Criado num ambiente humano para aprender linguagem gestual, a história de Nim mudou para sempre o campo da investigação da linguagem dos macacos. “Prestámos um enorme mau serviço àquela alma, e que vergonha para nós.”
Corriam os anos 70 quando Herbert Terrace, um psicólogo comportamental da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, deu início a uma experiência ambiciosa, mas que rapidamente se tornou numa história sombria.
Para explorar os limites da linguagem, do pensamento e da divisão entre humanos e animais, o psicólogo escolheu o fofinho chimpanzé que se vê na imagem acima.
A equipa de investigação chamou-lhe Nim Chimpsky — um nome (ironicamente) derivado de Noam Chomsky, o famoso linguista que tinha afirmado que a linguagem é uma caraterística exclusivamente humana.
O objetivo? Criar o pequeno Nim num ambiente semelhante ao ambiente humano e ensinar-lhe a Língua Gestual Americana (ASL) desde tenra idade — algo que viria a dividir profundamente a comunidade científica.
Dias depois do seu nascimento, Nim foi retirado da sua mãe e colocado ao cuidado da família LaFarge, em Nova Iorque, que não era propriamente a melhor candidata para criar um chimpanzé.
Nenhum dos membros da família era proficiente em linguagem gestual, mas foi-lhes na mesma confiada a tarefa monumental de ensinar Nim a comunicar através da linguagem gestual.
Não houve rigor científico na educação do pequeno chimpanzé, que pouco a pouco ia perdendo o direito à sua vida natural, substituída por confusão, solidão e inconsistência.
Muitas vezes descrito como oportunista e manipulador na forma como tratou o caso de Nim, que conquistou o mundo, Terrace, à frente do projeto Nim, parecia estar mais interessado na fama e na atenção dos media que o projeto atraía do que no bem-estar do chimpanzé.
É possível ver isso no documentário de James Marsh dedicado ao primata, Project Nim.
A sua abordagem de não intervenção nos cuidados de Nim e a falta de supervisão e de treino adequados provocaram os comportamentos cada vez mais agressivos de Nim, à medida que crescia.
O comportamento cada vez mais violento do chimpanzé fez mesmo com que Terrace desse abruptamente o projeto como terminado. Nim ficou conhecido pelas 16 palavras que comunicou, com as quais claramente pedia… uma laranja.
“Dá laranja eu dá come laranja eu come laranja dá-me come laranja dá-me tu”, disse, em linguagem gestual, quando “falou” mais do que qualquer outro chimpanzé no mundo. Nim conhecia um total de 125 palavras.
Nim, que tinha sido mimado e tratado como uma criança humana desde pequeno, foi subitamente posto de parte, alvejado com tranquilizantes e enviado de volta para Oklahoma, onde ficou confinado a uma instalação de pesquisa conhecida pelas suas condições duras e abusadoras. Do luxo ao cativeiro numa questão de dias. E tudo ficaria ainda pior.
A transição revelou-se traumatizante para o chimpanzé. A partir daí, a história de Nim tornou-se ainda mais trágica. Foi vendido para investigação médica, onde enfrentou os horrores da experimentação antes de ser resgatado por ativistas dos direitos dos animais.
No entanto, o seu salvamento trouxe-lhe pouco ou nenhum alívio. Nim foi colocado num ambiente pouco adequado para um ser social e inteligente como um chimpanzé. Isolado, o seu comportamento deteriorou-se ainda mais.
A negligência no caso foi tão flagrante que até Terrace e os cuidadores de Nim criticaram a longa experiência.
Um artigo de Terrace de 1979 publicado na revista Science denunciou a sua própria experiência e a investigação geral da linguagem dos macacos. Afirmava que as chamadas capacidades linguísticas exibidas pelos macacos eram apenas truques inteligentes para obter recompensas, em vez de verdadeiras capacidades linguísticas — uma reviravolta que se revelou um duro golpe para o campo da investigação da linguagem dos macacos.
Uma das cuidadoras de Nim, Joyce Butler, reflete no filme: “Prestámos um enorme mau serviço àquela alma, e que vergonha para nós.”