É um aviso que deve ter em conta”, alertou sobre o apelo de Costa a uma nova geringonça.

Já o deputado do Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, queixou-se de uma “nação submissa” após o fim dos debates quinzenais. Cotrim Figueiredo também apelo a “transparência, velocidade, critério e racionalidade” na aplicação do pacote de fundos europeus atribuído a Portugal e criticou o plano de Costa e Silva para a recuperação do país, considerando que um “carrossel a meter água por todos os lados”.

Portugal vai receber 57,9 mil milhões de euros até 2029

O primeiro-ministro estimou que o montante total de transferências europeias para Portugal vai atingir 57,9 mil milhões de euros até 2029, frisando que agora será “uma enorme responsabilidade” a execução deste “envelope financeiro sem precedentes”.

Do ponto de vista político, António Costa aproveitou para deixar uma farpa quer às forças à direita quer à esquerda do PS, dizendo que o resultado do último Conselho Europeu confirmou o “acerto da estratégia” do Governo “e desmente, tanto aqueles que diziam que da Europa nunca viria uma resposta adequada à crise, como aqueles que diziam que pertencer à Europa era aceitar acriticamente as soluções austeritárias”.

No debate do Estado da Nação, Costa também revelou que “o esforço” actual da Segurança Social perante os efeitos da pandemia da covid-19 será suportado com verbas do orçamento, preservando a solidez do Fundo de Estabilização Financeira e sustentabilidade do sistema.

De acordo com o primeiro-ministro, antes da atual crise sanitária, o país “tinha conseguido reforçar a sustentabilidade do sistema de pensões em mais 29 anos, face ao projetado em 2015, permitindo dotar o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social com um valor superior a 20 mil milhões de euros pela primeira vez na sua história”.

No campo da solidariedade social, Costa considerou que já foi reforçado em 59 milhões de euros as transferências para instituições privadas de solidariedade social, mutualidades, misericórdias e cooperativas.

“Em breve faremos um reforço adicional, de mais 12 milhões de euros, dirigido especificamente a quatro respostas sociais fundamentais: lares de idosos, lares residenciais, residências autónomas e apoio domiciliário”, anunciou.

Também de acordo com Costa, através do programa Adaptar Social +, o Governo vai apoiar instituições a adquirir equipamentos de proteção e higienização.

“E vamos ainda lançar o programa PARES 3.0 para financiar a requalificação e construção de novos equipamentos sociais de apoio à infância, aos idosos e às pessoas com deficiência, num investimento total de 110 milhões de euros”, completou.

Outro objetivo central do Governo, segundo o líder do executivo, é garantir o regresso às aulas presenciais no próximo ano letivo num contexto de covid-19.

“O Programa de Estabilização [Económica e Social] contempla um montante de 400 milhões de euros para a digitalização das escolas. Para além disso, o próximo ano letivo contará com um reforço de 125 milhões de euros para a contratação de professores, pessoal não docente e técnicos especializados, como assistentes sociais, psicólogos ou mediadores”, referiu.

Costa abriu o seu discurso neste debate do estado da nação com palavras dirigidas “a todos aqueles que estão de luto, de solidariedade para os que estão doentes, infectados ou em isolamento profilático e de agradecimento a todos os profissionais que se mantiveram sempre ao serviço para beneficio de todos, com natural destaque aos profissionais de saúde”.

Sim, estamos em luta. Em luta contra o vírus, para proteger a saúde e a própria vida dos nossos concidadãos, em especial dos mais idosos ou vulneráveis – em nome dos quais não podemos baixar a guarda, nem facilitar no cumprimento das regras e medidas de segurança. Em luta pela manutenção de postos de trabalho e pela preservação de empresas e negócios que tão afetados foram pelo confinamento e pela retração da procura”, acrescentou.

 

ZAP // Lusa

13 Comments

  1. Com todo o respeito mas chamar “massacre chocante” e depois temos a vitimas de Pedrogao que ainda estão á espera de apoios !!!!

    O Sr. Costa tem prioridades um pouco raras.

  2. Porém temos que ver que todos os portugueses estão a pagar no mínimo 35% a EDP, para dar grandes lucros todos os anos aos chineses. Se continuarmos a aceitar investimentos chinês, um dia os Portugueses têm que sair do seu próprio país para subreviver, isto se não querem ser escravos como a China trata os seus.

  3. A hipocrisia não tem limites quando se trata da possível perda de ”Tacho” têm que se agarrar a qualquer coisa para não afogarem.Eu chamo a isto cobardia.

  4. Nasci e vivo num país comandado por arguidos.
    .
    Não aperto a mão a políticos. Um político pode não chegar ao topo, mas quase sempre chega a arguido
    .
    Aqui vai uma relexão do Sr José Gomes Ferreira, da Sic, para se levar muito a sério. Depois não venham insultar tudo e todos, quando foram avisados logo dois dias depois de ser público o montante da “bazuca”:
    .
    https://sicnoticias.pt/opiniao/2020-07-21-O-Crime-Economico-do-Hidrogenio?fbclid=IwAR2IBWwgFHkHvu4fWRNPtSyBXsIv6tzF7r8fkwvacF0ATjKRd-tURFN8NV8

  5. Só não compreendo como é que este Rio ainda lá anda. Tão perdido que anda…
    Quanto ao Costa e ao hidrogénio é claramente uma boa aposta. Infelizmente, será uma vez mais à moda do 44 e mais recentemente do lítio. É pena que assim seja.

  6. A mestria do Costa está na forma como governa, enganando tolos. É óbvio, por razões de aproveitamento de tachos contínuos, que se colará mais ao bloco central psd-ps. Porém lança no ar este pseudo convite de casamento à esquerda para os manter calminhos. É um pau de 2 bicos em que se verificará, uma vez mais, que fará o contrário do anunciado. Isto é assim à meio século. Talvez por isso, os mesmos de sempre a serem enganados ou mesmo sodomizados, estão a eleger as intenções de voto no Chega!

  7. Quando se fala em reestruturar o pais com complexos ideológicos de esquerda até me dá arrepios na espinha. Mais uma vez Portugal vai poder contar com o partido socialista para desbaratar uma oportunidade de ouro para fazer as reformas e implementar as estratégias para o futuro. A questão do hidrogénio não é mais do que um novo TGV, um fetiche de “lideres” que não entendem que o papel do estado não é liderar projectos empresariais mas sim tratar das questões básicas de regulação e organização institucional para permitir o investimento privado, nomeadamente estrangeiro (já que o capital por cá não abunda). Enquanto tivermos este voluntarismo empreendedor de meia dúzia de chico espertos empoderados não vamos a lado nenhum…

  8. O Galamba tem que fazer uma galambada antes de deixar o tacho. Isso já ele deu a entender sem vergonha nenhuma. Primeiro foi o lítio, agora é o hidrogénio. Temos um secretário de estado da energia que é bastante elementar, sem dúvida. E trafulha…

  9. Já não podemos confiar a tarefa de mudar o país à Escola Prática de Cavalaria porque já não está em Santarém, está em Abrantes. Também não há dinheiro para o gasóleo nem para as munições de forma que os rapazes só conseguem “treinar” porque os carros de combate agora têm uma “play-station” e dá para jogar “counterstricke”. Temos de ser nós mesmos a operar a revisão constitucional que se impõe!

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