O diretor-geral da Organização Internacional das Migrações (OIM), o português António Vitorino, concorre com a sua vice-diretora-geral, a norte-americana Amy Pope, numa disputa sem precedentes pela liderança desse órgão das Nações Unidas.
A norte-americana Amy Pope é a nova aposta do Governo de Joe Biden para liderar a OIM, organização que tem sido dirigida maioritariamente por norte-americanos e que nunca teve uma mulher no comando.
Esta é vista como uma tentativa de os Estados Unidos voltarem à liderança de organizações multilaterais, após quatro anos de afastamento e rejeição protagonizados pelo Governo de Donald Trump.
Em 2018, Vitorino derrotou precisamente o polémico candidato apoiado por Trump, Ken Isaacs, que apresentava um histórico de declarações anti-imigrantes.
Em entrevista à agência AFP em março passado, Amy Pope, de 49 anos, admitiu que foi “um pouco estranho” concorrer para destituir o seu chefe, António Vitorino.
A norte-americana advogou que a decisão de competir contra o seu chefe de 66 anos – apenas o segundo cidadão não-americano a comandar a OIM em sete décadas de história – deveu-se à necessidade de colocar “a organização no século XXI” e levar mais “energia” ao cargo, naquilo que aparentou ser uma critica velada à postura e idade do português.
“Acho que a nacionalidade importa menos do que o estado de espírito, os níveis de energia, a visão estratégica e a vontade de trabalhar muito. Este não é um trabalho de aposentadoria”, disse Amy Pope à AFP, que se procura posicionar como uma alternativa mais jovem a António Vitorino.
“Ainda estamos um pouco presos às velhas formas de ver a migração”, afirmou, insistindo que uma “visão real” era necessária para provocar uma mudança cultural.
Em entrevista à plataforma Devex, a candidata foi mais direta e considerou que António Vitorino tem uma “abordagem da geração mais velha” e avaliou que o português “não está interessado em reformular o papel da organização”.
Em resposta à mesma plataforma, Vitorino optou por não responder à questão da idade, mas observou que o último norte-americano a dirigir a OIM – William Swing – tinha quase 80 anos quando foi nomeado para um segundo mandato, em 2013.
A candidatura de Pope marca a primeira vez nos 70 anos de história da OIM que um vice-diretor-geral em exercício contesta o cargo de diretor-geral, movimento incomum que tem preocupado especialistas.
O ex-chefe de desenvolvimento e avaliação de políticas no escritório do Alto Comissariado da ONU para Refugiados, Jeffrey Crisp, tem sido uma das vozes a expressar preocupação com o impacto que esta corrida entre Pope e Vitorino pode ter na dinâmica diária da OIM.
“Se António Vitorino não está a planear retirar-se, então deve haver uma atmosfera muito gelada na direção da OIM. É por isso que Amy Pope viaja tanto?”, questionou Crisp na rede social Twitter.
“Alguém poderia explicar porque é que os Estados Unidos estão a pressionar tanto para que Amy Pope se torne diretora-geral da OIM? Uma luta Estados Unidos-União Europeia pela posição está em jogo?”, questionou ainda Crisp, que também trabalhou para o British Refugee Council e tem vasta experiência em questões globais de refugiados e migração.
Desde que a norte-americana anunciou a sua candidatura, António Vitorino intensificou drasticamente as suas viagens, apesar de manter uma campanha muito mais discreta do que a sua adversária.
Para ultrapassar Vitorino, Pope terá que conquistar o bloco da União Europeia que apoiou o português nas últimas eleições e que mantém esse apoio, além de angariar votos de outros continentes cujas votações poderão oscilar para qualquer um dos lados.
Esta sexta-feira, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, anunciou que a União Europeia vai apoiar a recandidatura de António Vitorino.
“Como prova de união, os Estados-membros concordaram em apoiar a candidatura de António Vitorino a diretor-geral da OIM”, disse o alto-representante da UE para os Negócios Estrangeiros, em conferência de imprensa no final de uma reunião informal dos ministros com a pasta da diplomacia, em Estocolmo, na Suécia.
António Vitorino foi eleito em 2018 para diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações. A eleição do próximo diretor-geral vai realizar-se na próxima segunda-feira, em Genebra, na Suíça, por voto secreto entre os membros da OIM.
António Vitorino foi comissário europeu para a Justiça e Assuntos Internos (1999-2004) e vice-primeiro-ministro e ministro da Defesa de Portugal (1995-1997) no Governo liderado pelo atual secretário-geral da ONU, António Guterres.
ZAP // Lusa